Por José Antônio Bicalho
do Jornal Hoje em Dia
Eu compraria a Gasmig se tivesse dinheiro. E não a venderia nunca se fosse minha. A verdade é que não existe dinheiro que pague uma bela reserva de mercado. Entro neste assunto por conta da volta da especulação de que a Cemig venderá sua empresa de gás (leia matéria da repórter Tatiana Lagôa, ao lado). Se isso for feito agora, sinceramente, será uma grande bobagem.
A Gasmig acaba de renovar com o governo estadual seu contrato de exclusividade na distribuição de gás canalizado em Minas Gerais por mais 40 anos. Ou seja, a Gasmig reina sozinha. Todas as indústrias, empresas e residências servidas por gás natural canalizado no Estado são suas clientes. Entre elas estão as indústrias de Contagem e do Vale do Aço, duas grandes termelétricas em Ibirité e Juiz de Fora, as residências que começam a ser atendidas por gás canalizado em BH e Poços de Caldas e uma infinidade de pequenas indústrias e empresas nos polos e entorno de BH, Juiz de Fora, Poços de Caldas e Ipatinga.
Trata-se de um mercado cativo e ainda pouco explorado, com perspectivas absurdas de crescimento. Um bom planejamento da expansão das linhas de distribuição e boa vontade nos investimentos faria o consumo de gás natural explodir.
Além disso é uma empresa de ótimo desempenho financeiro, apesar da crise que afeta o consumo industrial. No ano passado (por ser uma S.A. de capital fechado, a empresa só publica balanços anualmente), a Gasmig faturou R$ 1,670 bilhão e lucrou R$ 117,1 milhões. A geração de caixa (ebitda) foi de R$ 148,3 milhões, o que equivale a 16% da receita líquida (margem ebitda), um resultado muito positivo para uma empresa que atua num segmento de preços regulados.
E esses resultados foram obtidos depois de 20 anos da última revisão tarifária. A próxima, aguardada para o próximo ano (como mostra a repórter Tatiana Lagôa), multiplicará a capacidade de investimento da empresa.
Por que, então, vender a Gasmig? E por quanto?
A nova onda de especulações surgiu com uma matéria publicada pela agência de notícias Reuters, na terça-feira, dando conta de que a Cemig planeja arrecadar R$ 1,7 bilhão com a venda da Gasmig e utilizar o dinheiro no abatimento de parte de sua dívida, de R$ 11,9 bilhões.
De antemão, é preciso ter claro que a Cemig não se posicionou oficialmente sobre o assunto que, dessa maneira, continua no campo da especulação. Mas seu atual presidente, Márcio Borges, já disse reiteradas vezes que faz parte da atual política da empresa focar no core business de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica, e alienar ativos não estratégicos. Gás, teoricamente, seria um deles.
De fato, é sempre interessante alavancar a capacidade de investimento de uma empresa no seu negócio principal. Mas não quando o negócio principal é menos exitoso que o do ativo que se quer vender, e esse é o caso da Cemig e Gasmig.
Enquanto a Gasmig apresenta resultados robustos, os da Cemig estão murchando. O lucro líquido consolidado da Cemig, por exemplo, foi de apenas R$ 5 milhões no primeiro trimestre. Foi salva do prejuízo justamente pela área de gás, que contribuiu com R$ 20 milhões de lucro no mesmo período. Além disso, a Gasmig não está inteiramente fora do negócio principal da Cemig, já que é fornecedora do combustível que movimenta a termelétrica de sua controladora em Ibirité.
Apesar disso, a venda ainda seria interessante se impactasse de maneira significativa a dívida da empresa e, consequentemente, sua capacidade de investimento. Mas, levando em conta o valor de venda especulado pela Reuters, de R$ 1,7 bilhão, a dívida cairia apenas 14,3%, de R$ 11,9 bilhões para R$ 10,2 bilhões, e a alavancagem (dívida comparada à geração de caixa) seria reduzida de 4,4 vezes para 3,8 vezes.
Sinceramente, acho pouco para que se abra mão de uma empresa com as potencialidades da Gasmig.