Reforma Trabalhista agravou a precarização e o desemprego, aponta especialista



Reforma Trabalhista agravou a precarização e o desemprego, aponta especialista

Os dados divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que no último trimestre (abril, maio e junho) houve uma redução dos trabalhadores com carteira assinada no setor privado, aumento no número de pessoas que não estão procurando emprego. É o que o IBGE chama de desalentados que são 400 mil brasileiros. No total, são mais de 17 milhões de pessoas sem trabalho e um aumento também de trabalhadores por conta própria. No Rio de Janeiro, esta realidade não é diferente. Conversamos sobre essa situação com Carol Gagliano que é socióloga e técnica do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE).

Brasil de Fato:Aqui no Rio observamos o desemprego em alguns setores como o da cadeia do petróleo, mas não é só isso, não é? Com essa crise econômica que também é uma crise política, queria que você explicasse como isso tem se traduzido para a população do Rio. Nós já vivemos momentos piores que esse?

Carol Gagliano: A gente não sabe se é o pior momento da história porque as pesquisas mudaram ao longo do tempo. Então, a gente pode dizer que talvez seja o pior momento nos últimos seis anos, que é quando temos essa pesquisa mais recente do IBGE que é a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua). E os dados que eles divulgaram hoje referente ao segundo trimestre mostram uma taxa de desocupação muito elevada, uma condição de precarização cada vez maior dos trabalhadores fluminenses. A gente está vendo aumentar o emprego sem carteira assinada, a redução dos postos de trabalho com carteira assinada, com proteção social. E a gente esta vendo crescer a subutilização, que é um conceito novo que o IBGE esta usando, da força de trabalho, que inclui os desalentados, que são aquelas pessoas que já desistiram de procurar trabalho, seja porque não encontram, seja porque não têm dinheiro para sair à procura de emprego e seja porque já estão numa idade que acham que não vão encontrar uma colocação.

Essa questão dos desalentados, que hoje ganha mais visibilidade, são aquelas pessoas que até um tempo atrás desapareciam das pesquisas porque já não apareciam procurando emprego?

Carol: Mais ou menos. Nós no DIEESE, em conjunto com a Fundação SEADE, a gente sempre captou o desemprego de forma a tentar captar esse desempregado pelo desalento. Internacionalmente, pra gente comparar a questão do desemprego no Brasil com a Noruega, com a Nicarágua, ou com o Zimbábue, temos que ter um padrão internacional. O que que define o desemprego? Não é só você não estar trabalhando, você não pode estar trabalhando e você tem que estar procurando emprego. Se a pessoa não está trabalhando, mas ela também não procura emprego, ela não entrava na categoria que a gente chama de desemprego aberto. Mas dada a realidade, as novas configurações do mercado de trabalho, o IBGE tem revisto regularmente essa metodologia. Não só o IBGE mas outros organismos internacionais também tem revisto. E agora estamos entrando nessa utilização desses novos conceitos de subutilização, por exemplo, da força de trabalho e da captação dos desalentados. Eles não estão incluídos nos desempregados, mas eles estão contabilizados como pessoas fora do mercado de trabalho.

O que seria essa subutilização da força de trabalho? São os trabalhadores informais, que a gente tem visto muito nas ruas do Rio de Janeiro muitos trabalhadores informais, muita gente se virando? São esses que vocês chama de subutilização da força de trabalho?

Carol: Não necessariamente. O informal, por incrível que pareça, ele pode entrar na categoria de ocupado. Ocupado sem carteira de trabalho por exemplo.

Ele não é um empregado, mas é um ocupado sem carteira assinada?

Carol: Isso. Está numa construção diferente de quem está com carteira assinada pela questão da proteção social, e de uma série de direitos que ele não tem. Mas para o IBGE a subutilização inclui ocupados com insuficiente de horas trabalhadas. Então, por exemplo, se você pensa na reforma trabalhista e você pensa no tal do contrato intermitente em que a pessoa trabalha por hora, e num determinado mês uma pessoa só trabalhou apenas 15 horas e aquilo não foi suficiente para compor uma renda, essa pessoa está ocupada, mas ela está incluída nessa categoria de insuficiência das horas trabalhadas. Ela tem disponibilidade, ela quer trabalhar mais horas, ela só não conseguiu encontrar trabalho para essas horas que ela tem disponível. Isso é um componente dessa subutilização da força de trabalho. Os desocupados tradicionais, também estão nessa subutilização da força de trabalho, que é o desempregado clássico, que não está trabalhando e está a procura do emprego e tem também a força de trabalho potencial, são essas pessoas que estão fora do mercado de trabalho que aí incluem os desalentados. Elas estão fora do mercado de trabalho porque elas desistiram, elas acham que não tem mais espaço para elas então nem se dão ao trabalho de procurar.

E aí a gente vê uma situação complicada. O termo desalentado ele é muito forte, porque traduz muito esse sentimento da pessoa que tem a força de trabalho, que tem capacidade, mas que cansou de procurar,  de ter porta fechada e não ver oportunidade. Agora, você falou da reforma trabalhista, não posso deixar de te perguntar. Como é que fica esse cenário dos postos de trabalho com a questão da reforma trabalhista?

Carol: A nosso ver, a situação não tende a melhorar com essa reforma. Dada essas novas formas de contratação que a reforma trabalhista traz a tendência, e que a gente já está verificando mesmo em tão pouco tempo de aplicação da reforma, é a precarização da inserção do trabalhador. Então, por exemplo, a insuficiência das horas trabalhadas era um negócio mais difícil de ser pensado no contrato de trabalho padrão de 44 horas semanais, agora é uma realidade muito mais palpável com as possibilidades de trabalho intermitente, trabalho parcial e outras forças de flexibilização da jornada de trabalho.

Flexibilização é um termo que chega a dar calafrios, porque você está usando tecnicamente o termo…

Não é um termo neutro, apesar do que possa parecer.

Não, não é. A flexibilização pode ser traduzida por precarização, por insegurança absoluta. Pode ser um termo muito positivo, mas pode ser um termo muito perigoso?

Sem dúvida nenhuma.

A partir desses dados que foram recentemente divulgados, sobre a questão do nível salarial e qualidade de vida da classe trabalhadora aqui no Rio de Janeiro, porque não é possível descolar do Brasil, mas vivemos aqui a nossa situação específica. Como fica isso?

A situação dos rendimentos também tende a piorar. Seja porque você tem menos gente trabalhando e compondo a renda da família, seja porque os salários, também em um contexto de desemprego, tendem a ser rebaixados na procura por trabalhado. Então não é incomum você ver pessoas que saíram de um determinado trabalho ganhando um determinado patamar salarial, quando desempregados aceitam um emprego com um salário menor porque tem que trabalhar para se sustentar. Então, é uma situação bastante complicada. A gente tem visto nas negociações que assessoramos pelo DIEESE junto ao movimento sindical, dado o patamar de inflação baixa, de certa forma o poder de compra não está sendo concorrido de quem está trabalhando. Mas de fato o rendimento das famílias tem caído sim.

O custo de vida está bastante alto. Você falou da questão de quem está tentando se reinserir no mercado de trabalho, mas muitas vezes quem está no mercado de trabalho aceita não ter aumento, aceita ampliar a sua carga horária, aceita acúmulo de função, até por uma questão de sobrevivência?

Sem dúvida.

E aí a qualidade de vida acaba caindo?

Com certeza, seja porque você está trabalhando mais e ganhando menos, você tem menos tempo disponível para a sua família, menos tempo disponível para o lazer, mais atividades domésticas acumuladas, é uma situação muito dramática.

Fonte: Jornal Brasil de Fato

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