O avanço do neoliberalismo presente no Brasil, especialmente a partir da década de 90, apresentou fortes reflexos na Cemig, e seus impactos são sentidos ainda hoje. O advento da terceirização, ferramenta usada para redução dos “custos” com o(a) trabalhador(a) que consiste na inserção de um intermediário para intensificar as formas de expropriação do trabalho e, por consequência, exacerbar os ritmos de produção, precariza as condições de trabalho, aumenta a exposição aos riscos, reduz os investimentos em capacitação e formação do(a) trabalhador(a) e ainda reduz os salários. Intermediário esse que lucra vultuosas quantias ao assumir o chicote da espoliação.
É fundamental questionar: por que a prática de inserir um intermediário que lucra milhões para terceirizar contratos de trabalhadores(as) é apontada como ferramenta de redução de custos? Como um intermediário que enriquece com a terceirização pode sair mais barato do que efetuar a contratação direta do trabalhador(a)? A resposta para essas questões está umbilicalmente vinculada à ética do mercado e é sentida pelos(as) eletricitários(as) contratados(as) cotidianamente.
Um exemplo é o caso da empresa SPIN ENERGY SERVICOS ELETRICOS LTDA: parcelam, continuamente, em até 4 vezes o vale-refeição; atrasam o pagamento do plano de saúde e odontológico – deixando os(as) trabalhadores(as) e seus dependentes sem cobertura; adotam valor elevado de coparticipação para adesão de dependentes, tornando a inclusão inviável; não realizam manutenção nos veículos e, quando vão para manutenção, ficam retidos por falta de pagamento. Além disso, os veículos param regularmente por falta de abastecimento. Vários veículos estão sucateados e abandonados no pátio.
Tem mais: as férias dos(as) trabalhadores(as) não são pagas corretamente, e os salários são pagos com atraso frequente. O salário do mês de janeiro, por exemplo, só foi pago no dia 12/01/2023 devido a paralisação da categoria exigindo os pagamentos. Em seu último comunicado, a empresa justificou o não pagamento devido ao “nosso recebimento junto à Cemig não ter sido creditado”. A Cemig, por sua vez, desmente a informação apresentada pela SPIN, informando que os repasses estão sendo devidamente creditados e lavando as mãos frente aos problemas enfrentados por sua força de trabalho – problemas esses gerados pela própria ao adotar práticas nefastas de barateamento de mão-de-obra.
Essa tentativa de se isentar da responsabilidade encontra lastro na ética do mercado, que busca normalizar relações de exploração extrema do trabalho desde que as empresas de grande porte, certificadas internacionalmente, não as pratiquem diretamente e contratem um intermediário para que este, ao não assumir a responsabilidade que na realidade é delas, as isente de tais responsabilizações, ao mesmo tempo em que as auxilia em sua atroz tarefa de maximizar os lucros para os acionistas. É fundamental denunciarmos que tais práticas foram intensificadas durante o governo Zema, que adota uma política de total desprezo ao(a) trabalhador(a).
Através da análise do caso apresentado que, por sinal, é recorrente em contratos de terceirização de mão-de-obra e serviços, podemos, por meio de uma observação crítica, identificar diversos elementos que contribuem para que a terceirização seja alçada a mais um case de sucesso alinhado à ética do mercado, à ética do “deus dinheiro” e da acumulação infinita. Ao aderirem às políticas de terceirização, as empresas são pautadas por um discurso de sustentabilidade, redução dos custos fixos, dentre outras falácias. Tentam nos iludir enquanto precarizam as relações de trabalho e, ao mesmo tempo, buscam se eximir da responsabilidade de tais práticas.
Ora, a Cemig não é a signatária das concessões? Não é ela quem se responsabiliza pela garantia dos serviços e recebe os valores das concessões? Não é ela quem repassa os valores para as empresas terceiras? Portanto, ela é a real responsável por toda a sua força de trabalho, seja do quadro próprio ou contratado. É fundamental que cobremos da Cemig medidas que, de fato, solucionem tais problemas e contradições criados pela própria e que atingem de forma covarde grande parcela da categoria. A primarização é passo fundamental para solucionar tais problemas e contradições, mas as ações necessárias vão muito além: é fundamental que seja assumido de forma radical o compromisso de adotar práticas saudáveis nas relações de trabalho, construindo ambientes agradáveis e cooperativos.