Fim da Ford: Para economistas e sindicalistas, falta ao país uma política industrial



Fim da Ford: Para economistas e sindicalistas, falta ao país uma política industrial

A afirmação de Jair Bolsonaro (ex-PSL) de que a Ford Brasil não falou a verdade sobre a saída da empresa e que o motivo é que a montadora norte-americana queria mais subsídios para continuar produzindo veículos no país, provocou reações junto ao movimento sindical e entre economistas progressistas.

Para especialistas, Bolsonaro também não está falando a verdade. Segundo eles, incentivos fiscais da União são importantes sim, mas falta uma política para a indústria nacional. A pandemia da Covid-19 também não pode ser culpada porque a Ford fechou a planta de São Bernardo do Campo em 2019, antes da crise sanitária, apontam.

O país já investiu cerca de R$ 20 bilhões em incentivos fiscais de 1999 a 2020, de acordo com estimativas da Receita Federal. Porém, ressalta o presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT (CNM/CUT), Paulo Cayres, o Paulão, a negociação entre empresa e governo assegurava um acordo até 2025 e isso foi rompido porque falta mercado.

“Não é verdade que a Ford esteja saindo do país somente devido à falta de incentivos fiscais, é preciso ter mercado. É preciso ter uma política nacional industrial forte e ter uma economia mais confiante, e esses não são os casos no país de Bolsonaro. Ele e Guedes [ministro da Economia] vivem falando que o país está quebrado e, além de não ser verdade, ainda desestimulam investimentos. O governo é responsável pela saída da Ford do país, mas a empresa também foi bem canalha ao acabar com esses empregos no meio da pandemia”, diz Paulão.

Para o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Taubaté (Sindmetau), Claudio Batista da Silva Júnior, o Claudião, a classe trabalhadora está abandonada pelo governo de Bolsonaro.

“É muito canalhice mesmo Bolsonaro e Guedes abandonarem a gente neste momento. Guedes ontem [12/01] já deu até os pêsames para os trabalhadores e trabalhadoras da Ford. Eles estão se lixando para a classe trabalhadora”, finalizou.

Economistas também destacam problema da falta de política

A economista e responsável técnica pela subseção do Dieese na CNM/CUT, Renata Filgueiras, e o coordenador da subseção da entidade no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (SMABC) e professor da Universidade Municipal de São Caetano do Sul e da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Luis Paulo Bresciani, em entrevista ao Brasil de Fato, disseram que a saída da Ford no país reflete a ausência de uma política para o setor. E ainda contam que o país já teve esta experiência.

De 2012 a 2017  (fim do governo Dilma e 1º ano do golpista Michel Temer) existiu um programa de fomento ao segmento automotivo, chamado de Inovar Auto para incentivar montadoras a investir em pesquisa, engenharia e desenvolvimento. Ainda, para fortalecer a produção local, o programa contava com uma garantia de que 80% dos veículos fabricados pelas empresas habilitadas deveriam realizar uma série de etapas da atividade produtiva no Brasil. Após o fim deste programa, foi criado em 2018, ainda com Temer, o programa Rota 2030, que não garantiu, por exemplo, a política de conteúdo local, afetando enormemente as fabricantes de auto peças.

Segundo eles, outro elemento importante a se destacar é a crise do mercado interno do segmento. Em 2013, 84,2% da produção de  veículos eram destinadas ao mercado interno brasileiro. A situação se altera a partir de 2015. O faturamento líquido do setor em 2013 foi de US$ 87,2 bilhões; em 2019, cai para US$ 54 bilhões.

“O compromisso do governo central, em momentos de crise, deve ser o de proteger cidadãos, empresas e sua economia. Não é o que estamos assistindo desde o início do aprofundamento da crise econômica, com a chegada da pandemia. O que observamos é o fechamento de empresas, aumento do desemprego, queda da renda das pessoas, aumento da pobreza e da pobreza extrema, desigualdades e fome, miséria e queda da arrecadação pública”, disseram os economistas do Dieese.

Eles também ressaltam que a Ford está entre as quatro montadoras mais contempladas com acesso aos recursos do BNDES em período recente. Entre 2002 e 2018, a Ford teve acesso a R$ 5,5 bilhões de crédito.

“A decisão de encerrar suas atividades no Brasil passa, portanto, por decisões estratégicas na matriz, mas também pela crise econômica no Brasil, afetando especialmente a capacidade de expansão do mercado interno, fundamental para alavancar vendas em setores como o automobilístico, em sua fase recente”, ressaltam Renata e Paulo.

Movimento sindical pode contribuir

O governo central deveria certamente entrar em cena para dialogar com a montadora alternativas para sua permanência no país, como garantir contrapartidas de investimentos, manutenção de empregos e, fundamentalmente, dialogar com o movimento sindical essas alternativas, segundo os economistas do Dieese.

Paulão concordou e disse que se o governo não tiver um plano nacional para a indústria, podem chamar o movimento sindical para contribuir para combater o descaso do governo.

Fonte: CUT

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