A cidade de Araucária, no Paraná, deve registrar, em média, uma morte por dia até o final do mês de julho em consequência de complicações causadas pela Covid-19, doença provocada pelo novo coronavírus. E todas essas vidas perdidas estarão relacionadas à decisão da Petrobras de determinar uma parada de manutenção na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), que vai provocar aglomeração na unidade, inclusive com a vinda de trabalhadores de outros estados.
A estimativa consta na “Nota Técnica COVID-19: Avaliação de risco para Araucária, no estado do Paraná”, divulgada na quinta-feira (15) por grupo de pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e outras instituições cientificas.
A parada de manutenção, que coloca 2 mil trabalhadores a mais na produção, provoca aglomerações e o consequente aumento da possibilidade de circulação do vírus que, com as novas cepas são mais transmissíveis e letais.
A equipe de cientistas que fez a pesquisa sobre o avanços da pandemia em Araucária é a mesma que previu a tragédia de Manaus.
De acordo com a Nota Técnica que eles divulgaram, “o fluxo de pessoas que se estima receber de outros estados e municípios em Araucária para a parada de manutenção realizada pela Petrobras tende a propiciar maior circulação viral, que resultará na média de cerca de uma morte por dia até o final de julho, sendo que para todo o mês de junho, pode-se esperar pelo menos 35 mortes”.
Na última segunda-feira (12), os petroleiros e petroleiras da Refinaria Presidente Getúlio Vargas paralisaram as atividades reivindicando respeito à vida e a saúde. A categoria exige que a petroleira suspenda por tempo indeterminado a manutenção da unidade pelo menos durante o período crítico da pandemia.
Para chegar na estimativa de mortes provocadas pela parada de manutenção na Repar, os pesquisadores utilizaram uma análise de risco com base em previsões a partir de modelos Susceptíveis – Expostos – Infectados – Recuperados (SEIR).
Com base nesse método algumas cidades têm evitado colapsos do sistema de saúde e salvado vidas. “Exemplo disso é Curitiba, que adotou medidas restritivas entre o período 13 de março a 04 de abril, se guiando por recomendações de uma nota técnica que utilizou o modelo SEIR, o que evitou que a terceira onda atingisse uma proporção quatro vezes maior que a primeira e segunda ondas vivenciadas pela capital paranaense”, diz a nota dos pesquisadores.
“ O modelo SEIRS de reavaliação de Curitiba apontou que mais de 1500 vidas foram salvas pelo isolamento social empregado no município”, destaca a análise.
Os mesmos pesquisadores realizaram um estudo semelhante em Manaus quatro meses antes da segunda onda da pandemia do novo coronavírus na capital do Amazonas, que chamou a atenção do mundo quando pacientes começaram a morrer asfixiados por falta de oxigêncio. Na época, os pesquisadores alertaram o poder público local sobre a tragédia que estava por vir. Porém, as medidas recomendadas não foram adotadas pelo município.
Os perigos, alerta o estudo sobre Araucária, não estão restritos ao município. “Realizar tal manutenção neste momento da pandemia representa um risco para toda a população de Araucária, como também para a grande Curitiba e municípios vizinhos, uma vez que a pandemia em Curitiba não sofreu recrudescimento adequado atingindo limiares de controle, e apresenta capacidade máxima de ocupação das UTIs. Potencialmente, existe risco para todo o estado do Paraná”, dizem os cientistas.
Sobre as potenciais vítimas, a Nota Técnica aponta os trabalhadores da parada, com o agravante de envolver “risco de transmissão cruzada de diferentes variantes, dado que se estima receber pessoas de vários estados com circulação de variantes que atualmente não circulam no Paraná.
A nota alerta ainda para os riscos de disseminação ampla das seguintes variantes P.1 (Manaus); P.2 (Rio de Janeiro); B.1.1.28 (Distrito Federal); B.1.1.7 (Inglaterra); B.1.1.143; B.1.235 e B.1.1.94.
Com recomendações de contenção de danos da parada de manutenção da Repar, o estudo sugere a postergação do procedimento até a “imunização via vacina de 70% de toda população de Araucária, no limiar de imunidade de rebanho”.
“A permanência de pessoas exógenas no município, neste momento da pandemia, pode aumentar os níveis de transmissão e disseminação de variantes do SARS-CoV-2 não registradas no estado, de forma que se recomenda que pessoas de fora não permaneçam no município esperando retomada das atividades, uma vez que se poderia demorar meses para que a imunização da população seja atingida nos limiares de segurança para tal”, diz a nota técnica.
Além de pesquisadores do INPA e da UFMG, a equipe científica responsável pelo estudo de Araucária reúne pesquisadores da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), Universidade Federal do Amazonas (UFAM), além de uma pesquisadora aposentada do Butantan.
Fonte: CUT, com informações de Davi Macedo, do Sindipetro PR/SC