Os entregadores de aplicativos organizam uma greve nacional para o próximo dia 1º de julho. Eles reivindicam que as empresas arquem com os custos dos equipamentos de proteção individual (EPIs), além de licença remunerada para os trabalhadores que foram contaminados durante a pandemia. Também querem aumento no valor mínimo por entrega e no pagamento das corridas.
Além disso, os entregadores querem o fim dos bloqueios indevidos e do sistema de pontuação, que excluem trabalhadores que foram penalizados, indevidamente, em muitos casos. A pauta inclui, ainda, seguro contra roubo, acidente e de vida.
Segundo Paulo Roberto da Silva Lima, o Galo, líder do movimento dos Entregares Antifascistas, a ideia é iniciar uma luta paulatina por direitos trabalhistas para a categoria. O objetivo final é que os entregadores sejam reconhecidos como empregados das empresas. E não como “parceiros” ou “empreendedores individuais”, como são tratados atualmente.
“A gente vai atrás dos direitos um por um. Vale-alimentação, plano de saúde. Depois um salário garantido. Férias, 13º. Vocês vão ter que registrar nossa carteira”, afirmou Galo em entrevista a Marilu Cabañas, para o Jornal Brasil Atual, nesta terça-feira (7).
Além da paralisação, os entregadores criaram um abaixo-assinado, que já conta mais de 350 mil apoiamentos. Eles pretendem anexar as assinaturas junto a um projeto de lei que prevê a regulamentação dos direitos da categoria.
Os entregadores também pedem o apoio dos consumidores na luta por direitos. Eles sugerem um boicote às empresas como Ifood, Rappi, Loggi e Uber Eats. Além do “breque dos apps” no dia 1º de julho, eles pedem para as pessoas fazerem críticas nas lojas virtuais de aplicativos, para expor a exploração desses trabalhadores.
Os Entregadores Antifascistas não lideram a paralisação. Segundo Galo, eles estão na retaguarda do movimento, “para ajudar a impulsionar”. Ele conta que resolveu lutar por melhores condições de trabalho quando foi bloqueado pelo sistema de entregas da Uber, em março deste ano, já depois do início da pandemia.
“Meu pneu da moto furou. A empresa disse para cancelar o produto, e que não me bloquearia. Mesmo assim, me bloquearam. Decidi fazer a denúncia na Globo, mas não fui ouvido. Disseram que se fosse comida para entregar, tudo bem. Denúncia não rolava.”
Foi, então, que ele fez um vídeo que foi divulgado em veículos da imprensa independente, e viralizou. “Era o vídeo que falava da tortura que era passar fome carregando comida nas costas. Isso mexeu com as pessoas. Aproveitei o vácuo da viralização para criar o abaixo-assinado.”
Depois do vídeo e do abaixo-assinado, Galo resolveu ir para as ruas. “Vou tentar organizar a minha classe e a gente vai para a luta.” Foi quando se deparou com a ideologia do empreendedorismo em meio aos motoboys. “Se não está bom o aplicativo, vai pra Cuba então”, ouviu de um colega. Foi acusado de retratar os companheiros de profissão como “passa-fome”.
“Na hora, tive essa noção. Os caras estão se sentido empreendedores mesmo. Se um playboy branco do olho azul me manda para Cuba, não fico chateado. Agora, o meu companheiro, que está sofrendo igual a mim? Rasga o coração. Fui atrás dos entregadores de bicicleta. Esse pessoal não me mandou para Cuba”.
Vivendo em situação ainda mais precária que os motoboys, os entregadores de bicicleta, nutrindo sentimento de “revolta coletiva” pelas péssimas condições de trabalho, agravadas pelos riscos da pandemia, decidiram organizar a greve. “Antigamente, só se usava paralisação. O pessoal se recusava a utilizar o nome greve. Quando escutei o nome greve, pensei é isso! Greve! Greve! Vamos para cima da greve! Não foi a gente que puxou, surgiu de uma revolta coletiva”, conta Galo.
Galo afirma que o movimento dos entregadores não quer a participação de partidos ou sindicatos. “Querem simplesmente parar. Sem liderança.” Além de cruzarem os braços, eles devem se manifestar nas ruas, para demonstrar a insatisfação. Para os “mal-intencionados”, que podem dizer que os trabalhadores não deveriam fazer aglomeração durante a pandemia, ele manda o recado: “A gente está na rua trabalhando para vocês ficarem de quarentena. Entregando a comida de vocês, o remédio, o mercado. Então, por que a gente não pode fazer isso pela gente?”
Nascido na periferia da zona sul de São Paulo, Galo conta que conheceu o racismo e a violência policial ainda criança. Também pequeno, descobriu o hip hop. Do rap, chegou na literatura, que ajudou a formar a sua consciência política. De um amigo da música, recebeu o livro Negras Raízes (Ed. Círculo do Livro), do escritor norte-americano Alex Haley. “Li e escrevi outro rap, que ficou muito melhor que o primeiro. Esse negócio de ler funciona mesmo. Foi assim. Lendo livro e escrevendo rap. Adquiri a minha consciência política nesse momento.”
Agora, pela sua mobilização entre os entregadores, muitos perguntam se Galo quer ser como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Não, eu quero ser o Paulo Freire“, responde. Ele acredita que é possível fazer política com a população, em vez de ir para Brasília. Mas diz ter “todo respeito” por Lula. “O que ele representa para um pobre favelado operário, é muita coisa. Eu entendo porque essas pessoas odeiam o Lula. Os motivos que eles tem para odiar o Lula, eu tenho para amar. É simples.”
Segundo o líder dos entregadores antifascistas, a antipolítica é a forma das elites tentarem controlar a política. “Está cheio de empresários querendo ser políticos. A população cai nessa e diz que político não presta. Não é assim, não. Ele afirma que rico não gosta do operário que sabe falar.” Apesar de serem movimentos autônomos, ele conta que a greve da categoria e o movimento dos entregadores antifascistas vêm recebendo apoio “do pessoal do Psol, do PT, do PSTU”.
Rede Brasil Atual