Quando assumir o governo de Minas Gerais em janeiro, Fernando Pimentel (PT) vai abraçar uma disputa iniciada por seus adversários do PSDB contra a União: a entrega de três usinas hidrelétricas que pertencem à Cemig. O governo de Dilma Rousseff (PT) entende que com as mudanças nas regras do setor elétrico, lançadas em 2013, a Cemig não tem direito à renovação da concessão dessas usinas. A empresa diz que tem esse direito, uma posição que foi bancada pelo então governador de Minas, Antonio Anastasia (PSDB), e pelo atual, Alberto Pinto Coelho (PP).
"Nós gostaríamos de manter essas usinas e vamos lutar para ficar com elas", afirmou o vice-governador eleito de Minas Gerais, Antonio Andrade (PMDB), ao Valor PRO, o serviço de informações em tempo real do Valor. "Nesse caso, fazemos coro com o atual governo no sentido que as usinas fiquem com Minas Gerais, com a Cemig", disse ele na sede do diretório do PMDB, em Belo Horizonte.
As usinas em questão são Jaguara, Miranda e São Simão. Em 2013, a Cemig recorreu ao Superior Tribunal de Justiça para garantir a renovação da concessão sobre Jaguara. O julgamento ainda não terminou, mas o placar está três votos a dois para a União e a usina continua sendo administrada pela Cemig com base em liminar. A atual direção da empresa já indicou que levaria também à Justiça a discussão sobre as outras duas, se fosse preciso. "Se não tiver um acordo, a Cemig continuará brigando na Justiça", disse Andrade. "Se não houver entendimento, a disposição é continuar brigando." Controlada pelo governo de Minas, a Cemig tem ações negociadas na Bovespa, na bolsa de Nova York e na de Madri.
Nessa fase de transição de governo, Andrade tem participado mais ativamente não tanto de assuntos relacionados às estatais de Minas, mas da composição da base parlamentar de Pimentel. Mesmo assim, ele tem se envolvido em discussões sobre temas econômicos. Deputado federal em seu segundo mandato, presidente do PMDB de Minas e ex-ministro da Agricultura de Dilma, Andrade vem conversando com lideranças de partidos que não estiveram ao lado do PT e do PMDB nas eleições para trazê-los para a base.
Os cinco partidos da aliança de Pimentel e Andrade elegeram 26 deputados estaduais. O novo governo precisa de pelo menos 41 para aprovar projetos. "Para aprovarmos emendas constitucionais, precisamos de 52", diz Andrade. A definição do novo secretariado vai depender da formação dessa nova base, disse Andrade. Será a primeira vez que o PT governará Minas Gerais e será o mais rico dos Estados sob uma administração petista pelos próximos quatro anos. O novo governo planeja várias mudanças de rota após praticamente doze anos de governo do PSDB. Algumas dessas mudanças têm relação com a própria Cemig, a maior estatal mineira.
Uma delas é óbvia: a indicação do novo presidente para companhia. Um nome que passou a ser especulado é o do atual presidente da Eletrobras, José da Costa Carvalho Neto. Ele é mineiro e mantém boas relações com Pimentel. "Não foi ventilado por parte do Pimentel nenhum nome. Não foi discutido ainda nenhum nome", disse Andrade. "Sem saber a realidade de cada empresa, porque nós não sabemos ainda, é até difícil compormos os nomes de quem vai dirigir cada empresa, cada secretaria. Como vamos chamar alguém sem saber o tamanho do desafio?"
Outra mudança diz respeito a uma política que permita a redução das tarifas. A opção é a redução da incidência do ICMS sobre a energia elétrica. "Queremos fazer das estatais Cemig, Gasmig e Copasa empresas indutoras de desenvolvimento, de apoio à população, e não geradoras só de recursos, de dividendos. Não é objetivo dessas empresas apenas o lucro, o objetivo maior é fazer que os mineiros tenham lucro", disse o vice-governador eleito.
Andrade reitera o que tem sido dito pelo grupo de Pimentel sobre a negociação de um acordo que a atual direção da Cemig tem com a Gas Natural Fenosa, da Espanha. Segundo o vice-governador eleito, não há nenhuma disposição em fazer o que seria chave para o acordo: a privatização da Gasmig, a distribuidora de gás do Estado controlada pela Cemig. O acordo prevê a criação de uma nova distribuidora de gás, mas para isso seria preciso - por exigência dos espanhóis, segundo já disse Djalma Bastos de Morais, atual presidente da estatal mineira - a privatização da Gasmig.
O governo chegou a elaborar um texto para ser votado na Assembleia Legislativa abrindo caminho para a privatização. Mas, diante de críticas e do clima da pré-campanha eleitoral, o texto foi engavetado. A questão é que há uma urgência em jogo: a construção de um gasoduto que abasteceria a fábrica de amônia que a Petrobras constrói em Uberaba. Pelo acordo, o duto seria feito pela nova distribuidora de gás.
"Nós não gostaríamos da ideia de privatizar a Gasmig. O que temos conversado é sobre a não privatização da empresa. Se chegarmos a fazer isso, será a contragosto, porque será necessário. Mas a princípio, a ideia é não privatizar nenhuma empresa", disse Andrade. A Fenosa afirmou que não iria fazer, neste momento, nenhum comentário sobre as conversas com a Cemig. Uma alternativa que tem sido levantada pelo PT é de um possível empréstimo a ser tomado pela Cemig para custear a obra.
Empréstimo também é uma alternativa a ser estudada para outra questão difícil que Pimentel e Andrade herdarão: a dívida com a União. "O que sabemos hoje é que vamos receber um Estado com alta dívida pública, alta carga tributária, em situação financeira péssima", diz o peemedebista. E acrescenta, a comissão de transição do novo governo ainda não recebeu informações detalhadas do governo atual.
Andrade diz que a nova gestão vai quebrar um imobilismo que, segundo ele, imperou nos últimos governos de Minas em relação à dívida. Para ele, desde que Itamar Franco foi governador (1999-2002), "ninguém fez nada".
"O que vamos fazer é algum movimento no sentido de renegociar essa dívida. Se não tivermos autorização legislativa para trocar o indexador atual, vamos renegociar tomando empréstimo mais barato com o aval do próprio governo federal", disse. A ideia seria trocar uma dívida com juros altos por uma com juros menores. "Essa é uma hipótese que o Pimentel está estudando, mas primeiro precisamos saber qual é, em detalhes, a situação do Estado." A Secretaria da Fazenda do Estado informou em outubro que o montante da dívida com a União está em R$ 71,6 bilhões. O Estado já pagou quase R$ 30 bilhões e compromete cerca de R$ 6 bilhões por ano com as parcelas.
"Do jeito que está hoje, essa dívida é impagável", disse Andrade. Para lidar com a questão, o governo do PSDB centrou fogo na tese da troca do indexador. O projeto que trata disso está no Congresso.
Andrade reafirmou promessas de campanha feitas por Pimentel e por ele, entre elas o pagamento do piso salarial aos professores, elevar investimentos na segurança e na saúde. "Todas as promessas serão cumpridas até o final do governo."