Uma série de protestos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ocorre em todo o país desde o dia 10 de abril até dia 17, quando se completam 23 anos do massacre de Eldorado dos Carajás, em que 21 trabalhadores rurais foram assassinados pela força pública.
A cada ano, a Jornada Nacional de Lutas pela Reforma Agrária é realizada como forma de rememorar o crime e exigir políticas públicas para o campo brasileiro. Márcio Santos, da coordenação nacional do MST, destaca que esse ano o contexto é outro.
“Pela primeira vez após o período de redemocratização, a gente faz uma jornada de lutas em um ambiente de crise democrática, de ameaça à democracia, de pressão, a partir de um estado truculento, em cima dos movimentos sociais, no sentido de tentar destituir o direito legítimo de manifestação”.
Na segunda-feira (15), o presidente da República Jair Bolsonaro fez uma publicação no Twitter, na qual comemorou o fato de o MST ter realizado “só uma ocupação de terra” durante os três primeiros meses de governo. Para Santos, Bolsonaro comemora antes da hora, já que o MST “está preparado para a luta”.
“Nós não ficamos desafiando o governo. É o governo que nos desafia. Nós não precisamos ficar desafiando o governo, provando se somos corajosos ou não. Mas uma coisa pode ter certeza: com o MST não tem covardia. A gente faz a luta a partir dos elementos apresentados pela conjuntura. E vamos fazer muita luta nesses quatro anos de governo Bolsonaro”.
Segundo Santos, embora o Massacre de Eldorado dos Carajás tenha sido emblemático em relação à violência contra os trabalhadores do campo, a situação nunca deixou de ser um dos principais problemas enfrentados pelos trabalhadores rurais no Brasil.
“Possivelmente o 17 de abril vai ficar, ao longo da história, como uma data referência, quando o Estado sujou sua mão de sangue para defender os interesses de uma elite extremamente atrasada do campo brasileiro. Mas, para além do 17 de abril, o campo brasileiro tem uma característica muito forte de violência, que vem desde o período da escravidão, das oligarquias agrárias que dão as cartas no interior do Brasil.
Além de denunciar a paralisação das políticas de reforma agrária do governo Bolsonaro, Santos alerta para as consequências dos constantes ataques do presidente da República ao movimento social camponês.
“Ao taxar o MST como ilegítimo, ele [Jair Bolsonaro] abre brechas, abre precedentes para que grupos organizados e milícias rurais ataquem acampamentos, assentamentos, comunidades quilombolas, indígenas, promovendo uma violência sistemática no campo brasileiro”.
Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 2017, foram 70 assassinatos no campo brasileiro, o número mais alto desde 2003. O estado com o maior número de vítimas foi o Pará, onde ocorreu o massacre de Eldorado dos Carajás.
Juventude se reúne no local do massacre
Desde o dia 10 de abril, cerca de 300 jovens sem-terra se reúnem na “curva do S”, local exato onde ocorreu o massacre de Eldorado dos Carajás, em 1996, para um acampamento pedagógico da juventude.
Aline Silva, porta-voz do movimento, explica que o acampamento surgiu quando se completou dez anos do massacre, como forma de organizar a juventude camponesa e homenagear os lutadores caídos. A atividade está em sua 14ª edição e acontece até dia 17.
“Esse acampamento surgiu no ano de 2006, em memória dos nossos mortos, trabalhadores que foram massacrados no dia 17 de abril de 1996, e aqui também é uma forma de resistência, para dizer que não nos calaremos diante da atual conjuntura, frente a toda forma de violência no campo contra os nossos trabalhadores e trabalhadoras rurais”.
Leandro Diniz, militante do MST no estado do Maranhão, participa do encontro e afirma que, ao contrário do que propaga o governo de Jair Bolsonaro, a juventude sem-terra segue com disposição para enfrentar os ataques contra o povo trabalhador.
“Esse é um momento de ir para cima, de denunciar o descaso desse governo, as declarações que ele [Jair Bolsonaro] tem dado em relação aos sem-terra, dizer que não vamos deixar barato, muito pelo contrário, nós reafirmamos a disposição de continuar ocupando os latifúndios e essa juventude precisa estar organizada para dar continuidade à luta pela terra”.
Nos debates, diversas pautas próprias da juventude, como o trabalho e renda; o acesso a políticas públicas para os territórios de reforma agrária, permitindo assim que os jovens permaneçam no campo; a denúncia do genocídio da juventude negra e a violência LBGTfóbica; além da defesa da soberania nacional e da educação no campo que, segundo Diniz, é duramente atacada pelo atual governo.
“Com essa declaração do Bolsonaro sobre as escolas do MST, em alguns municípios, eles [as autoridades] têm se sentido encorajados, se sentiram provocados a fechar escolas no campo. Então, o que a gente vê nesse momento na sociedade é um desmonte contra a educação nos assentamentos, nas áreas rurais”.
Fonte: Brasil de Fato