O Apartheid brasileiro



O Apartheid brasileiro

A lei é clara. Define como crime "recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, negando-se a servir, atender ou receber cliente ou comprador" e as penas de reclusão variam de um a três anos; foi exatamente isso o que aconteceu no sábado (11), no shopping JK Iguatemi, em São Paulo, quando uma triagem, respaldada por liminar judicial.

Em janeiro de 1989, ainda no governo do ex-presidente José Sarney, foi promulgada a Lei 7.716, que define os crimes de preconceito de raça ou de cor. O artigo quinto é claro e define como crime "recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, negando-se a servir, atender ou receber cliente ou comprador". As penas de reclusão variam de um a três anos.

Foi exatamente isso o que ocorreu no shopping JK Iguatemi, do empresário Carlos Jereissati, quando seguranças do shopping fizeram uma triagem para definir quem poderia entrar e quem deveria ficar de fora – no segundo grupo, estariam todos aqueles que tivessem aparência de jovens da periferia, ou seja, pardos ou negros.

Cientes de que não poderiam discriminar clientes de forma tão explícita – até porque a lei 7.716 é clara e tem penas severas –, os donos do shopping só conseguiram fazer a triagem porque obtiveram uma liminar judicial. Ou seja: o preconceito foi respaldado pela Justiça. Temia-se que jovens da periferia realizassem no JK Iguatemi, Meca do luxo, em São Paulo, um "rolezinho" – manifestação que afirma a identidade desses jovens e tenta mostrar para a sociedade que não são invisíveis ou cidadãos de segunda classe. No entanto, com a liminar, a Justiça contribuiu para que fosse erguida, em São Paulo, a muralha do preconceito.

Diante disso, o blogueiro Eduardo Guimarães, colunista do 247, afirma que um direito constitucional dos jovens da chamada nova classe média foi violado. E o sociólogo Rudá Ricci compara o rolezinho ao movimento "occupy" – a diferença é que, desta vez, exercido por cidadãos da perifeira .

Tão grave quanto o ocorrido no JK Iguatemi foi o desfecho do "rolezinho" no shopping Itaquera, na zona leste de São Paulo. Lá, os jovens foram agredidos com cassetetes e balas de borracha pela polícia, sem que tivesse havido qualquer registro de violência. Disse o básico: que todos os cidadãos americanos, independente da cor ou da aparência, têm direito de frequentar os mesmos estabelecimentos.

"Tive medo. Já fui em outros rolês, mas desta vez a PM estava batendo até em menina", disse um adolescente de 14 anos. Em nota, a polícia defendeu seus métodos. "No terminal de ônibus, devido ao tumulto, fez-se necessário o emprego de técnicas de controle de distúrbios com uso bala de borracha e de granadas de efeito moral", diz a corporação.

No próximo sábado, dia 18, haverá um novo "rolezinho" no shopping Itaquera. No JK, a liminar ainda impede a entrada de todo e qualquer menor desacompanhado – a menos que convença os seguranças que não tem tipo de jovem da periferia. Ou seja: a justiça consagrou o apartheid brasileiro.

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