No momento em que o presidente da Cemig anuncia a realização de um diagnóstico para a retomada da primarização, eletricitários do Quarteirão 14, na Cidade Industrial, apresentam um levantamento do desmonte da empresa nos últimos anos em um órgão importante da estatal: a Diretoria da Distribuição e Comercialização (DDC).
Essa diretoria faz a gestão da área que é composta por oficinas de transformadores aéreos, de manutenção e testes de religadores e seccionalizadores, de reguladores de tensão, de ferramentas especiais, de transformadores de SE's (alta), central de tratamento de óleo, oficina de proteção anticorrosiva, oficina de medição e instrumentação, oficina de calibração e aferição de medidores, dentre outras atividades diversificadas.
A oficina de transformadores de distribuição (OTD) está em fase final de fechamento, processo que ameaça outras oficinas da Cemig, via terceirização, o que deixa trabalhadores de outros setores da empresa que dependem dessas oficinas inseguros e sem poder atender as demandas. Os trabalhadores reivindicam que este processo seja revertido com urgência.
Leia o texto produzido por trabalhadores do Q.14:
O que a terceirização tem provocado na Cemig
Trazemos aqui, novamente, uma questão que, enquanto existir, sempre valerá muito a pena ser discutida: a terceirização, dessa vez dentro da ótica dos trabalhadores de Contagem, lotados no Quarteirão 14.
Há décadas, a Cemig vem terceirizando sua mão de obra. Nos últimos 15 anos a sensação dos eletricitários é que se abandonou de vez o propósito inicial de criação da empresa, que era de fornecer um dos principais suportes para o desenvolvimento da sociedade mineira, a energia elétrica colocada a serviço do bem comum.
Aos nossos olhos, a Cemig se desvirtuou, atuando mais voltada para o mercado financeiro do que para o povo mineiro. Seguindo as leis de mercado e tendo como objetivo maior a maximização dos lucros para os acionistas, a terceirização ganhou força nos últimos anos e hoje, no Q.14, pode-se afirmar que ela ocorre de forma irresponsável, insensata e inconsequente, sendo promovida por parte dos gestores da empresa. A terceirização promovida aqui, em Contagem, traduz bem o descaso da empresa com as demandas do sistema elétrico, com a qualidade da energia e revela a incoerência da empresa quando o assunto é sustentabilidade.
As oficinas que fazem a recuperação, a manutenção e teste de diversos e indispensáveis instrumentos e equipamentos utilizados nas redes, subestações e usinas. Escola para centenas de trabalhadores, que se aposentaram e ativos, que no momento são poucos, estão instaladas nesse quarteirão e visam suprir as demandas da empresa. Dentro dessa estrutura, além das oficinas temos laboratórios e outros setores de apoio.
Hoje, o corpo técnico das oficinas reflete bem os objetivos da gestão da empresa, com dois terços da mão de obra terceirizados. Obviamente, como nessa área não existem voluntários, o desejo da Cemig de reduzir cada vez mais seus custos com pessoal próprio, atrai os donos das empreiteiras para a operação de serviços, dando início a um triste conflito de interesses: de um lado a Cemig, celebrando contratos vantajosos para sua administração, e do outro lado, a empreiteira querendo obter o máximo de lucro em cima da mão de obra de seus funcionários.
No meio desse conflito, temos um exército de profissionais terceirizados, sem treinamentos adequados, mal remunerados, que sofrem com as incertezas provocadas pelas constantes trocas de empreiteiras, como a falta de garantia de emprego ou até mesmo de seus direitos trabalhistas.
Nos últimos anos, os companheiros do Q.14 têm observado e convivido, atônitos, com abandonos de contrato por empreiteiras, longos intervalos entre o final de um contrato e o início de outro, ações judiciais das empreiteiras contra a Cemig e vice-versa, paralisando as atividades nas oficinas. Essas interrupções criam uma série de outros problemas que poderiam ser evitados se existissem critérios no atual processo de terceirização.
Para ilustrar essa situação, ressaltamos que as atividades nas oficinas estão paralisadas há mais de 5 meses por falta de contrato. Na última licitação, a empresa vencedora teve a documentação reprovada e o segundo colocado ainda não foi acionado, o que representa maior indefinição quanto ao retorno das atividades.
Os eletricitários do Q.14 são unânimes em afirmar que algumas funções de apoio até poderiam ser terceirizadas. Mas, nas atividades desenvolvidas pelo corpo técnico da Cemig, a utilização do quadro próprio seria fundamental para garantir o bom andamento das atividades e para manter o knowhow dos setores, garantindo a segurança e a confiabilidade dos equipamentos instalados no sistema elétrico, que passam pelas oficinas.
Na contramão da sustentabilidade
Um setor do Quarteirão 14 afetado não só pela terceirização, como também pela gestão equivocada da empresa é a oficina de transformadores de distribuição (OTD). O setor que atuava junto com as áreas de compras e qualidade da Cemig atestava a qualidade dos transformadores e dava à empresa o direto de exercer a garantia desses equipamentos, além de executar as manutenções com boa qualidade e custo baixo, se comparados com o mercado externo.
A oficina sempre atendeu as demandas nos momentos críticos de continuidade de fornecimento de energia elétrica, sendo que no final de 2013 e início de 2014 atendeu consideravelmente a Região Metropolitana de BH disponibilizando transformadores durante a crise de fornecimento desses equipamentos pelo mercado, funcionando como setor estratégico da empresa. Mesmo assim a empresa resolveu abrir mão dessa área, o que significa abrir mão da garantia dos transformadores junto aos fornecedores, o que evitaria jogar fora equipamentos facilmente recuperáveis e, consequentemente, o dinheiro dos consumidores, além de fechar postos de trabalho. Todas as outras concessionárias de energia do Brasil investem na recuperação de transformadores de distribuição enquanto a Cemig prefere jogá-los fora e comprar novos, onerando cada vez mais a sua tarifa de energia.
Todos os trabalhadores do Q.14 esperam que a nova direção da empresa, como tem sido afirmado, não veja a terceirização com a única opção existente para a continuidade das importantes atividades desenvolvidas nessa base. E que a nossa força de trabalho venha a ter novamente, como foi dito certo dia por um superintendente, o sentimento de pertencimento à Cemig.