Fentect: "Judiciário foi porta-voz dos Correios"



Fentect:

Trabalhadores nos Correios deverão realizar assembleias durante o dia desta terça-feira (22), para decidir se acatam a decisão da Justiça do Trabalho e encerram ou não a greve. O movimento completou 35 dias.

Em nota, a Fentect (Federação nacional da categoria) criticou a postura da empresa e a sentença do Tribunal Superior do Trabalho (TST).  “Novamente, para a Federação, o Judiciário voltou a agir como porta-voz dos Correios, compactuando com a retirada de direitos históricos da categoria”, afirma a Fentect.

“Essa decisão, muito embora traga um reajuste, diga-se inferior ao justo a partir de perdas salariais com a inflação, não contempla a categoria. Porque mantém ataques a direitos duramente conquistados por anos”, acrescenta a entidade.

Ataque e retrocesso

“Essa decisão representa mais um ataque aos direitos da classe trabalhadora. E um retrocesso a nossa categoria”, criticou o secretário-geral da federação, José Rivaldo da Silva. “É mais uma mostra de como o Judiciário se mantém servil ao patronato. Atua de forma político partidária, e se mantendo distante do propósito de justiça e dignidade à classe trabalhadora.”

Os representantes dos funcionários lembram que a relatora do dissídio coletivo no TST, Kátia Arruda, se disse surpresa pela postura da empresa de mandar retirar quase todas as cláusulas do acordo coletivo, além de negar-se à negociação. Mas ela teria sido derrotada “pela rede de apoiadores” do governo dentro do Judiciário. A posição majoritária pela redução de direitos no julgamento foi comandada pelo ex-presidente do TST, Ives Gandra Filho, defensor da “reforma” trabalhista de 2017.

Judiciário tolera intransigência dos Correios

Trabalhadores fizeram manifestação em Brasília, com caravanas de várias regiões, para acompanhar o julgamento, ontem, segunda-feira. Segundo a Fentect, durante todo o processo de negociação, a empresa “mostrou total intransigência em dialogar com a categoria. E se manteve firme no ataque e na retirada das cláusulas previstas no último acordo coletivo, que teria vigência até 2021, caso a ECT não tivesse ignorado decisão do TST e buscado no STF meio de intervenção contra a classe trabalhadora“.

A Fentect informou ainda que sua direção vai se reunir nesta terça, “para avaliação do cenário”. E orientou pela manutenção das assembleias à tarde e à noite. “Como inicialmente previsto, para que os trabalhadores possam analisar a proposta e decidir de forma coletiva e democrática sobre o resultado do julgamento”.

Já os Correios afirmam que desde julho tentaram negociar os termos do acordo coletivo, “em um esforço para fortalecer as finanças da empresa e preservar sua sustentabilidade”. “Ficou claro que é imprescindível que acordos dessa natureza reflitam o contexto em que são produzidos e se ajustem à legislação vigente”, disse ainda a empresa, em nota.

Entenda: TST julga greve não abusiva e fixa reajuste, mas elimina 50 de 79 cláusulas do ACT

Em votação dividida e marcada por críticas à postura da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), o Tribunal Superior do Trabalho (TST) considerou não abusiva a greve dos funcionários. Os ministros determinaram retorno ao serviço a partir desta terça e fixaram reajuste de 2,60%, pouco abaixo da inflação (o INPC somou 2,69% em 12 meses, até julho). E, por 4 votos a 3, mantiveram apenas cláusulas consideradas “sociais”. Com isso, o acordo coletivo perde 50 de suas 79 cláusulas. Os trabalhadores ainda farão assembleias para avaliar o resultado e decidir.

A relatora do processo, ministra Kátia Arruda, havia preservado quase todo o conteúdo do acordo. Mas o ex-presidente do TST, Ives Gandra Filho, abriu voto divergente e conseguiu maioria. Ele propôs a manutenção de somente 20 cláusulas, além das nove que a ECT decidira preservar.

Sobre os dias parados, metade deverá ser compensada e metade descontada dos salários. A empresa já descontou parte desse período. Proposta de parcelar o “débito”, para pesar menos aos empregados, foi rejeitada.

Fim de conquistas históricas

O corte significativo de cláusulas mereceu ressalva do presidente em exercício do tribunal, Luiz Philippe Vieira de Mello Filho – a titular, Maria Cristina Peduzzi, contraiu covid-19. “Praticamente estamos excluindo o poder normativo (da Justiça do Trabalho), acabando com conquistas históricas”, afirmou. Para ele, isso provocará “muito mais conflito que solução”. Igual preocupação teve o ministro Maurício Godinho Delgado: “Esse critério reduz demais o poder normativo”.

Durante o julgamento – que chegou a ser interrompido por mais de uma hora por problemas de transmissão, devido à forte chuva em Brasília –, a relatora fez várias críticas à direção dos Correios. Segundo ela, a empresa “se recusou peremptoriamente” a negociar, mantendo conduta que ela chamou de “negativista”.

“Não houve negociação”

“Houve alguma negociação coletiva? A meu ver, não houve”, afirmou a ministra do TST sobre as condições que levaram à greve dos Correios. “A greve foi em muito provocada pela postura intransigente da ECT. Os trabalhadores foram, a meu ver, provocados pela empresa ao estado de greve. Acho que a categoria foi instigada ao conflito.” O presidente em exercício reforçou: “Foram praticamente empurrados para a greve”.

O subprocurador-geral do Trabalho, Luiz Flores, comentou que a empresa tornou impossível o acordo. No início da sessão, ele observou que a ECT, “acredito que por uma uma espécie de tentativa de limpeza dos direitos trabalhistas, por uma iniciativa de privatização ofereceu apenas o previsto na CLT. Ora, nós sabemos que em Direito coletivo do Trabalho a CLT tem que ser cumprida de qualquer forma. Então, (a empresa) não oferece nada”, completou.

Críticas também ao STF

As críticas foram dirigidas também ao Supremo Tribunal Federal, que atendeu ao apelo dos Correios e alterou a sentença do próprio TST no dissídio do ano passado. Com isso, a duração do acordo coletivo passou de dois anos para um, e a ECT pôde retirar 70 das 79 cláusulas, que perderam a validade em 1º de agosto (data-base). “O Supremo, em termos, usurpou o poder normativo da Justiça do Trabalho”, disse Flores. “Houve toda uma antecipação do conflito, que só aconteceria em julho de 2021”, afirmou a ministra Kátia. “É a primeira vez que julgamos uma matéria em que a empresa retira praticamente todas as cláusulas preexistentes”, lembrou a relatora.

O advogado da Fentect, Alexandre Simões Lindoso, falou em “verdadeira erosão em grande escala” de direitos. “A disposição de negociar esbarrou na resistência da empresa, que fez letra morta do artigo 616 da CLT”, afirmou. O item citado determina que as partes não podem se recusar à negociação.

Dificuldade financeira?

Ele também contestou a alegação patronal de dificuldade financeira. “No balanço de 2019, os Correios já sinalizaram que não existe nenhum risco de descontinuidade da empresa”, afirmou. Além disso, os primeiros sete meses deste ano tiveram resultado positivo de R$ 614 milhões. Para Hudson Marcelo da Silva, advogado de sindicatos ligados à Findect (federação interestadual). a ECT busca “apagar a história” da categoria. “Nunca vi uma empresa apresentar uma proposta com essas características, sequer propondo manter cláusulas sociais que não têm qualquer impacto financeiro.”

Já a advogada Mariana Scandiuzzi, que representou os Correios, disse ao TST que a ECT vem tendo prejuízo de milhões devido à greve. “Já está suficientemente demonstrada nos autos a incapacidade financeira da empresa de manter os benefícios”, afirmou. Segundo ela, o resultado positivo deste ano “decorre da postergação de pagamentos”, que terão de ser realizados no segundo semestre.

Fonte: Rede Brasil Atual

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