O risco de privatização das usinas de Miranda, São Simão, Jaguara e Volta Grande reuniu, na segunda-feira, 19, durante audiência pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, forças de campos políticos diferentes em defesa das hidrelétricas.
Deputados de vários partidos, entidades sindicais, lideranças do Sindieletro e a presidência da Cemig defenderam, na mesma mesa de debate, a importância das quatro hidrelétricas continuarem sendo operados pela estatal. Ao final foram definidas várias ações da Comissão de Minas e Energia em defesa das usinas que compõem um dos maiores patrimônios do povo mineiro.
O deputado estadual, Rogério Correia (PT), autor do requerimento da audiência, apresentou um histórico dos acontecimentos que podem levar as usinas a leilão, destacando a opção equivocada do ex-governador Antônio Anastasia (PSDB) de abrir mão de mais 30 anos de concessão das hidrelétricas. “As repercussões negativas dessa decisão são muitas, como a perda do patrimônio que vem sendo operado pela Cemig e a geração de grande impacto sobre a tarifa de energia", destacou.
O coordenador geral do Sindieletro, Jefferson Silva, destacou que os trabalhadores da Cemig que estão na empresa desde a década de 1990 estão acompanhando, nesse período da história a terceira tentativa de privatização da empresa. A primeira com o Acordo de Acionistas com a AES em 1997. Graças às mobilizações dos eletricitários nos anos 2000, a Constituição do Estado proíbe a privatização de empresas públicas sem os votos de três quintos dos deputados e sem referendo popular (PEC50).
Em 2014 houve a tentativa de aprovar a PEC 68 na Assembleia Legislativa, que era também uma estratégia de privatização, e nesse momento, há nova investida do governo Federal sobre a venda de ativos (São Simão, Jagura, Miranda e Volta Grande) do Estado.
Sobre a Portaria 133, de 2017, do Ministério de Minas e Energia, que determina a realização de leilões até 30 de setembro deste ano, Jefferson afirmou que é um equivoco transferir o poder controlador da estatal para sócio privado. Também é irresponsabilidade tirar do Estado a capacidade de investimento e de desenvolvimento tanto do setor elétrico quanto de outros setores. “O que estamos dizendo para a sociedade e para os municípios é que essas usinas representam cerca de 50% da capacidade de geração de energia da Cemig. Com o leilão, as hidrelétricas irão para a iniciativa privada, provocando prejuízos na perspectiva do controle das águas, de estratégia do setor elétrico na perspectiva da receita da Cemig”, alertou.
Privatizar para custear o déficit fiscal
O economista da Subseção do Dieese do Sindieletro, Carlos Machado, questionou o uso de recursos do setor elétrico para resolver a crise financeira no governo federal, com risco de onerar tarifas de energia por décadas e de desnacionalizar o setor elétrico. “É necessário retomar o diálogo para garantir a modicidade da tarifa e - atendendo aspirações da população - evitar a privatização ainda que parcial da Cemig”, ressaltou.
O presidente da Cemig, Bernardo Salomão, reforçou a denúncia de que o governo Temer está usando a Cemig para “resolver o problema do déficit público do país”. Ele destacou que os chineses estão vencendo o leilão das usinas que já foram relicitadas e, portanto, passarão a gerir empreendimentos estratégicos para o setor elétrico e o país. Em função dos financiamentos e facilidades criadas pelo governo Temer para o setor privado participar dos leilões, tudo indica que o consumidor cativo pagará a conta dessas transações que favoreceram o capital estrangeiro, através da tarifa.
Mais pressão em defesa do patrimônio dos mineiros
Durante a Audiência Pública na ALMG, o ex-diretor do Sindieletro e eletricista da São Simão, Fábio Carvalho, deu importante testemunho da situação das usinas. “Em 33 anos de empresa, nunca vi o dinheiro privado ser usado para melhorar a Cemig. Pelo contrário, o capital é que sempre se beneficiou da empresa”, disse. “Há anos vemos a falta de manutenção em nossas hidrelétricas e agora vemos o governo Temer pegar um pedaço da Cemig para pagar dívida”, acrescentou.
Fábio Carvalho afirmou que é preciso, de forma apartidária, admitir que a política continua a mesma na gestão da Cemig e que é preciso definir o papel das usinas, que não pode ser apenas de “financiar o capital”.
O deputado federal Adelmo Leão (PT) alertou para os prejuízos que a onda da privatização vem impondo ao país. “Com essa política, patrimônios importantes e estratégicos para o Brasil estão sendo abertos. Não podemos ter soberania sem o controle da água e da energia, e, além disso, a população não ganhará absolutamente nada com essa privatização do nosso parque energético”, alertou.
A audiência terminou com a aprovação de requerimentos da ALMG à Presidência da República, à Aneel e à Câmara dos Deputados contra a realização de leilões das usinas e pela prorrogação das concessões. Também foi aprovado requerimento à Advocacia Geral do Estado para que sejam tomadas medidas jurídicas visando barrar o leilão das usinas da Cemig e visita dos deputados e entidades ao ministro da Minas e Energia, Fernando Bezerra Coelho Filho, e também ao ministro do Supremo Tribunal Federal, José Antônio Dias Toffoli, relator da ação que pede renovação das concessões.
Representantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) reforçaram a importância das hidrelétricas - com seu potencial de água e energia - para a soberania nacional. O MAB também alertou para a necessidade dos debates em defesa das usinas saírem da esfera política e jurídica para envolverem a população, verdadeira dona das hidrelétricas.
Por sugestão da direção do Sindieletro, foi aprovado, na Audiência, um requerimento para a realização de audiência pública sobre o tema no Triângulo Mineiro, região que abriga as usinas ameaçadas de irem a leilão.