A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) determinou que um hospital universitário (HU) de Fortaleza (CE) reduza a jornada e mantenha o salário de uma técnica em farmácia, mãe de uma menina diagnosticada com paralisia cerebral, transtorno do espectro autista (TEA) grave e epilepsia.
A direção do hospital se recusava a conceder o benefício, que já é um direito das servidoras públicas, alegando que a técnica é contratada pelo regime CLT. Segundo a direção do HU, não há norma jurídica que ampare a pretensão de redução da carga horária, com ou sem diminuição salarial, para empregados regidos pela CLT.
Os ministros entenderam o contrário. Para eles, a trabalhadora tem direito a horário especial, com redução de jornada e sem prejuízo da remuneração, para poder acompanhar a filha menor com necessidades especiais em tratamentos médicos frequentes. Conforme a decisão, a jurisprudência do TST tem reconhecido essa possibilidade.
Para os ministros da 1ª Turma, o Estado não pode adotar procedimento diverso entre servidores e empregados públicos.
A técnica foi admitida pelo regime CLT em um hospital universitário, em 2015, após aprovação em concurso público.
Cuidados intensos
A trabalhadora ajuizou uma ação administrativa, em 2019, pedindo a redução de sua carga horária, com base no fato de a filha necessitar de cuidados e vigilância intensos e de ter tratamentos constantes com médicos, fonoaudiólogos, terapeuta ocupacional e fisioterapeutas.
Com a rejeição do pedido pela empregadora, ela acionou a Justiça, requerendo a redução da jornada semanal de 36 horas para 28 horas, sem prejuízo da remuneração, enquanto perdurar a necessidade de acompanhamento da filha.
Analogia
No primeiro grau, diante da comprovação do quadro de saúde da criança, od desembargadores deram ganho de causa à trabalhadora, aplicando ao caso, por analogia, o disposto no artigo 98, parágrafo 3º, do Regime Jurídico Único (RJU) dos servidores públicos da União (Lei 8.112/1990), que garante o horário especial ao servidor que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência, quando comprovada a necessidade por junta médica oficial, independentemente de compensação de horário.
Embora a técnica seja celetista, a sentença concluiu que a aplicação analógica do RJU atende aos princípios, aos direitos e às garantias constitucionais que asseguram o direito à vida, à saúde e à dignidade da pessoa humana. O Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (CE) confirmou a sentença.
Proteção do Estado
O relator do agravo de instrumento com o qual a empresa pública pretendia rediscutir o caso no TST, ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, destacou que o Brasil é signatário da Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência (Decreto 6.949/2009), que garante à família receber do Estado a proteção e a assistência necessárias para que possam contribuir para o exercício pleno e equitativo dos direitos das pessoas com deficiência. Nesse sentido, lembrou que os tratados e as convenções internacionais sobre direitos humanos têm status normativo de emendas constitucionais (artigo 5º, parágrafo 3º, da Constituição da República).
Situação idêntica
Em se tratando de direito fundamental expressamente assegurado pela Constituição, o ministro considerou que não seria admissível que o Estado adotasse procedimentos distintos em relação a servidores e a empregados públicos. “A situação jurídica de base é idêntica, e o estatuto jurídico aplicável ao trabalhador não poderia ser usado como justificativa razoável para afastar a proteção que lhe foi outorgada”, destacou.
O relator citou diversos precedentes do TST no mesmo sentido, alguns envolvendo a mesma empresa pública, nos quais se entendeu que não é possível isentar o Poder Judiciário de decidir situação em que a ausência de norma específica poderia comprometer a eficácia de direitos fundamentais assegurados pela Constituição.
O processo tramita em segredo de justiça.
Fonte: CUT Brasil, com informações da Secretaria de Comunicação Social do TST