Salinas: “Enquanto um trabalhador estiver mal psicologicamente, nenhum de nós vai fazer sobreaviso”



Salinas: “Enquanto um trabalhador estiver mal psicologicamente, nenhum de nós vai fazer sobreaviso”

Nós, eletricistas da equipe de operação de Salinas, estamos nos recusando a realizar horas- extras e ficar em regime de sobreaviso. A decisão já faz quase um mês. Estamos trabalhando em operação padrão, executando as atividades da forma mais segura possível, mesmo que demande tempo excessivo, mas priorizando o trabalho de forma segura para que não haja nenhum acidente.

Já tem anos que construímos mobilizações em Salinas. Nossa base tem muito diálogo e é bastante combativa. No segundo semestre de 2023, quando ocorreram cinco acidentes fatais, começamos a nos mobilizar sobre a segurança do trabalho. A campanha de ACT e a intransigência da empresa também foi catalisadoras para nossas decisões.

A falta do ticket de novembro nos fez mais aguerridos à luta. Entre tantas ameaças durante a renovação do ACT, entramos na greve de novembro dispostos a permanecer paralisados por tempo indeterminado. Após a decisão de finalização da greve, voltamos a trabalhar convictos de que precisávamos adotar medidas para a proteção dos trabalhadores em campo.

Preenchemos a análise de risco colocando que não tínhamos condições psicológicas para ir a campo. Afinal, por conta da intransigência, assédio e ameaças durante o processo de negociação do ACT 2023, as questões financeiras impostas pela empresa e os acidentes fatais ocorridos, não há mente que suporte tanta pressão.

A falta do ticket e a ameaça de não receber verbas que compõem a folha de pagamento, saber que teremos que deixar de pagar uma conta para pagar outra, a insegurança alimentar imposta às famílias: tudo isso oprime o trabalhador. E num trabalho que envolve periculosidade, como é no sistema elétrico de potência, não podemos atuar psicologicamente abalados.

Percebemos que ficar na base também não seria bom. O ideal seria sair para o campo e fazer o possível dentro da segurança. Essa decisão abarca trabalhar apenas as 40h semanais para as quais fomos contratados. Não realizar horas extras, o que também configura mais exposição ao risco, principalmente durante o período chuvoso, e não executar escala de sobreaviso. Ficar de sobreaviso nos deixa ansiosos, tensos. E no período chuvoso é quando temos que trabalhar todos os finais de semana, direto.

O sobreaviso causa ansiedade, pois ficamos na expectativa de sermos acionados. Não nos é permitido o descanso e o relaxamento, principalmente nesse momento em que precisamos estar descansados para enfrentar mais uma semana com essa gestão que nos ameaça de penalização a todo momento. Nossa leitura é de que o final de semana é para ficar com a família e amigos, para repor as energias para o próximo período laboral.

Foi uma posição coletiva da base. Enquanto um trabalhador estiver mal psicologicamente, nenhum vai fazer regime de sobreaviso. É importante lembrar, também, que alguns trabalhadores não podem pegar sobreaviso para conseguir fazer bicos e executar outros trabalhos para suprir as perdas financeiras impostas pelas chantagens da gestão da Cemig.

Nossa demanda é por uma resolução para o ACT. Não faremos hora-extra nem ficaremos de sobreaviso até que seja fechado o ACT ou a Justiça determine a sentença normativa. O que reprovamos na proposta é, principalmente, as mudanças sobre o plano de saúde. Somente essa cláusula não vai acabar com o plano nesse momento, mas Cemig ataca o plano por outros meios. Não permitir a escolha dos trabalhadores é retirada de direitos, o que vemos acontecendo nos últimos anos. Precisamos mobilizar!

É importante salientar que, em Salinas, essa organização entre os trabalhadores não foi construída do dia para a noite. A negociação do ACT 2023 não foi o que fez a base mobilizar. Somos combativos há muitos anos. A base de Salinas, na regional Norte, saiu do coronelismo. Quem comandava a Cemig por aqui era o Geraldo Santana, o Nilton Cardoso. Principalmente os trabalhadores que entraram depois dos anos 2000 conseguiram realizar uma análise da base e derrubar esses coronéis. A base deixou de ser controlada por políticos e hoje é controlada pelos trabalhadores. Em Salinas, entendemos o que é luta de classes e estamos há 20 anos nessa movimentação. A decisão atual é fruto desta longeva construção.

Por Vicente Ferreira Nascimento, diretor do Sindieletro e trabalhador da Cemig em Salinas

 

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