Ao invés do diálogo, um forte aparato policial está sendo usado pela empreiteira Eletro Santa Clara para lidar com trabalhadores em greve concentrados na portaria da empresa, em Curvelo. Desde a última sexta-feira, 12, todos os eletricitários da empreiteira que atuam na região estão em greve por tempo indeterminado reivindicando direitos básicos.
A Câmara Municipal de Curvelo aprovou moção em solidariedade aos trabalhadores que estão sendo pressionados para mudar de empresa abrindo mão de acerto trabalhista. Vereadores também aprovaram a elaboração de ofício cobrando da Cemig uma solução para a situação. Ainda hoje será realizada audiência na Justiça do Trabalho, em Curvelo, para debater o assunto.
Trabalhadores do quadro próprio, principalmente de Betim e Sete Lagoas, estão sendo pressionados para cumprir as ordens de serviços que seriam realizadas pela empreiteira. Há informação que trabalahdores de outras empreiteiras, como Engelminas, Celt e CSM- quarteirizada que atua na região - estão em campo para suprir a falta que os trabalhadores da Santa Clara têm feito. Em Curvelo, trabalhadores do quadro próprio e o Sindieletro manifestam solidariedade ao movimento e participaram da paralisação.
Luta que ilumina a vida
Com o movimento dos trabalhadores da Santa Clara, o mote "Luta que ilumina vida", da campanha salarial dos eletricitários este ano, é levada a cabo pelos trabalhadores da empreiteira repleta de irregularidades e que era contratada pela Cemig para atuar em Curvelo, Diamantina, Felixlândia, Corinto, Pirapora e Buenópolis, na Regional Triângulo.O movimento conquistou, esta semana, o apoio dos eletricitários do quadro próprio que aderiram à paralisação.
Após ser alvo de inúmeras denúncias e processos por não pagamento de direitos trabalhistas e descumprimento de normas de saúde e segurança, a Eletro Santa Clara perdeu seus contratos com a Cemig. Mas uma manobra “política” permitiu que a empreiteira continuasse a operar na região de Curvelo e os problemas na relação de trabalho foram se juntando, acobertados pela gerência da Cemig. Agora a Santa Clara tenta forçar os seus trabalhadores a assinarem contrato no escuro com uma nova empregadora, a Jadel Construções Elétricas. E o pior: os eletricitários contam que estão sendo pressionados para abrir mão dos direitos trabalhistas devidos pela Santa Clara, como os 40% de multa sobre o Fundo de Garantia.
O coordenador geral do Sindieletro, Jairo Nogueira Filho, cobra da direção da Cemig providências imediatas para reverter as irregularidades que confiscam direitos básicos dos trabalhadores da Santa Clara.
Entenda o caso
Há alguns dias a empresa pediu que os trabalhadores levassem a carteira de trabalho para que seja feita a mudança no nome da nova empregadora - Jadel Construções Elétricas - que ironicamente faz parte do consórcio formado por várias outras empresas, inclusive a própria Santa Clara. “Falam que se quisermos continuar trabalhando vai ter que ser sem acerto porque a Santa Clara está quebrada e sem condições de pagar as multas rescisórias, uma situação absurda”, protesta um trabalhador.
O risco de mudança sem aviso prévio e sem acerto trabalhista apavora os trabalhadores que procuraram o Sindieletro esta semana. “Isso é briga de patrão e não pode sobrar pra gente. Fazem tudo por debaixo dos panos para nos prejudicar”, protesta o trabalhador. Uma pergunta não quer calar: Se a Cemig estava ciente da situação, por que não reteve as faturas para garantir os direitos dos trabalhadores?
O Sindieletro apurou que Rafael Silvério Xavier, sócio diretor da Eletro Santa Clara, juntamente com alguns gestores da Cemig em Curvelo, estão pressionando os trabalhadores para que aceitem as mudanças. Duas “reuniões” em tom ameaçador já aconteceram e outra está agendada para esta semana.
Foi apurado ainda que a Cemig está fazendo a Avaliação Técnica de Empreiteira (ATE) para a mudança no contrato, de forma superficial e tendenciosa, sem uma análise criteriosa dos documentos trabalhistas e fiscais, a fim de camuflar as irregularidades relativas às condições técnicas, de saúde, segurança e qualidade dos serviços.
Para o coordenador do Sindieletro na Regional Norte, Everaldo Rodrigues, a Cemig está fazendo uma nova manobra para continuar a proteger a Eletro Santa Clara, mesmo que para isso prejudique pais de família e jogue toda a sua reputação na lama.
Trabalho precário
Pelas denúncias, a Santa Clara apresenta graves problemas trabalhistas e nas
questões de saúde e segurança, tais como trabalhadores sem equipamentos de
proteção e com férias vencidas. Um eletricista conta que as luvas utilizadas pelas equipes estão furadas “machucando a mão da gente” e as botinas têm buracos que deixam os dedos à mostra. “Já fui picado por bicho no mato por causa do pé pra fora da botina”, conta.
O plano de saúde foi cortado e o auxilio alimentação não dá para almoçar e
jantar. “A gente sempre tira do nosso bolso para completar”, relata um eletricista. Outro trabalhador diz que a empresa passou uma folha obrigando- -os a declarar que não necessitam de vale transporte. “Mas para chegar à empresa, que
fica no final da cidade, batemos muito pedal”.
Há informação que a empreiteira chegou ao absurdo de pedir aos trabalhadores para pagar o concerto dos veículos com dinheiro do próprio bolso. “Eles dão desculpa de que vão pagar a gente depois, mas nunca acertam”, diz um trabalhador de Curvelo. Já não existem mais empresas dispostas a fornecer produtos e serviços para a Santa Clara, nem mesmo combustível e alimentação para os trabalhadores.OS RÉUS
A Cemig foi procurada pela equipe de jornalismo do Sindeletro por telefone do RH, celular e e-mail para responder as graves denúncias de trabalho precário e de violação de direito trabalhista na Santa Clara, mas não retornou. Para o Sindieletro a Cemig dever ser responsabilizada por expor trabalhadores que realizam serviços emergenciais, de extensão e manutenção de redes em Curvelo e região a condições indignas e ainda sob ameaças de terem seus direitos trabalhistas básicos sonegados.
No banco dos réus
A Cemig e a Eletro Santa Clara estão respondendo na justiça por várias irregularidades. A Procuradoria do Trabalho de Patos de Minas entrou com uma ação civil pública na Vara do Trabalho de Patrocínio contra as duas empresas por negligenciar a saúde e segurança, as péssimas condições de trabalho e pelo acidente com o eletricista Lúcio Nery de Souza, no dia 11 de abril de 2013, que resultou na amputação dos dois antebraços do trabalhador.
A ação relata em documentos o resultado da fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego, que levantou vários atos ilícitos da Eletro Santa Clara contra seus trabalhadores, desde o descumprimento de leis trabalhistas, até o desrespeito às normas de saúde e segurança.
O procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT) de Patos de Minas, Juliano Alexandre Ferreira, apontou no processo que a Cemig e a Eletro Santa Clara são responsáveis pelas irregularidades e por colocar a saúde e segurança dos trabalhadores em risco.
Ele pediu que as empresas sejam condenadas a pagar R$ 1 milhão por dano moral coletivo. Juliano Ferreira também pediu que a Justiça determine o pagamento de multa de R$ 100 mil por cada infração.