A mortalidade por acidentes de trabalho no Brasil, embora estável, é alta e atinge mais alguns grupos populacionais: homens, negros, índios e pessoas com baixa escolaridade, além de ter maior incidência nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. As conclusões constam de artigo publicado na Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, da Fundacentro, órgão governamental de pesquisa em saúde e segurança do trabalho. Os autores apontam limitações do estudo (inclui apenas os segurados da Previdência Social), mas afirmam que os números possivelmente são maiores que os oficiais.
“Os resultados deste estudo são bastante impactantes e se referem a trabalhadores formais e informais, mas na prática é possível que reflitam mais a realidade dos trabalhadores formais. É possível que os acidentes de trabalho relacionados aos trabalhadores informais ainda sejam subnotificados, revelando uma realidade ainda mais dramática no Brasil”, afirmam. O trabalho é assinado pelos pesquisadores Lizandra da Silva Menegon, Fabrício Augusto Menegon e Emil Kupek, todos do Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Maior risco entre homens
Pelos dados, a maioria das mortes por acidentes ocorre entre homens em idade considerada produtiva (de 20 a 59 anos) e com baixo nível de escolaridade (sem instrução e ensino fundamental incompleto). No recorte por gênero, a mortalidade entre os homens “é consideravelmente superior” em todas as regiões. Varia de 2,95 a 7,77 a cada 100 mil trabalhadores, enquanto entre as mulheres vai de 0,35 a 1,17.
Os autores consideraram um período de 10 anos (de 2006 a 2015) e usaram dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM, do Ministério da Saúde) e do IBGE. Eles concluíram que as taxas médias anuais de mortalidade por acidentes mantiveram-se relativamente estáveis (com variação de até 5%), mas alguns grupos e regiões mostraram tendência de crescimento, como mulheres acima dos 60 anos no Centro-Oeste e pardos (classificação do IBGE) em todas as regiões.
Em 10 anos, 33.480 mortes
Em 2015, por exemplo, a mortalidade no Nordeste foi 88% maior entre os pardos (2,45/100 mil) do que entre os brancos. No país, a mortalidade de trabalhadores com menos de oito anos de estudo foi 15 vezes superior à daqueles com 12 anos de estudo ou mais, mostra o estudo. “Vários estudos têm demonstrado que um menor nível de instrução tem relação com a ocupação de postos de trabalho mais precarizados, maior exposição a riscos e condições de segurança menos favoráveis, dentre outros elementos que prejudicam a saúde e o bem-estar”, afirmam.
Assim, de 2006 a 2015, morreram oficialmente 33.480 pessoas por acidente de trabalho. Um quarto (25%) tinha de 30 a 39 anos, 23% de 20 a 29 anos e 22%, de 40 a 49 aos. E 95% dos óbitos foram de homens. Pouco mais da metade (52%) atingiu brancos, 39% pardos e 6%, pretos. Esses são números absolutos, não os de letalidade. Eram 44% sem instrução formal ou ensino fundamental incompleto e 23% com fundamental completo ou médio incompleto.
Quarto no ranking mundial
Os pesquisadores lembram ainda que o Brasil só fica atrás de China, Estados Unidos e Rússia – as principais potências do planeta – no ranking dos acidentes fatais. Em 2017, foram 572.169 acidentes no país. Desse total, 12.651 resultaram em incapacidade permanente do trabalhador e 2.096 levaram à morte.
Segundo estimativas da Organização Internacional do Trabalho (OIT) citadas na pesquisa, a cada ano acontecem 160 milhões de acidentes no mundo. E 2,34 milhões de pessoas morrem, principalmente por doenças relacionadas à atividade. Além disso, “em todos os países onde a mortalidade por acidentes de trabalho é conhecida, as taxas são superiores entre os homens em relação às mulheres”, o que em parte se deve ao fato de eles estarem mais presentes em setores com maior risco, como construção civil e transportes.
Precariedade de dados
Países com maior igualdade de gênero têm taxas bem menores de mortalidade. Na Noruega, são 3,2 óbitos a cada 100 mil trabalhadores entre os homens e 1 entre as mulheres. Na Suécia, 2,1 e 0,3, respectivamente. No Brasil, essas taxas são de 11,9 (homens) e 1,2 (mulheres). Na Argentina, 11,4 e 0,6.
“A precariedade de informações públicas e de dados oficiais sobre acidentes de trabalho no Brasil dificulta a análise e a interpretação dos fatores que influenciam ou que potencializam o risco de o trabalhador sofrer um agravo, constituindo um grave problema de saúde pública”, advertem os pesquisadores. “A escassez e inconsistência das informações sobre a real situação de saúde dos trabalhadores comprometem a definição das prioridades para as políticas públicas, o planejamento e a implementação das ações de Saúde do Trabalhador.”
Fonte: Brasil de Fato