Num momento de crise econômica com o índice de desemprego do país na casa de 12,6%, atingindo 12,8 milhões de pessoas, e com possibilidade de aumentar ainda mais por causa da pandemia do novo coronavírus (Covid-19), a proteção ao trabalhador torna-se cada vez mais necessária, e por isso é preciso cuidado ao analisar as propostas que tramitam na Câmara dos Deputados que, em tese, facilitariam a vida de empresários e trabalhadores. A avaliação é do diretor técnico do Dieese, Fausto Augusto Júnior, da economista da Unicamp, Marilane Teixeira, e do advogado trabalhista Fernando José Hirsch, do LBS Advogados .
Mas um dos Projetos de Lei (PL) em tramitação, na Câmara dos Deputados, é o de nº 2952/20, que autoriza a recontratação de um trabalhador ou trabalhadora, demitido sem justa causa, dentro de 120 dias, durante o estado de calamidade pública, que vai até o dia 31 de dezembro deste ano.
Hoje, o artigo 2° da Portaria nº 384/92 do extinto Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) considera fraudulenta a rescisão seguida de recontratação ocorrida dentro de 90 (noventa) dias subsequentes à data em que formalmente a rescisão foi feita.
A professora de economia, Marilane Teixeira, diz que o cuidado na análise é necessário porque o impedimento de 90 dias para recontratação de quem foi demitido sem justa causa era, à época da portaria do MTE, necessário para evitar que as pessoas demitidas acessassem o seguro-desemprego e o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e continuassem a prestar serviços para a mesma empresa onde foi demitido, até mesmo com salário menor.
“Hoje, diante da pandemia, a proposta do PL não é de toda ruim, mas é preciso que tenha uma proteção maior no sentido de que esse trabalhador demitido volte a ser contratado com salário abaixo do que recebia anteriormente”, diz Marilane.
A preocupação com o rendimento do trabalhador é compartilhada pelo Coordenador-Técnico do Dieese, Fausto Augusto Júnior. Para ele, são três problemas que o PL não responde.
Primeiro, se a pessoa demitida vai ser contratada com o mesmo salário ou a empresa vai utilizar a pandemia para reduzir o valor pago ao trabalhador.
Segundo, se esse trabalhador demitido vai receber de fato todas as verbas rescisórias a que tem direito, que são: o saldo de salário (correspondente aos dias trabalhados pelo trabalhador), o aviso-prévio (trabalhado ou indenizado e proporcional ao tempo de serviço), férias vencidas e proporcionais acrescidas de 1/3, 13º salário proporcional, indenização de 40% dos depósitos do FGST. Neste caso, a demissão de um trabalhador mais antigo numa empresa, com, por exemplo, 10 anos de carteira assinada, se receber tudo o que tem direito vai custar para a empresa, pelo menos, o valor de 10 salários que esse trabalhador recebia. Portanto, não seria vantajoso para a empresa demiti-lo por quatro meses e readmitir. “Neste caso é um custo inútil porque uma empresa não vai pagar 10 meses de salários para economizar quatro meses”, avalia Fausto.
O terceiro ponto é se a validade da readmissão antes do prazo legal vai ser mantida após a pandemia.
“Se for possível demitir e readmitir independentemente do período de calamidade pública, poderá haver maior rotatividade de trabalhadores com salários menores do que os contratos iniciais”, teme Fausto.
Já o advogado Fernando Hirsch é taxativo. Para ele, o PL pode aumentar as fraudes trabalhistas.
“Isso já ocorria e foi para evitar essa prática que na própria CLT [Consolidação das Leis do Trabalho] tem diversos artigos anulando os atos praticados em decorrência de fraude. E foi nesse sentido, com o objetivo de dificultar rescisões contratuais fraudulentas, para levantamento do FGTS e o seguro-desemprego, que foi expedida a Portaria 384/92”, afirma Hirsch.
Fonte: CUT