A Cemig agiu para manter a AeC, fundada pelo ex-secretário de Desenvolvimento Econômico do governo Zema, Cássio Azevedo, como prestadora do serviço de call center mesmo após a empresa perder uma licitação. Essa foi a avaliação feita pelo relator da CPI da Cemig na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), Sávio Souza Cruz (MDB), durante o depoimento na segunda-feira (8) do outro fundador da AeC, Antônio Guilherme Noronha Luz.
A AeC prestava serviços de call center para a Cemig desde 2008 e venceu três licitações seguidas. Porém, perdeu a quarta concorrência, realizada em fevereiro de 2020. A vencedora foi a Audac, que fez uma proposta R$ 500 mais barata em um lance que alcançou R$ 88,5 milhões.
A Cemig prorrogou excepcionalmente o contrato com a AeC em fevereiro do ano passado por até 12 meses para não interromper o serviço de call center e dar tempo para que a Audac fizesse a transição da operação.
Porém, segundo Antônio Luz, a estatal não demonstrou neste período intenção de romper o contrato de transição para concretizar a migração do serviço para a Audac.
“A Cemig nunca nos comunicou nada. Estávamos aguardando essa transição e ficamos no escuro. Mas, pelo contrato, eu tinha obrigação de ficar até um ano fazendo o atendimento à população de Minas Gerais”, disse o fundador da AeC, que acrescentou que as restrições impostas pela pandemia lhe trouxeram prejuízos durante o período de prorrogação. “Eu tomei prejuízo vários meses em cima disso. Eu fiz solicitação por escrito para a Cemig várias vezes para antecipar [romper] esse contrato”, afirmou.
A resposta chamou a atenção de Sávio Souza Cruz. “Parece claro que de fato nunca houve por parte da Cemig a intenção de respeitar o processo licitatório. Por alguma razão, e a gente não tem dificuldade de imaginar quais, a Cemig queria manter a AeC prestando esse serviço”, disse o relator.
O ex-secretário de Desenvolvimento Econômico, Cássio Azevedo, foi anunciado para o cargo pelo governador Romeu Zema em outubro de 2019, mas só assumiu oficialmente em março de 2020 — no mesmo período da licitação perdida pela AeC e a prorrogação do contrato por 12 meses. Azevedo morreu em junho deste ano devido a um câncer.
O deputado Zé Guilherme (PP), integrante da base do governo Zema, considerou que o depoimento da segunda-feira (8) demonstrou que não houve interferência política para favorecer a empresa.
“Aqui se fala muito de que houve uma proteção, uma forma, de escolher a AeC no processo da Cemig porque o sócio Cássio era secretário do governo Zema. Só que em 2008 não existia nem partido Novo e a empresa estava lá na Cemig. A AeC passou pelo governo do PSDB, pelo do PT, e entrou no governo do Novo. Vamos respeitar a memória do sr. Cássio”, disse o deputado.
O ex-diretor de Suprimentos da Cemig, João Polati Filho, disse em depoimento à CPI em setembro que o atual presidente da estatal, Reynaldo Passanezi Filho, o pressionou para mudar o resultado da licitação e declarar a AeC vencedora. "O presidente me chamou na sala dele e disse: ‘Polati, encontre uma forma de tornar a empresa AeC ganhadora. São apenas 500 reais’”, relatou o ex-diretor, que acrescentou não ter cedido à pressão.
Mesmo assim, a Audac não assumiu o serviço de call center. Segundo o presidente da empresa, estava tudo preparado para que isso ocorresse em outubro de 2020, mas a estatal nunca deu a ordem para o início do serviço.
A Cemig acabou cancelado o contrato com a Audac no início de 2021 e contratou a IBM, sem licitação, por R$ 1,1 bilhão, para implantar um serviço de atendimento integrado ao cliente — com call center, atendimento online e presencial.
A IBM então subcontratou a AeC para prestar o serviço de call center, com anuência da Cemig. Assim, mesmo tendo perdido a licitação inicial, a empresa continua prestando o serviço mediante um contrato temporário de três meses, que já foi renovado duas vezes. Apesar disso, Antônio Luz disse que o contrato não é vantajoso.
“O contrato da IBM mata o meu trabalho. O contrato da IBM é o atendimento humano, que sou especializado, indo para a robotização”, afirmou o sócio-fundador da AeC, sem conseguir convencer os deputados.
Em nota, a IBM disse que "opera em aderência às leis brasileiras e está cooperando com as autoridades locais em sua investigação".
Cemig diz que não tem mais contrato com a AeC
A Cemig disse, em nota, que atualmente não possui contrato com a AeC. "Isso ocorreu até fevereiro deste ano, quando 14 fornecedores distintos ainda prestavam serviços de atendimento ao cliente à Cemig e cuidavam de diferentes canais (call center, Whatsapp, site, agências físicas, totens e etc.). A AeC era responsável apenas pelo call center", disse a estatal.
"Atualmente, o atendimento na Cemig é feito por meio do Projeto Cliente +, que tem como escopo a integração de todos os canais de atendimento em uma única plataforma (omnichannel), com o uso de inteligência artificial para um atendimento rápido e fácil. A IBM é a parceira estratégica da Cemig nesse projeto', afirmou a Cemig.
Segundo a empresa, o projeto Cliente + remunera por resolução e não por tempo do atendimento, o que a Cemig afirma que beneficia os clientes e reduz custos. "Na parceria com a IBM, é prevista uma economia de cerca de R$ 500 milhões em 10 anos. O programa estará completamente implantado em breve", conclui a nota.
Sócios da AeC doaram R$ 110 mil à campanha de Zema e ao Novo
Os sócios fundadores da AeC, Antônio Luz e o ex-secretário Cássio Azevedo, doaram R$ 50 mil cada para o diretório do Novo em Minas Gerais nas eleições de 2018 e R$ 5 mil cada para a campanha do governador Romeu Zema (Novo). As informações estão disponíveis no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
"Já fizemos doações em outras eleições para o Aécio e para o Pimentel”, respondeu Antônio Luz ao ser questionado sobre o tema durante o depoimento desta segunda (18). Ele disse que não é filiado ao Novo.
Fonte: O Tempo, por Pedro Augusto Figueiredo