Acostumada a ser a única mulher em reuniões com 15 executivos, a superintendente de Fiscalização Econômica e Financeira da Aneel, Ticiana Freitas de Souza, deu entrevista ao site Canal Energia confirmando que o perfil executivo do setor elétrico brasileiro continua de terno e gravata.
As mulheres já são presença expressiva nas graduações de Engenharia oferecidas no Brasil e maioria em muitos cursos de especialização. Elas têm real capacidade de adaptação e dedicação na construção da carreira, boas organizadoras e, por tudo isso, podem ser excelentes diretoras de áreas técnicas.
Mesmo assim, segundo a reportagem do site especializado, são raridades nos cargos de chefia no setor elétrico. Mas, afinal, o que afasta as mulheres dos cargos de chefia?
Há indícios de conservadorismo por trás da masculinização na direção de empresas de energia. A presidente da Associação Brasileira de Energia Nuclear, Olga Simbalista, engenheira elétricista formada pela UFMG, conta que o reflexo dessa mentalidade é que até dez anos atrás a sala de controle da usina de Angra 1 não dispunha de toalete feminino.
Na opinião da engenheira, as restrições à ascensão feminina existem, mas podem ser veladas. Mesmo que a mulher concorra a uma promoção em igualdade de condições, ela quase sempre será desclassificada na escolha final.
Na Cemig existem engenheiras, economistas, advogadas, administradoras e analistas de sistema. Muitas são especialistas no setor elétrico, mas são excluídas da promoção por barreiras invisíveis, que mantém o machismo corporativo. Prova disso é que hoje há apenas uma mulher na direção da empresa.
A engenheira elétrica Maria Helena Barbosa é uma das poucas eletricitárias que chegaram à uma gerência na estatal. Apesar da importante conquista pessoal, ela avalia que a contribuição das mulheres para a mudança dessa cultura está longe de se concretizar na Cemig. Estudos indicam que as mulheres têm o pensamento multidimensional e, por isso, podem ser mais produtivas que os homens. “Mas o reconhecimento desse potencial só está no discurso da empresa e nos treinamentos”, lamenta a engenheira.
“Na prática o que se vê é a reprodução de um modelo de gestão antigo e desumano, que não é bom para ninguém, pois limita o espaço das mulheres, por mais talentosas que sejam, e tira dos homens o direito de desmontarem qualquer sentimento como empatia”. Para os milhares de subordinados Maria Helena afirma que fica um ambiente de trabalho péssimo, sob a perspectiva de qualquer gênero.
Na comemoração do Dia Internacional das Mulheres em 2015, o ex-presidente da Cemig, Mauro Borges, prometeu mudanças na gestão da empresa e anunciou a criação do Comitê Mulheres da Cemig, que, junto com a Diretoria de Gestão Empresarial, definiria as metas para estimular a presença das trabalhadoras na alta direção da empresa. O discurso parecia um reconhecimento tardio da competência das eletricitárias, mas também não deu em nada.
A Cemig tentou criar o comitê por decreto, com nomes indicados por gerentes e superintendentes. Obviamente faltou representatividade ao comitê e o debate sobre a discriminação de gêneros foi adiado mais uma vez. O perfil masculino das chefias perdura na empresa, enquanto problemas ligados à cultura machista, como o assédio moral e sexual se perpetuam.
Essa desproporção entre o que as eletricitárias representam na construção da Cemig e o espaço reduzido que ocupam nas decisões e na gestão mostram que a empresa precisa mudar de perspectiva e entrar no século 21. Essa luta também é de classe e não pode mais esperar.