Governo Bolsonaro quer vender Ceasa por 10% do valor real da empresa



Governo Bolsonaro quer vender Ceasa por 10% do valor real da empresa

O governo federal pretende vender as CeasaMinas - Centrais de Abastecimento de Minas Gerais – por somente 10% do valor real da empresa. A denúncia, realizada pelo Sindicato dos Trabalhadores Ativos, Aposentados e Pensionistas do Serviço Público Federal no Estado de Minas Gerais (Sindsep), é que toda a estrutura das seis centrais de abastecimento, considerando valores dos pontos comerciais, dos terrenos e instalações físicas, correspondem a, pelo menos R$ 2 bilhões.

Na quarta (2) pela manhã, aconteceu uma manifestação contra a privatização em frente à unidade da CeasaMinas em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.

Em abril deste ano, o Ministério da Economia, liderado por Paulo Guedes, anunciou que o lance mínimo para participar do leilão de privatização da CeasaMinas é R$ 161,6 milhões pelos ativos imobiliários e R$ 91,6 milhões de outorga pela operação da estatal, totalizando R$ 253,2 milhões. A valoração foi feita pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o leilão já está programado para novembro deste ano.

Para Sânia Barcelos Reis, diretora do Sindsep, esse valor imposto pelo governo federal é ínfimo e não paga nem os pavilhões da empresa, localizados nos municípios de Contagem, Barbacena, Uberlândia, Caratinga, Governador Valadares e Juiz de Fora. A estimativa do Sindisep é que, somente a unidade de Contagem tenha um valor aproximado de R$ 550 milhões.

Impactos para trabalhadores, produtores e consumidores

Além do preço, a preocupação é que a venda da CeasaMinas pode trazer inúmeros impactos para trabalhadores, produtores e consumidores, que podem passar a pagar mais caro pelos alimentos hortifrutigranjeiros e industrializados.“A questão não é só a gente, que é concursado, tem também os empregos indiretos e o produto final, que vai chegar na mesa do consumidor. A gente sabe como é a desigualdade do nosso país. Já está horrível e vai piorar”, aponta Sânia.

A sindicalista explica que a Ceasa abarca em todo o estado cerca de 230 profissionais concursados, 4 mil produtores rurais reunidos no Mercado Livre dos Produtores (MLP) – dos quais cerca de 50% são agricultores familiares – e 900 lojistas. "Numa possível privatização, provavelmente, vão vender [os espaços da Ceasa] por valores mais altos. Isso vai acabar inviabilizando para os produtores de trazerem suas mercadorias. E onde eles vão escoar essa mercadoria?”, questiona.

Segundo informações do Sindicado dos Carregadores dos Mercados Livres de Produtores e de Hortifrutigranjeiros do Estado de Minas Gerais (Sindicar) são milhares de carregadores autônomos. Somente em Contagem, são 800 cadastrados, número que pode ser ainda maior considerando carregadores contratados pelos lojistas que não se cadastraram no sindicato.  

Em audiência pública, realizada na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na segunda (31), Maria Aparecida de Carvalho, presidenta da Associação Recreativa e Beneficente dos Empregados da CeasaMinas, criticou a falta de transparência e de diálogo do governo federal. “Nós, funcionários, não fomos ouvidos nem informados sobre nada, não sabemos o que acontecerá conosco, se seremos remanejados, se seremos demitidos”, afirma.

História da privatização

A CeasaMinas e a Companhia de Armazéns e Silos do Estado de Minas Gerais (Casemg) foram incluídas no Programa Nacional de Desestatização (PND) por meio do Decreto 3.654, de 7 de novembro de 2000, assinado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. Desde então, a privatização ronda a empresa, mas foi retomada com força em 2016, em meio às tensões do golpe contra Dilma Rousseff.

No mesmo ano, foi proposto à Câmara de Deputados o Projeto de Decreto Legislativo 489/2016, de autoria do deputado federal Padre João (PT), que susta o Decreto 3.654 e retira as empresas do PND. A medida ainda está em tramitação na Casa, já tem parecer favorável da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio e aguarda votação de parecer na Comissão de Constituição e Justiça.

Somente a unidade de Contagem tenha valor aproximado de R$ 550 milhões

À época, Padre João declarou à Agência Câmara de Notícias que a privatização da CeasaMinas e da Casemg traria prejuízos para toda a população, já que o abastecimento ficaria concentrado nas mãos de poucos empreendedores com objetivo de lucro. “Os gestores, entidades públicas, entendem o mercado de alimentos como um instrumento para a satisfação do direito humano à alimentação. Por outro lado, o objetivo primordial de qualquer gestão privada é o lucro”, criticou.

Em novembro de 2020, centenas de organizações políticas assinaram o manifesto “As estatais são nossas”, se posicionando contra o regime privatista do governo de Jair Bolsonaro e também do governo de Romeu Zema (Novo). O documento cita a CeasaMinas, junto com Petrobrás, Eletrobrás, Correios, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e empresas mineiras, como a Cemig e a Copasa.

“Privatizar não é a solução. Os mineiros sabem quanto custa perder recursos naturais e financeiros para os interesses privados. Nosso estado nasce do saque de nossos minérios, mas a luta por direitos e pela proteção das nossas serras e matas também acompanha toda a nossa história. Não é preciso ir muito longe para ver o que a privatização faz com nossos trabalhadores, nossas cidades e nossos vales: os crimes da Vale afogaram em lama tóxica famílias, ruas, casas, a bacia do Rio Doce e do rio Paraopeba. Não podemos deixar que se repita a história de tragédias, crimes e depredação”, diz o texto.

Ceasa é estratégica

Com mais de 50 anos de atuação, a CeasaMinas é responsável atualmente por abastecer 12,7 milhões de pessoas em 870 cidades do estado. Anualmente, são contabilizados 2,4 milhões de toneladas de hortigranjeiros, cereais e produtos industrializados. Em 2020, segundo informações do Sindsep, as seis unidades movimentaram R$ 5,1 bilhões em negócios.

A empresa é de economia mista e a União é detentora de 99,67% das ações. Em 2020, a CeasaMinas registrou um lucro de R$ 5,4 milhões de acordo com o balanço financeiro publicado na página da estatal. Em 2019, o lucro foi de R$ 6,1 milhões. Cerca de 25% dos lucros são repassados ao governo federal na forma de dividendos.

A comercialização na CeasaMinas é realizada por produtores rurais e por empresas privadas concessionárias, que pagam por mês tarifas de uso previstas em contratos temporários. Ao todo, são 760 empresas.

Fonte Brasil de Fato, por Larissa Costa

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