O economista Roberto Castello Branco, que presidiu a Petrobras de janeiro de 2019 a abril de 2021 por escolha do presidente Jair Bolsonaro (PL), foi indicado para compor o conselho de administração da petroleira que mais se beneficiou da política de venda de partes da própria estatal.
A 3R Petroleum, com sede no Rio de Janeiro, comprou nove campos de petróleo da Petrobras desde 2018. Foi de longe a maior compradora, adquirindo mais de um terço dos 26 bens negociados pela estatal em ações de desinvestimento – a segunda empresa que mais comprou ativos da estatal adquiriu três.
Dados apresentados pela própria 3R, com base em informações públicas fornecidas pela Petrobras, indicam um gasto superior a US$ 2 bilhões nas compras (quase R$ 10 bilhões na cotação atual). Em conferência com investidores, o presidente executivo da 3R, Ricardo Savini, afirmou que o custo foi baixo, levando em conta a reserva de petróleo existente em cada poço.
“Temos orgulho de ser um parceiro ‘preferencial’ da Petrobras”, disse Savini ao apresentar, em fevereiro, os resultados financeiros obtidos pela 3R em 2021. “Compramos ativos de forma muito eficiente. Pagamos cerca de 2,9 dólares por barril de petróleo em reservas certificadas [dos poços adquiridos]”. Hoje, um barril de petróleo é negociado a cerca de US$ 100 no mercado internacional. Em março, chegou a ser negociado a US$ 120.
Todas as vendas e os valores dos negócios entre a 3R e a Petrobras foram aprovados pela diretoria executiva e pelo seu conselho de administração. Castello Branco, enquanto presidia a estatal, fez parte desse conselho. Isso quer dizer que, durante sua gestão, ele avalizou algumas dessas operações até duas vezes (uma pela diretoria, outra pelo conselho).
Cerca de um ano após deixar a estatal ele agora deve passar a trabalhar para o “outro lado do balcão”. Indicado para o conselho de administração da 3R, ele deve ter seu nome avaliado em assembleia geral de acionistas da companhia no próximo dia 29.
Cargo milionário
Considerando informações referentes a 2021 enviadas pela 3R Petroleum à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) – órgão que fiscaliza empresas com ações negociadas em bolsa –, Castello Branco deve receber cerca de R$ 2,8 milhões por ano para ser conselheiro da petroleira.
No ano passado, foi essa a remuneração média dos cinco conselheiros da empresa. Eles dividiram R$ 2,5 milhões em salários – cerca de R$ 500 mil por ano ou R$ 41,5 mil por mês para cada – e quase R$ 12 milhões em pagamentos em ações – ou seja R$ 2,4 milhões por ano ou R$ 200 mil por mês.
Como conselheiro, Castello Branco não precisará dar expediente na 3R. Poderá acumular suas funções na empresa com os cargos de vice-presidente do conselho de administração da Omega Energia e de membro de conselhos e comitês da Vale, onde foi diretor de 2003 a 2014.
Para o presidente da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar, a indicação de Castello Branco ao conselho da 3R revela um caso claro de conflito de interesses e favorecimento por parte do ex-executivo da Petrobras à petroleira privada. Bacelar informou que a FUP denunciará o caso ao Ministério Público (MP). Para ele, “há indícios fortes de beneficiamento, utilização do espaço em que Castello Branco estava anteriormente, e, principalmente, de informações privilegiadas”.
“A 3R comprou uma série de polos de campos maduros de petróleo da Petrobras a preço de banana. Então é no mínimo estranho termos agora o ex-presidente da Petrobras, que participou dessas negociações representando a estatal, assumindo o conselho de administração da 3R Petroleum”, declarou, no twitter.
Uma das negociações da 3R com a Petrobras foi a compra do campo de Macau, no Rio grande do Norte, em agosto 2019 – durante a gestão Castello Branco. O negócio envolveu US$ 191 milhões, cerca de R$ 900 milhões.
No último trimestre de 2021, a 3R ganhou explorando somente esse campo mais de R$ 104 milhões – isso já descontados todos os custos da exploração. Levando esse dado em consideração, pode-se estimar que em pouco mais de dois anos de trabalho a 3R terá recuperado todo o valor pago à Petrobras e passará lucrar com o campo de Macau.
A Lei nº 12.813, de 2013, que dispõe sobre conflitos de interesse no governo federal, determina que pessoas que ocuparam funções de governo cumpram quarentena de pelo menos seis meses após demissão. No caso de Castello Branco e a 3R, esse prazo já teria sido cumprido com folga.
O Brasil de Fato tentou entrevistar Roberto Castello Branco por meio da 3R, da Omega Energia e da Vale. Não conseguiu contato com o economista.
A 3R Petroleum também foi questionada sobre a indicação do ex-presidente da Petrobras ao seu conselho administrativo e sobre seus negócios com a estatal. Não respondeu.
A Petrobras tampouco encaminhou qualquer posição sobre a indicação de seu ex-presidente a um cargo na empresa compradora de seus bens e sobre as suspeitas acerca do fato levantadas pela FUP.
Fonte: Brasil de Fato (PR), por Vinicius Konchinski