‘Mudar para manter igual’: o que esperar do novo presidente da Petrobras



‘Mudar para manter igual’: o que esperar do novo presidente da Petrobras

O economista e consultor Adriano Pires foi escolhido pelo governo federal para assumir a presidência da Petrobras a partir de abril. Ele deve assumir o comando da estatal após assembleia geral da companhia, marcada para o próximo dia 13, ocupando o posto que hoje pertence ao general da reserva Joaquim Silva e Luna.

Militar de carreira, o general chegou à presidência da Petrobras em abril do ano passado com o objetivo de criar um canal de comunicação direta entre a direção da estatal e o núcleo do governo de Jair Bolsonaro (PL), bastante ligado às Forças Armadas.

Pires, por sua vez, é mais próximo do setor privado e dos acionistas da Petrobras, segundo fontes ouvidas pela Brasil de Fato. Por conta disso, em sua gestão, espera-se que ele faça uma intermediação entre interesses do mercado e as pretensões políticas e eleitorais de Bolsonaro.

Política de preços

Hoje, a maior divergência entre acionistas e governo está no custo da gasolina. Após o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff, em 2016, a Petrobras adotou uma política de preços baseada no mercado internacional. Isso elevou o preço dos combustíveis internamente, aumentou a insatisfação da população, mas também levou o lucro da companhia a um recorde histórico.

Pires não deve agir para reduzir esse ganho de investidores da Petrobras, boa parte deles estrangeiros. Contudo, deve atuar para que o presidente Bolsonaro seja minimamente atendido, já que se ele for derrotado nas urnas é grande a chance de que a política de preços da Petrobras seja definitivamente alterada.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), líder em todas as pesquisas de intenções de voto para as eleições presidenciais deste ano, já disse que pretende “abrasileirar” os preços da Petrobras, reduzindo assim a influência externa no custo dos combustíveis.

“Pires chega para mudar e não alterar nada”, afirmou Rodrigo Leão, coordenador técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep). “Ele vai tentar acomodar os interesses do governo para, na verdade, manter a atual política de preços da Petrobras, a qual é boa os acionistas”, explicou.

Pires já disse em entrevistas antes de ser indicado à presidência da estatal que intervenção governamental no preço dos combustíveis é algo ruim. Que poderia, inclusive, gerar desabastecimento no país, visto que reduziria o interesse de empresas em vender gasolina no Brasil já que poderiam vender o mesmo produto por preços maiores no exterior.

Contudo, Pires já disse também que seria favorável à criação de espécie de fundo de estabilização de preços para que o custo da gasolina no Brasil ficasse tão exposto a crises internacionais, como a criada pela guerra entre Rússia e Ucrânia.

PL propõe fundo para estabilizar preços

Um projeto de lei que cria um fundo desse tipo foi apresentado pelo senador Rogério Carvalho (PT-SE) no ano passado. Ele foi aprovado no Senado ainda em março e está tramitando na Câmara. O mesmo projeto, entretanto, também propõe mudar a política de preços da Petrobras. Pires não deve apoiá-lo.

“Em termos de política de preços a sinalização é de continuidade. O Adriano Pires é um defensor inconteste do PPI [política de paridade da importação] da Petrobras”, ratificou Eric Gil Dantas, economista do Observatório Social da Petrobras (OSP).

Dantas disse que vê a indicação de Pires como uma manobra política de Bolsonaro. Para o economista, o presidente demitiu o general Silva e Luna usando como pretexto o preço da gasolina, mas vai o substituir por alguém que não mudará isso.

“Me parece que o objetivo do Bolsonaro é confundir sua base política”, afirmou. “Bolsonaro, na verdade, fortalece o seu compromisso com o PPI, mas, para o seu público, parece que está fazendo algo contra os aumentos.”

Mais privatização

Dantas confirmou que Pires tem um perfil pró-mercado. Lembrou que ele é sócio-fundador e consultor do Centro Brasileiro da Infraestrutura (CBIE), que presta consultoria para empresas e defende o aumento da participação delas na economia nacional.

Pires, inclusive, já defendeu publicamente a privatização da Petrobras. Por isso, segundo Dantas, indicá-lo à presidência da estatal é um retrocesso. “Voltamos a ter alguém que senta na cadeira da presidência que é contra o sócio-majoritário, o Estado brasileiro”, disse o especialista.

Deyvid Bacelar, coordenador geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), também não crê que a indicação de Adriano Pires para a presidência da Petrobras resolva a crise do preço dos combustíveis no Brasil.

Bacelar confirmou a relação de Pires com o setor privado. Disse, inclusive, que a chegada dele à empresa deve “acelerar a privatização da estatal”. “Já estou esperando declarações como ‘os preços estão altos por causa dos altos salários da estatal’ ou ‘privatizar e usar o dinheiro como subsídio é a melhor saída para baixar os preços dos combustíveis’, afirmou.

Quem é Adriano Pires

Adriano Pires já ocupou cargos em órgão de governo durante a gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Na época, ele trabalhou na Agência Nacional do Petróleo (ANP), chegando a ocupar o cargo de superintendente-geral de Abastecimento.

É formado em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde também foi professor e consultor, e fez doutorado em Economia Industrial na Universidade de Paris XIII.

Pires é bastante conhecido no setor de óleo e gás. Escreve sobre esse mercado para o jornal O Estado de S.Paulo e o site Poder360.

Fonte: Brasil de Fato (PR), por Vinicius Konchinski

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