Na calada da noite do último dia 19, em um Congresso Nacional esvaziado, o povo brasileiro quase foi vítima de mais um golpe parlamentar. Após uma intensa articulação de bastidores, deputados tentaram colocar em votação - e aprovar – um projeto de 2007 que tinha o objetivo indecente de anistiar os parlamentares que utilizaram o famigerado “caixa 2” em campanhas eleitorais anteriores, e que são alvo da Operação Lava Jato.
A sessão que tentou votar o projeto seria cômica, se não fosse tão trágica. Expôs, sobretudo, a mediocridade e a falta de escrúpulos dos nossos representantes. Se a votação que aprovou a admissibilidade do impeachment da presidente Dilma, meses antes, foi constrangedora, faltam adjetivos para classificar a sessão da última segunda-feira.
Para começar, o tal projeto entrou em votação sem a convocação explícita e sequer houve aprovação prévia do texto. O relator da proposta, escolhido na última hora, afirmou que não sabia do que se tratava. O presidente da sessão, Beto Mansur (PRB-SP), também afirmou que desconhecia o teor da proposição. "Pediram para que eu presidisse a sessão. Eu não sei um artigo desse projeto, uma linha. Eu estava apenas cumprindo minha função de brasileiro. Não tenho nada a ver com caixa 2”, tentou se dedefnder o parlamentar.
Nos bastidores da Câmara, fala-se que a articulação em torno do projeto partiu de deputados do PSDB e PP (partido que tem mais nomes investigados na Lava Jato), mas que envolve a anuência ou o silêncio de quase todas as siglas.
A proposta só não foi votada porque os parlamentares da Rede e do PSOL se revoltaram com o teor do texto e pressionavam para retirá-lo da pauta. Diante dos questionamentos dos “nanicos” e de um passivo e constrangedor silêncio dos líderes das grandes siglas, o presidente da sessão teve que retirar o texto da pauta, repetindo que não era o autor do pedido de votação.
"É um escândalo, é um escárnio, é uma falcatrua, é uma bandalheira que estão querendo fazer aqui para livrar a cara de algumas centenas ou dezenas de parlamentares e empreiteiros também", criticou o deputado Ivan Valente (PSOL-SP).
Mas o atual ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, responsável pela articulação política de Temer pensa diferente e, em entrevista recente, se disse “pessoalmente” favorável à anistia.
Essa foi a primeira tentativa escancarada de colocar em prática o que os áudios envolvendo o senador e ex-ministro de Temer, Romero Jucá (PMDB-RR), investigado na Lava Jato, já pretendia executar: “[...]Tem que resolver essa *p.... Mudar o governo e estancar a sangria”.
Entretanto, ao que tudo indica, essa não será a única tentaiva escancarada de encobrir o caixa 2. Resta-nos, portanto, manter a vigilância sobre os deputados e suas armadilhas constitucionais, pois o golpe não acabou. Continua em curso e a pleno vapor. O projeto não é apenas retirar direitos e conquistas do povo, mas salvar a grande máfia parlamentar que se tornou o Congresso Nacional.