Enquanto Jair Bolsonaro finge ser presidente e faz um teatro tosco e recheado de mentiras no cercadinho do Alvorada, onde diariamente destila ódio, intolerância e brinca de ditador, colocando em debate temas que fariam o Brasil voltar ao século passado, seus aliados no Congresso Nacional passam a boiada e aprovam Medidas Provisórias (MP) e Projetos de Leis que dilaceram direitos sociais e trabalhistas.
A cortina de fumaça – dos tanques blindados da Marinha e dos desvarios públicos do presidente, que ataca os presidentes dos outros Poderes e ameaça a realização das eleições de 2022 porque sabe que vai perder - desviam a atenção dos brasileiros, enquanto o Congresso aprovada propostas que promovem um massacre nos direitos dos trabalhadores.
A PEC do Voto Impresso foi derrubada, derrota de Bolsonaro, mas projetos contra os trabalhadores que ele manda para o Congresso são aprovados às pressas, na calada da noite, sem debate com a sociedade civil organizada. Exemplo disso foi o que aconteceu nessa semana com a reforma Trabalhista (MP nº 1.045), que destrói o salário mínimo e estimula contratos sem Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e 13º salário.
A MP 1.045 prevê, de forma transversal, que um trabalhador receba menos que um salário mínimo, o que hoje é inconstitucional.
“Os novos trabalhadores serão uma espécie de nadistas. Não terão direito a nada”, critica Sandro Cézar, presidente da CUT-Rio, ao alertar sobre a gravidade do momento e do avanço feroz sobre os direitos da classe trabalhadora.
Segundo Sandro, sem aumento real no salário mínimo há anos e com uma MP que permite que se remunere com menos de um salário mínimo, a concentração de renda vai aumentar e, com isso, a fome e a miséria que já subiram muito deste o golpe de 2016.
“No momento em que o Brasil produz mais miseráveis é o momento em que o Brasil produz mais milionários. Há uma concentração de renda brutal na mão de meia dúzia de pessoas, enquanto a maioria do povo engrossa a fila do osso”, afirma se referindo as pessoas que ficaram na porta de um açougue em Cuiabá para pegar osso para matar a fome.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no primeiro semestre de 2021 o Brasil alcançou um toal de 14,8 milhões de desempregados, sem falar nos subutilizados – pessoas que poderiam trabalhar mais horas e não conseguiram - e desalentados, aqueles que procuram emprego até cansar e desistiram por não conseguir. E o que o ministro da Economia, Paulo Guedes, faz com essa informação? Cria políticas públicas? Chama empresários e movimentos organizados para o debate? Não, ele descredencia mais uma instituição federal secular, desqualifica seus profissionais e diz que o “IBGE está na idade da pedra” e por isso erra ao divulgar os dados. Mas a fila do osso é real. E quem tem fome, tem pressa.
Para a professora da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) e cientista política, Clarisse Gurgel, é preciso atentar que essas movimentações de Bolsonaro são autorizadas pelos setores que sustentam o governo até hoje, mesmo diante de todas as aberrações possíveis.
O capital especulativo internacional, prossegue a professora, se aproveita cada vez mais do país que aprofunda sua condição de dependência, por exemplo.
“O agronegócio segura a posição do patamar máximo que o Brasil pode chegar, a gente pode dizer que o Bolsonaro obedece às orientações, atua com liberdade através da própria autorização desses setores, por mais que eles possam parecer mais lúcidos, mais centrados, eles tiram proveito dessa dramaturgia histriônica do presidente”, explica a cientista política.
A cena dessa semana foi patética e chocou o mundo. Mais uma vez, a estratégia ditatorial de Bolsonaro era intimidar congressistas, agora apontando os canhões dos tanques que soltavam uma fumaça escura para o parlamento e, assim, tentar forçá-los a votar a favor do voto impresso, o que não deu certo porque o desfile foi um fiasco.
“A votação do voto impresso e toda dramaturgia do presidente diante do Congresso são pautas que acabam por empobrecer cada vez mais o povo brasileiro”, afirma Clarisse.
Com o dia a dia tão árduo para a maioria dos trabalhadores e trabalhadoras, muitos nem se dão conta de que a “boiada está passando”. O país está há um ano e cinco meses mergulhado numa pandemia. As mortes pela doença já ultrapassam 566 mil e o ministério da Saúde ainda dificulta o acesso às vacinas. As manchetes da quinta-feira (12) não nos deixam mentir “governo federal tem 11,2 milhões de doses de vacina contra a Covid represadas” enquanto os municípios clamam pelo imunizante. “Estudantes estão sem acesso ao ensino remoto por falta de repasse financeiro”. Bolsonaro tenta de todas as formas impedir que R$3,5 bilhões, aprovados pelo Congresso brasileiro, cheguem até as escolas públicas. Verba que melhoria o acesso à internet de alunos e professores e contribuiria para que o Enem fosse mais justo, diminuindo, assim, as desigualdades com os alunos de escolas particulares que tiveram acesso a aulas virtuais.
A cientista política defende que o desenvolvimento do Brasil caminha para trás cada vez que o presidente traz à tona pautas que sugerem um retorno ao passado. Motivo que faz com que os setores mais progressistas tenham que se mobilizar por agendas que são básicas em países democráticos.
O momento é emblemático e Sandro Cezar acredita que agora é o desafio é construir movimentos, ir para as ruas junto com os sindicatos, a CUT e as demais centrais para garantir a manutenção dos direitos já conquistados. “A classe trabalhadora precisa se mobilizar. E isso é urgente”, afirma.
A professora Clarisse concorda e vai além: “Os movimentos sociais e os sindicatos são muito importantes, assim como os partidos políticos da esquerda. Essa importância não se dá apenas nas ruas. Eles também devem seguir na direção de uma formação política, da propaganda política, das denúncias políticas, que podem penetrar nas casas, nos locais de moradias, nos locais de trabalho da classe trabalhadora”, defende.
Fonte CUT