Desde que foram instituídas a redução da jornada e dos salários – de 25% a 70% - e a suspensão dos contratos de trabalho durante a pandemia do novo coronavírus (Covid-19) para supostamente garantir a manutenção dos empregos, 7.206.915 trabalhadores e trabalhadoras, que foram incluídos no programa chamado Benefício Extraordinário Mensal (BEM) do governo de Jair Bolsonaro, estão mais pobres e ainda correm risco de ser demitidos e receber menos do que teriam direito.
"Além de menos renda ou renda zero, esses trabalhadores correm o risco de ser demitidos e receber a rescisão com base no valor dos salários cortados, além de dois meses a menos de depósitos no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço", alerta a técnica da subseção do Dieese da CUT Nacional, Adriana Marcolino.
De acordo com Adriana, ao contrário do que diz o governo, a Medida Provisória (MP) nº 936, que prevê o corte de salário e a suspensão de contratos, não garante a manutenção dos empregos. A medida, explica a técnica, define que os patrões têm, sim, o direito de demitir e ainda pagar um valor menor de indenização.
Pela MP, caso seja demitido, o trabalhador vai receber sua rescisão de acordo com o valor do salário no período de estabilidade, ou seja, com cortes. Quem tiver redução salarial acima de 50% e inferior a 25% terá direito a 50% do salário. Quem tiver redução de jornada acima de 50% até 70%, se for demitido, vai receber 75% do salário mensal pelo período que ainda resta de estabilidade.
Na redução, de 25%, por exemplo, se o trabalhador for demitido, sem justa causa, após 60 dias, durante o período de redução de jornada, o valor do salário de indenização será calculado em cima dos 30 dias que faltam para o fim do acordo. Mas, o trabalhador deve ficar atento porque essa redução vale somente para os dias que faltarem para terminar os três meses de acordo.
Se o trabalhador for demitido ainda no período de estabilidade, mas após ter voltado ao trabalho, o valor do salário base da indenização deverá ser sobre o salário integral, explica Adriana Marcolino.
“É em cima do salário que são pagas todas as verbas, o Fundo de Garantia, a Previdência, o vale refeição etc. Enquanto ele estiver trabalhando nos meses de redução, o recolhimento será proporcional ao salário porque a contrapartida do governo do seguro-desemprego não incide sobre verbas rescisórias”, afirma.
Pior é a situação de quem teve a suspensão do contrato de trabalho porque ficará sem o depósito do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e a contribuição previdenciária ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) pelos meses de afastamento. Para ter direito a esse tempo de contribuição da Previdência, o trabalhador terá de pagar do próprio bolso como contribuinte individual.
As regras frágeis de estabilidade e preservação de empregos se acentuam porque os patrões, que aderiram ao acordo, não precisam dar estabilidade para todo o seu quadro de trabalhadores, apenas aos que aceitarem a medida.
Os patrões podem escolher um determinado grupo, de salários mais altos, por exemplo, e não incluir os de baixos salários. Com isso, economizam mais e podem demitir com custos menores os trabalhadores de menor faixa salarial, já prevendo que a crise vai aumentar o desemprego e poderão contratar uma mão de obra ainda mais barata, acredita Adriana Marcolino.
Para a professora de economia da USP, Leda Paulani, o número expressivo de trabalhadores incluídos no programa demonstra claramente que o governo federal pensa apenas em proteger os empresários em detrimento dos trabalhadores, que cada vez mais têm seus direitos precarizados e cada vez mais estão empobrecidos.
“Infelizmente, no Brasil você tem aumento do desemprego, o aumento da informalidade e da precarização e quando o governo dá algum auxílio, como é o dos R$ 600,00 de renda emergencial, o que se percebe é que para muita gente esse auxílio não passa de uma miragem”, diz a economista, ao lembrar o drama de milhões de brasileiros que não têm conseguido sacar o auxílio prometido pelo governo.
O empobrecimento dos trabalhadores é comprovado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Segundo o órgão, as rendas desses milhões de trabalhadores caíram entre 10% e 40%, dependendo das faixas salariais e dos acordos de redução de jornadas e salários, que variam de 25%, 50% e 70%, por três meses, ou ainda da suspensão dos contratos de trabalho por 60 dias.
A MP prevê que o trabalhador com redução de jornada e salários em 25% terá 75% do salário pago pela empresa, sem contrapartida do governo. Para redução menor do que 25% não há previsão de pagamento de beneficio emergencial de preservação do emprego, mas um percentual menor do que 25%, só com negociação coletiva.
Com redução de 50%, a empresa paga 50% do salário e o governo libera 50% do valor que o trabalhador teria direito do seguro-desemprego. Isto não significa que ele receberá metade do teto, hoje em R$ 1.813,03 e, sim, do que ele tem direito de acordo com o tempo de serviço, salário etc. Se a redução chegar a 70%, a empresa paga 30% do salário e o trabalhador receberá 70% do teto que tem direito do seguro desemprego.
Para Leda Paulani, a MP nº 936 nada mais é do que uma forma que o governo Bolsonaro encontrou para sustentar financeiramente as empresas em detrimento dos empregos e salários.
Empobrecimento do trabalhador, mais benefícios para os patrões e tentativa de sufocar a ação sindical é a trinca de ações de Bolsonaro em praticamente todas as MPs, projeto de leis e decretos que edita e não seria diferente com a MP 936, critica a técnica do Dieese, Adriana Marcolino.
“O governo também retirou a obrigatoriedade de acordos serem feitos com acompanhamento dos sindicatos. Isto fragiliza o trabalhador na negociação porque é o sindicato que sabe se a empresa realmente tem condições de fazer acordos melhores, como vem sendo demonstrado nos últimos dias”, afirma, se referindo ao levantamento do Dieese sobre as garantias conquistadas pelos sindicatos, como a concessão de férias coletivas sem prejuízo do pagamento integral dos salários, garantia de estabilidade temporária, afastamento imediato de pessoas do grupo de risco da Covid-19 das atividades laborais presenciais, e suspensão de contrato de trabalho com garantia do salário líquido, entre outras conquistas que seriam perdidas se todas as regras da MP de Bolsonaro fossem adotadas pelas empresas.
Balanço do Ministério da Economia expõe o drama de milhões de trabalhadores
A Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia divulgou um balanço dos acordos firmados até às 14h, da terça-feira (12), da suspensão de contratos de trabalho e redução de jornada e salários, durante a pandemia do novo coronavírus (Covid-19).
Segundo o governo federal, 7.206.915 trabalhadores, de 569 mil empresas aceitaram fazer acordos; 52% do total (3.757.862) referem-se a trabalhadores de micro e de pequenas empresas, que faturam até R$ 4,8 milhões por ano.
As médias e grandes empresas, com faturamento superior a esse valor, respondem por 44% dos acordos (3.143.775). Os empregados domésticos e trabalhadores intermitentes totalizam 4% dos acordos (305.278).
A redução de 70% dos salários com o pagamento de 70% de seguro-desemprego atingiu 879.774 (12,2%) dos trabalhadores .
Os casos de trabalhadores intermitentes, que recebem R$ 600,00 por três meses quando o contrato estiver “inativo”, correspondem a 167.069 (2,3%).
Os estados que registraram o maior número de benefícios emergenciais foram São Paulo (33,3%), Rio de Janeiro (10,1%), Minas Gerais (9,5%), Rio Grande do Sul (5,6%) e Paraná (5,4%).
O Ministério da Economia prevê que farão adesão ao programa um total de 8,5 milhões de trabalhadores.
Fonte: CUT