O caos do sistema energético no Estado do Amapá, operado por uma empresa privada, pode estar longe do fim, apesar da promessa do ministro das Minas e Energia, Bento de Albuquerque da situação voltar a ser normalizada dentro de 10 dias.
O maior problema, de acordo com o engenheiro elétrico e diretor da Associação dos Engenheiros e Técnicos do Sistema Eletrobras (Aesel),I karo Chaves, é a falta de manutenção, equipamentos e de pessoal capacitado da empresa espanhola Isolux, responsável pelo transformador que pegou fogo na noite da última terça- feira (3) provocando um apagão em 13 dos 16 municípios do Amapá, que deixou mais de 700 mil pessoas às escuras.
“Sem uma revisão completa no sistema de transmissão, qualquer problema que vier a acontecer com o transformador pode provocar um novo apagão”, diz o engenheiro.
Segundo ele, esta situação poderia ser evitada se mudasse o processo licitatório do setor energético brasileiro no qual ganha quem der o melhor preço, sem que haja cláusulas contratuais mais adequadas, passíveis de fiscalização e de suspensão do contrato.
“No setor elétrico brasileiro quem ganha o direito de geração e transmissão, numa licitação, não tem obrigações contratuais detalhadas, como o tipo de equipamento que deve ser comprado, qual a marca e qual a capacitação técnica dos trabalhadores da empresa vencedora. Enfim, detalhes técnicos que poderiam evitar o que aconteceu no Amapá”, diz.
No caso da Isolux, empresa espanhola que venceu a licitação no Amapá, a situação é ainda mais grave pelo fato do gerador reserva estar há quase um ano aguardando conserto. Ou seja, qualquer acidente que viesse a ocorrer, deixaria o estado do Amapá às escuras.
“A Isolux oferece uma baixa qualidade de serviço. Os equipamentos são péssimos, as equipes de manutenção e operação são reduzidas absurdamente. Por isso, que sem uma revisão total que resolva o problema estrutural, a população poderá continuar sofrendo as consequências”, afirma o engenheiro elétrico.
Para Íkaro, a vulnerabilidade da linha de transmissão da Isolux é tão grande que para evitar que novos apagões aconteçam é preciso cassar a concessão da empresa espanhola.
“Poderá haver outro sinistro se não cassarem a concessão e passar para a Eletronorte [estatal], para que ela faça os ajustes necessários, e a subsestação possa ter uma maior confiabilidade”, afirma.
Racionamento de energia favorece os ricos
A energia vai voltando aos poucos nas casas e comércio de Macapá, capital do estado. No sábado (7), a energia foi reestabelecida em 65%. O governo local diz que o racionamento distribui seis horas de energia em média para os bairros. Mas não é isto que está acontecendo relatam o presidente da CUT/AP, Errolflyn Paixão, e a secretária de comunicação, Maria Neuziana Tavares Castro.
Segundo eles, os bairros ricos estão sendo privilegiados em detrimento da periferia, o que causou diversos protestos na capital, Macapá.
“No sábado, a luz voltou no bairro Centrão por volta da meia noite e às 3 da manhã já tinha acabado de novo”, conta Neuziana.
A dirigente diz que para encher a caixa de 5 mil litros de água contou com a boa vontade de um amigo que emprestou um gerador de energia. A água que conseguiu foi distribuída entre os vizinhos, que também aproveitaram o pouco tempo de energia para carregar seus celulares na sua casa.
“Era muita criança chorando com o calor que chega a 40 graus. Nessas horas o que vale é a solidariedade”, afirma.
O presidente da CUT/Amapá confirma que os bairros periféricos são os que mais sofrem com a falta de energia. No bairro Zerão, onde passa a Linha do Equador, a energia não dura as seis horas prometidas pelo governo.
“Além de hospitais e de unidades de saúde, a única casa que não falta energia é a do presidente do Senado, Davi Alcolumbre [DEM-AP], que está fazendo campanha para o irmão dele ser prefeito”, alfineta Paixão.
O engenheiro Ikaro Chaves explica que o racionamento de energia no Amapá é ainda necessário por causa do sistema local. Segundo ele, se queimar um transformador em São Paulo e Brasília, por exemplo, há outros transformadores ao longo da linha de transmissão, o que não ocorre no Amapá.
“Só havia um em funcionamento e o sobressalente, quebrado, só funciona com 150 megawatts. A usina de Coaracy Nunes distribuiu outros 30 megawatts, enquanto a energia da cidade é em torno de 250 a 300 megawatts. Juntos eles atendem no máximo 70% da necessidade de energia do estado. Se voltar a energia rapidamente, a transmissão não vai aguentar e há o risco da energia cair novamente. É como comprar um carro usado que ‘quebra’ mais rápido do que um novo”, diz Íkaro Chaves.
Preços de água e alimentos sobem
Enquanto a energia na capital não é totalmente reestabelecida os relatos são de imensas filas, de aumentos nos preços de alimentação e água.
“ A água mineral que custava R$ 4 agora tem gente cobrando R$ 20. Até a empresa fornecedora pediu para população denunciar os maus comerciantes porque ela diz que não aumentou os preços aos supermercados e lojas. O litro do açaí que custava R$ 12 está sendo vendido em alguns locais a R$ 25. E em tudo que é lugar tem filas. Nos bancos, nos postos de gasolina, nos supermercados. A vida está muito difícil pro povo daqui”, diz indignada a secretária de comunicação da CUT/AP.
Fonte: CUT