Os recentes ataques às escolas têm trazido apreensão aos profissionais da educação, pais e alunos. Nas últimas semanas foram realizados cinco ataques ao todo em São Paulo, Santa Catarina, Pará, Goiás e Amazonas. A polícia ainda evitou um ataque que estava sendo planejado no Rio Grande do Sul, ao apreender um jovem de 14 anos e prender seus pais que possuiam material neonazista na casa onde moram.
A solução para o fim de toda essa violência,segundo especialistas em educação, passa por diversos métodos como a regulamentação das plataformas das redes socias, a volta de disciplinas de humanas como sociologia e filosofia para preparar o jovem para a vida, investimentos em investigação policial e não em repressão, e ainda envolver a comunidade escolar.
Para o professor e diretor estadual do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), Paulo Neves, a solução é aprofundar a relação da comunidade na discussão do problema e desmistificar narrativas implantadas nos últimos anos, ao contrário da proposta de governos que querem ampliar a presença da polícia nos colégios.
“Nos Estados Unidos temos uma sociedade militarizada e isso não impede os constantes ataques terroristas que enfrentam. A alternativa para esse problema é desconstruirmos a narrativa que foi criada nos últimos seis anos, de desvalorização do professor e da escola pública”, diz.
“A saída é o envolvimento da comunidade, que precisa abraçar a escola e participar ativamente da vida escolar. São os pais, professores e estudantes que vão conseguir frear a onda macabra que se abateu sobre a educação pública ao debater a violência e chamar atenção para importância sobre os valores éticos, o sentimento de solidariedade e empatia e assim romper o ciclo do individualismo que tomou conta do país nos últimos anos”, acrescentou.
Regular a rede
O ambiente digital privado onde os adolescentes se fazem presentes e que inclui as redes sociais, grupos de mensagens, fóruns de debate e games, funciona praticamente sem regras e se torna um ambiente propício para a disseminação de desinformação, discurso de ódio, preconceitos e espaços de articulação e mobilização para as lideranças de extrema direita.
“Isso ocorre em razão de características que vão do modelo de negócios dessas plataformas, baseado na coleta de dados e direcionamento de conteúdos de acordo com o perfil das pessoas, até a interface voltada para capturar a atenção e manter em atividade permanente, explica a coordenadora do Comitê Gestor da Internet (CGI.br), Renata Mielli.
Ela lembra que ao comprar o Twitter, o empresário Elon Musk demitiu milhares de funcionários em todas as áreas, inclusive de moderação e direitos humanos, e “adequou a plataforma à visão de mundo de um homem de extrema direita sem qualquer compromisso com a democracia e com valores éticos”.
Recentemente, a rede social afirmou que um perfil com foto de assassinos de crianças não violava os termos de uso da rede e se recusou a cancelá-lo por não se tratar de apologia ao crime. Por conta disso, diz Renata, as plataformas precisam ser submetidas à uma regulação que estabeleça regras para a prestação de serviços no Brasil.
“O enfrentamento à cultura do ódio e à violência, aflorados na sociedade, hoje, é um desafio que precisa ser tratado em várias frentes. Uma delas é a regulação das plataformas digitais. A outra é a introdução no ambiente escolar, desde muito cedo, uma forte ênfase em literacia digital e educomunicação, abordada de forma multidisciplinar. Mas para fazer isso em escala nacional, os professores e professoras precisam também passar por um processo de formação. O retorno de disciplinas como filosofia e sociologia também são importantes. Acabar com a visão liberal de que a escola é para formar para o trabalho, porque a escola é para formar para a vida”, defende.
Diálogo sobre diversidade barrado nas escolas
Também professor da rede pública, Alvaro Augusto Dias vê no movimento contra as escolas, uma onda articulada de terror fascista, semelhante a que tomou conta da Itália com as milícias fascistas organizadas por latifundiários.
Dias não acredita que a resposta aos casos de violência seja o aumento do investimento em ações policiais, mas na transformação da consciência, após anos de governos e movimentos que defendem ideologias extremistas e circulam livremente nas redes com discursos machistas, homofóbicos, racistas e de ataques às minorias.
Segundo ele, a postura dos gestores escolares também precisa ser de apoio aos educadores e educadoras e sem qualquer tolerância a posturas violentas.
“Há estudantes insuflados por grupos de extrema direita e de igrejas ultraconservadoras que nos impedem de dialogar sobre questões étnico-raciais e de gênero, por exemplo, nos acusando de doutrinadores e de esquerdistas. Há alunos que querem tocar nos assuntos, mas pequenos grupos são resistentes e aí levam isso aos gestores escolares, que ao invés de nos apoiar, nos desautorizam e legitimam o discurso de ódio”, crítica.
Caso de qual polícia?
O integrante do Movimento Policiais Antifascismo de São Paulo e coordenador da Setorial Estadual de Segurança Pública do PT paulista, Leandro Prior, vai na contramão dos educadores e defende que os ataques às escolas são casos de polícia.
Porém, sob um viés diferente do que habitualmente se discute. Ele critica o uso político da Polícia Militar como resposta às demandas urgentes, sem que exista um plano consistente de investigação e combate às bases das ações terroristas.
“A questão é: qual polícia para qual situação?. Na situação de evitar ataques e identificá-los com antecedência há necessidade da Polícia Civil, pois é dela a prerrogativa de investigação. Mas se o crime já aconteceu ou está acontecendo, cabe acionar a Polícia Militar (PM) de modo imediato. Mas só usar a PM para o preventivo na parte de fora das escolas não evitará os ataques, apenas trará uma falsa sensação de segurança”, define.
Sobre as redes sociais, Prior ressalta que é de responsabilidade dos pais a fiscalização do uso destas plataformas pelos filhos e filhas, principalmente porque vivemos em um país que ainda não há um marco regulatório das redes sociais, tratadas como terra sem lei devido a difícil rastreabilidade e a sensação de impunidade.
Sem escola democrática nada melhora
Leandro Prior diz que esta sensação de fragilidade facilita a possibilidade de a extrema-direita utilizar o momento como um estopim para defender a ampliação da militarização das escolas, algo que organizações em defesa de um ambiente escolar democrático repudiam.
“Com toda certeza esse debate irá ressurgir, pois é uma das pautas da extrema-direita e utilizando-se de situações de crise, eles usarão a narrativa de que em uma escola militarizada não aconteceria isso. A melhor saída é o constante diálogo com os grêmios estudantis e os próprios alunos para que estes fiscalizem e observem a ações dos estudantes", diz
Por CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação)