No Vaticano



No Vaticano

Mais de 100 líderes de grupos sociais e leigos, 30 bispos engajados com a realidade dos movimentos sociais em seus países e 50 agentes pastorais, além de alguns membros da Cúria Romana, participam esta semana do Encontro Mundial dos Movimentos Populares, que ocorre em Roma até esta quarta-feira (29).

O evento é organizado e promovido pelo Pontifício Conselho da Justiça e da Paz, em colaboração com a Pontifícia Academia das Ciências Sociais, com apoio explícito do Papa Francisco. Entre os representantes brasileiros estão a presidenta da Central Única dos Trabalhadores de Minas Gerais (CUT/MG), Beatriz Cerqueira (foto); João Pedro Stédile, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)/Via Campesina; e o secretário-geral da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil, dom Leonardo Steiner. Os participantes foram recebidos na terça-feira (28) pelo papa Francisco.

Movimentos populares de todo o mundo e o Papa Francisco se aproximaram mais durante o workshop “Emergência excluídos”, promovido no Vaticano em 5 de dezembro de 2013 pela Pontifícia Academia das Ciências, em colaboração com a Universidade Lumsa e o Pontifício Conselho Justiça e Paz. Entre os representantes dos movimentos sociais estavam Juan Grabois, da Confederação dos Trabalhadores de Economia Popular, e João Pedro Stedile. No evento, as organizações populares tiveram a oportunidade de ouvir suas próprias vozes no Vaticano, evidenciando a necessidade de “compreender as causas da multiplicação dos excluídos no mundo, ao invés de se concentrar exclusivamente em suas consequências”.

"Estamos profundamente gratos ao Papa Francisco – escrevem no comunicado de apresentação da iniciativa João Pedro Stédile, Juan Grabois, Xaro Castelló (Movimento Mundial dos Trabalhadores Cristãos da Espanha) e Jockin Arputham (Slum Dwellers International) – por esta possibilidade, uma nova demonstração do seu permanente acompanhamento e proximidade não somente dos que sofrem injustiça, mas também daqueles que se organizam e lutam para superá-la."

Participam do Encontro Mundial delegados de organizações populares de todas as partes do mundo (com representações dos camponeses sem terra, dos indígenas, dos precarizados, dos trabalhadores do setor informal e da economia popular, dos migrantes, daqueles que vivem nas periferias urbanas e em ocupações, bem como dos que lutam ao seu lado) e de numerosos bispos dos diversos continentes e da Curia Romana (entre as presenças italianas, algumas das quais consideravelmente surpreendentes, Banco Etica, Associação Trentinos no Mundo, Comitê Amig@s Mst-Italia, Genuíno Clandestino, a fábrica autogerida Rimaflow e indefectivelmente o Centro Social Leoncavallo).

E é com todos eles que o Papa dialogará no segundo dia – na presença inclusive de Evo Morales, não em suas atribuições de presidente da Bolívia, mas como líder popular que foi por toda vida. Esta é uma das características essenciais do pontificado de Papa Francisco, aliada à centralidade que com ele, de maneira inédita, assume a problemática da exclusão – como sublinhou monsenhor Marcelo Sánchrez Sorondo, chanceler da Pontifícia Academia de Ciências Socais, lembrando das palavras do Evangelii Gaudium: “Até que não se resolvam radicalmente os problemas dos pobres, renunciando à autonomia absoluta dos mercados e da especulação financeira e agredindo as causas estruturais da desigualdade, não se resolverão os problemas do mundo e definitivamente nenhum problema. A desigualdade é a raiz dos males sociais”.

“Nós fizemos um grande esforço – explicou Grabois – para garantir a presença dos dirigentes das organizações representantes dos setores mais miseráveis, mais atingidos e mais perseguidos, setores que querem agora falar por si próprios”.

“Sustentados, muitos de nós, pela fé em Cristo, que se fez pobre entre os pobres, e fortes pelo magistério social de Sua Santidade e da Sua preocupação para com as vítimas da indiferença e do egoísmo de um sistema social e econômico elitista, estamos reunidos hoje, no Vaticano, para receber do senhor, Santo Padre, palavras que nos iluminem e nos apoiem em nosso difícil caminho para a construção de uma sociedade mais justa e solidária, onde ninguém seja considerado um descarte, mas visto com o olhar de Deus, que abraça todos os seus filhos, especialmente aqueles a quem o Senhor chama de ‘meus irmãos e irmãs menores”, disse o cardeal Peter Turkson, presidente do Pontifício Conselho de Justiça e Paz.

O Encontro Mundial é considerado uma Assembleia dos movimentos populares, como aquelas realizadas durante o Fórum Social Mundial, mas no inusitado e surpreendente ambiente Vaticano, tendo como fim a identificação das causas estruturais da exclusão e os modos para combatê-las, traçando novos caminhos de inclusão social. E com um objetivo específico: aquela de criar uma espécie de coordenação das organizações populares, com o sustento e colaboração da Igreja.

Seguindo o método próprio da teologia latinoamericana do ver-julgar-agir (longamente combatido dentro do Vaticano), o encontro é organizado para se debruçar, no primeiro dia, sobre a realidade de exclusão por meio dos testemunhos dos participantes; para discernir, no segundo dia, as questões de marginalização social à luz dos ensinamentos do Papa Francisco; para identificar, por fim, no terceiro dia, os compromissos concretos a serem assumidos. A reflexão se desenvolverá ao redor de três grandes temáticas: Pão (trabalhadores da economia informal, jovens precarizados e a nova problemática do mundo do trabalho; Terra (camponeses, problemática ambiental e soberania alimentar, agricultura); Casa (ocupações, habitações precárias e problemática das periferias urbanas). Além de algumas sessões paralelas sobre Ambiente e Mudanças Climáticas e Movimentos pela Paz.

E será a ocasião para ponderar sobre o pensamento social do Papa Francisco; para elaborar uma visão comum sobre as causas da crescente desigualdade social e sobre o aumento da exclusão em todo o mundo; para refletir sobre as experiências organizativas dos movimentos populares; para propor soluções alternativas aos problemas da guerra, da fome, do desemprego, da exclusão geradas pelo capitalismo financeiro e pelas transnacionais; para discutir, enfim, a relação dos movimentos populares com a Igreja, visando a criação de uma instância de colaboração permanente.

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