Rigor para benefícios cresce e deixa trabalhadores no limbo



Rigor para benefícios cresce e deixa trabalhadores no limbo

 

Neste ano, oito de cada dez benefícios de auxílio-doença revisados foram cancelados. De 242,16 mil perícias feitas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), 193,56 mil “tomaram bomba” em uma operação pente-fino. A meta é avaliar 530,19 mil benefícios que estão sem revisão há mais de dois anos e, com isso, economizar R$ 3 bilhões por ano. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), o objetivo é aperfeiçoar a gestão dos recursos públicos para evitar que segurados que tenham condições de voltar ao trabalho continuem recebendo. A caça às irregularidades também é uma estratégia para cortar despesas e reduzir o déficit das contas públicas.


Mas esse esforço fiscal está refletindo no rigor para conceder novos benefícios, e está cada dia mais difícil conseguir a liberação de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. Quando o INSS fecha as portas, para muitos o caminho tem sido recorrer à Justiça.

Valdinei de Carvalho, 30, é cego do olho direito e tem apenas 20% da visão do olho esquerdo por causa de uma catarata congênita. Em outubro do ano passado, quando o problema se agravou, foi afastado da empresa de transporte onde trabalhava como despachante. A empresa pagou os primeiros 15 dias, como manda a lei. O INSS pagou dois meses e o liberou para o serviço, porém o médico do trabalho da empresa não aceitou seu retorno. Desde então sem receber, Carvalho está em um limbo e aguarda uma decisão da Justiça Federal.

“Eu tenho vários laudos, inclusive do médico que me acompanha desde a infância. O médico da empresa também disse que não tenho condições de voltar ao trabalho. Já fiz três perícias, mas o INSS negou. Entrei com um processo pedindo a aposentadoria por invalidez e estou esperando”, conta Carvalho.

Alaor Gomes de Morais, 55, também procurou a Justiça. Em junho deste ano, ele, que é diabético, teve um problema na coluna, ficou cerca de um mês internado e foi afastado da empresa. Em julho, o INSS o liberou, mas, no mesmo dia em que voltou, foi demitido do cargo de despachante de uma empresa ferroviária. De lá para cá, a doença foi se agravando. Hoje ele não consegue mais andar. “Estou sem fazer nada. Também sou cabeleireiro, mas como vou cortar cabelo se não consigo ficar em pé? Tentei auxílio-doença e me negaram. Agora dei entrada na Justiça para pedir aposentadoria por invalidez. Eu acho que o governo está fazendo tudo isso só porque não quer gastar”, diz.

Para o professor de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Faculdade IBS) e especialista em gestão governamental Cláudio Alfradique, a operação pente-fino é um movimento do governo para diminuir gastos com a máquina pública. “Esses mecanismos de endurecimento da avaliação nas perícias para fazer ajuste fiscal não é uma política pública que traz resultados, até porque as pessoas que estão na fila para receber os benefícios têm nível de renda muito baixo e, provavelmente, não conseguirão outra ocupação”, avalia.

O QUE É

Aposentadoria por invalidez: concedida ao trabalhador permanentemente incapaz de exercer qualquer atividade e que não possa ser reabilitado

Auxílio-doença: benefício dado em caso de doença ou acidente que torne o trabalhador temporariamente incapaz


LEI

Segurado tem direito a nova perícia

O fato de a perícia ignorar as avaliações dos médicos do trabalho e também dos especialistas que acompanham o paciente fora do INSS é uma das maiores revoltas dos trabalhadores que têm os pedidos de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez negados. Questionado sobre os critérios usados na hora de considerar os relatórios externos, o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) respondeu que as avaliações são respaldadas pela lei: “As informações dos médicos apresentadas pelos segurados são parte da avaliação pericial, com prerrogativa da lei 10.876/2004, pautada pelos conhecimentos técnicos médicos, profissionais, pela legislação previdenciária e pelo código de ética médica. É importante ressaltar que existe previsão legal dada ao segurado para realização de nova perícia”.

 Jornal O Tempo

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