O Sindieletro lamenta o falecimento do jornalista João Paulo Cunha, referência em jornalismo popular na imprensa mineira. Deixa saudades e a certeza de uma vida pautada pela busca por justiça e transformação na sociedade. Vá em paz, João!
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Com trajetória marcada por importantes contribuições à construção do jornalismo popular, faleceu nesta sexta-feira (9), em Belo Horizonte, aos 63 anos, João Paulo Cunha. Colunista do Brasil de Fato MG, o mineiro atuou em jornais, rádios e na televisão. O jornalista também publicou quatro livros e foi professor universitário.
João Paulo foi diretor da Rede Minas e da Rádio Inconfidência. Foi também presidente do Instituto Cultural do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) e diretor da Casa de Jornalistas. Por 18 anos, foi editor de cultura do jornal Estado de Minas, e também responsável pelo Caderno Pensar.
Mesmo com um currículo extenso, conhecidos, amigos e colegas de profissão contam que o que mais chamava atenção em João Paulo era seu compromisso com a comunicação voltada aos interesses dos trabalhadores e da população mais pobre.
“Sua principal contribuição, além de exprimir uma sólida e contínua formação, foi nunca se omitir e praticar um jornalismo reflexivo, engajado e comprometido com Minas Gerais e o Brasil. Sempre esperávamos suas palavras para nos ajudar a pensar em saídas e para nos esperançar”, conta a atriz e ex-vereadora de BH, Cida Falabella.
No prefácio do livro, publicado por João Paulo em 2019, “Penso, logo duvido”, João das Neves, artista mineiro, chama atenção para a capacidade do jornalista em observar desde as questões mais cotidianas aos grandes movimentos políticos, proporcionando ao leitor "uma vasta compreensão do mundo”.
“Não há ali malabarismos intelectuais desnecessários, raciocínios incompreensíveis ou desprezo à nossa inteligência. Essa é a grande magia de seus escritos. Somos levados, com extrema sutileza e delicadeza, não a pensar como ele, mas a pensar com ele”, descreve o diretor e dramaturgo, falecido em 2018.
Para o ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais (SJPMG) Kerisson Lopes, João Paulo era um líder, cuja personalidade era marcada por gentileza, sobriedade, inteligência e integridade.
“Cada texto do João era uma contribuição na construção de uma sociedade mais justa e fraterna. Eram a expressão de uma escrita culta, comprometida com os direitos humanos e a transformação social. Ele mostrou que o jornalismo deve ser um aliado na luta por um mundo melhor”, afirma.
Luta contra a censura
Em 2014, João Paulo Cunha foi protagonista de um dos episódios mais marcantes para o jornalismo mineiro. Após ser censurado sobre o conteúdo da sua coluna no caderno de cultura do jornal O Estado de Minas, o jornalista pediu demissão.
Em entrevista ao Brasil de Fato MG, em 2014, João Paulo foi categórico: "Acho inadmissível que um jornal censure seus profissionais. A luta histórica que tivemos no Brasil é para termos o jornalismo como instrumento de cidadania. Ao censurar a imprensa ou o jornalista, você está tirando dele o mais importante, que é a liberdade de expressão e a possibilidade de trazer várias visões de mundo”, declarou.
A decisão repercutiu entre toda categoria e até hoje é lembrada com orgulho pelos colegas de profissão. “Ele tinha esse sonho de que a nossa profissão e o jornalismo de fato contribuíssem para a melhoria da sociedade e ele foi um colaborador gigante nesse sentido", pontua Alessandra Mello, presidenta do SJPMG.
Na data do episódio, Alessandra era colega de redação de João Paulo. Ela relembra que ele chegou a ser aconselhado por alguns profissionais a ceder ou repensar sua atitude, mas foi irredutível em sua postura política. Após explicar aos colegas os motivos de sua decisão, o jornalista foi aplaudido pela redação.
“As pessoas foram acompanhando ele em uma multidão de jornalistas na redação para levá-lo até a porta e, no dia seguinte, todo mundo foi trabalhar de camiseta branca - que é como ia trabalhar todos os dias - em homenagem a ele”, rememora emocionada a jornalista e amiga.
Desde a fundação da edição mineira do jornal Brasil de Fato, em 2013, João Paulo Cunha colaborou brilhantemente como colunista do veículo. Era figura presente nas reuniões do Conselho editorial do jornal, sempre com contribuições estruturais.
Na equipe, com sua doçura e gentileza, era amado e admirado por todos, que seguirão tendo em João Paulo Cunha uma das maiores referências do jornalismo brasileiro.
“Para o Brasil de Fato, a perda é enorme. Perdemos nosso maior colunista. Um intelectual irretocável, de uma capacidade única de retratar e desnudar a realidade brasileira e mineira, ao mesmo tempo que alimentava a esperança de dias melhores. Para nós, é uma honra termos tido o João Paulo como colunista, colega, companheiro e mestre", destaca Frederico Santana Rick, membro da equipe do Brasil de Fato MG.
João Paulo deixa esposa, filha, neta e um legado indiscutível de contribuições teóricas, políticas e práticas ao povo mineiro e brasileiro. O corpo será velado no sábado (10), no Cemitério da Colina.
Edição: Elis Almeida