Racismo estrutural segrega negros no mercado de trabalho



Racismo estrutural segrega negros no mercado de trabalho

Em 2019, o salário médio de trabalhadores negros foi 45% menor do que do que o dos brancos, de acordo com a Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A mesma pesquisa mostra que entre as mulheres negras a situação é pior ainda. A média salarial para elas chegou a ser 70% menor do que das mulheres brancas.

E não importa o grau de escolaridade, mesmo negros com curso superior ganham menos que os brancos. De acordo com uma pesquisa do Instituto Locomotiva, o salário médio de homens não negros com ensino superior em 2019 ficou em R$ 7.033,00, enquanto o dos negros ficou em R$ 4.834,00, uma diferença de 31% a menos. 

Já as mulheres negras com formação superior receberam no ano passado salário médio de R$ 3.712,00 contra R$ 4.760,00 das mulheres brancas.

Os negros também ocupam menos os cargos de diretoria. De acordo com uma pesquisa do site Vagas.com, somente 0,7% dos cargos mais altos de empresas são ocupados pelos negros, que ainda de acordo com a pesquisa, ocupam 47,6% dos trabalhos operacionais.

Os dados da pesquisa apontam outras desigualdades. O ano de 2019 fechou com índice geral de desemprego em 13,3%. No recorte racial, a taxa chegou a 17,8% entre os pretos e 15,4% entre os pardos. Para os brancos ficou em 10,4%. E mais: o percentual de pretos ou pardos na informalidade chegou a 47,4% em 2019, enquanto entre os trabalhadores brancos foi de 34,5%.

Depois de todos esses números comprovando a enorme desigualdade, muitos devem ser perguntar: por que o negro ocupa postos precários e de menor renda no mercado de trabalho e por que o desemprego atinge mais a população negra do que a não negra?

Para ter a resposta é preciso estudar a história e analisar as raízes do racismo no Brasil, dizem os estudiosos do tema.

Ao assinar a Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, a Princesa Isabel, teoricamente, colocou fim à escravidão no Brasil. O que não se ensina na maioria das escolas desde então é que não houve a criação de nenhuma medida de proteção social aos escravos, que estariam em liberdade e jogados à própria sorte.

Sem trabalho nem renda para sobreviver, as mulheres tiveram de se sujeitar a continuar servindo aos fazendeiros em serviços domésticos, por pequena remuneração, ou em troca de comida e casa para morar. Os homens foram simplesmente descartados e jogados à margem da sociedade.

Vem daí o termo ‘marginalidade’, já que esses homens praticavam delitos para poder comer e garantir um mínimo de sobrevivência. E com o passar dos tempos, estigmatizados, os negros continuaram submetidos às oportunidades de trabalho mais precárias, na grande maioria, trabalhos braçais.

Rosana Fernandes, secretária-adjunta de Combate ao Racismo da CUT, explica que a herança da escravidão ficou e hoje a população negra ainda convive com a discriminação, que se reflete diretamente no mercado de trabalho.

Para comprovar que esta realidade persiste, é possível fazer o ‘teste do pescoço’, proposto pela ativista Luh de Souza e idealizado pelo professor Francisco Antero no projeto História Preta – Fatos e Fotos.  De forma lúdica, o teste propõe que as pessoas “metam o pescoço” em espaços para contar quantos negros ali estão.

“Meta o pescoço dentro das joalherias, por exemplo, conte quantos negros e negras são balconistas. Vá a escolas particulares como Objetivo, Dante Alighieri, entre outras, e espiche o pescoço nas salas de aulas para contar quantos negros há. Conte também quantos professores. Vá a hospitais como Sírio Libanês e conte nos quartos quantos pacientes são negros (...) e quantos negros médicos há”, diz trecho do artigo.

Outras situações ainda são citadas como ‘meter o pescoço’ nas cadeias, orfanatos, casas de correção para menores e contar quantos são brancos, e “espichar o pescoço numa reunião dos partidos PSDB e DEM, como exemplo, e contar quantos políticos são negros desde a fundação”.

“A realidade comprova que os negros ocupam, de fato, postos de trabalho sem proteção social, com menores valores salariais, sem direitos, empregos em que a opressão e assédio moral e sexual estão representes”, diz Rosana.

Ela afirma também que os negros são os primeiros a perder o emprego em tempos de crise econômica, em especial as mulheres negras. 

Pandemia

A desigualdade ficou ainda mais acentuada por causa da pandemia do novo coronavírus (Covid-19), que sem políticas efetivas de proteção ao emprego e a renda por parte do governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL), acabou aumentando os índices de desemprego.

De acordo com os dados da Pnad Continua, ao final do 4° trimestre de 2020, cerca de 7,4 milhões de trabalhadores negros – homens e mulheres - saíram da força de trabalho. Eles deixaram de procurar emprego por não acreditar na possibilidade de recolocação. Entre os brancos, o número foi bem menor: 2,7 milhões.

Dos oito milhões de pessoas que perderam o emprego no primeiro semestre deste ano, 6,3 milhões eram negros e negras, o representa 71% do total.

Essa realidade escancara o preconceito, a posição de desproteção social e a falta de políticas públicas efetivas que promovam igualdade social.

Não pode ser normal

Para Rosana Fernandes, o racismo estrutural e velado no Brasil submete a sociedade a uma naturalização das condições desiguais para os negros.

“As pessoas acham que é tudo normal, que na sociedade é natural discriminar pela cor da pele, que é natural o negro receber menos e que os trabalhadores negros estejam em postos mais precarizados”, ela diz.

Rosana explica também que essa forma de enxergar essas situações como normais são causadas por uma democracia racial que não existe no país.

“A sociedade tem que enxergar que não é democrático, não é natural, não é justo haver diferença nas oportunidades. Quando alguém branco vai disputar uma vaga de trabalho com um negro, fica muito evidente. Na grande maioria dos casos, quem vai levar vantagem é o branco”, afirma Rosana.

Luta diária e constante de todos

Enfrentar o racismo não pode ser uma luta somente da população negra, diz a dirigente. “Tem que ser também daquelas pessoas que não são negras, dos brancos, para que, de fato, a gente mude a sociedade. E para isso, tem que mudar as estruturas, alterar a ideia sobre racismo e só assim construiremos sociedade igualitária, em que todos sejam respeitados sem que levem em consideração se é mais ou menos capacitado pela cor da pele”, ela pontua.

Fonte: CUT

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