Vários deputados foram ontem, terça-feira (23), ao Senado, para acalmar os ânimos de senadores e manifestantes que acompanhavam a leitura do relatório da proposta de Reforma trabalhista, na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). O ambiente esquentou ao máximo em função dos gritos dos cidadãos que ocupavam a CAE em frases como “Fora Temer”, “Ou param as reformas ou paramos o Brasil”, “Queremos Jucá preso e “Golpistas”, além de discussões entre os próprios parlamentares – o que levou a sessão a ser suspensa.
O relator da Reforma, Ricardo Ferraço (PSDB-ES), foi aconselhado pelo líder do governo no Congresso, Romero Jucá (PMDB-RR), a deixar a sala e aguardar numa sala em anexo à CAE, enquanto tentava apaziguar a confusão, mas oposicionistas dizem que não tem jeito: vão obstruir a votação. Jucá, por sua vez, tentou recorrer aos aliados pela continuidade dos trabalhos.
O ponto forte do embate foi a briga entre os senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Ataídes Oliveira (PSDB-TO), que só não se esmurraram porque foram impedidos por colegas. “Bandido”. “Bandido é você, moleque” – esse foi o "diálogo" observado entre os dois.
Fator Renan
Numa cena que surpreendeu, o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), que já tinha se manifestado há meses contra as reformas, mas vinha abordando a crise política de forma discreta, manifestou-se ao lado dos oposicionistas de forma contundente. Renan afirmou que considera “inadmissível um governo que possui tamanha rejeição fazer uma reforma com características tão unilaterais”. Acrescentou que atual proposta foi feita, a seu ver, “para os empresários e não para os brasileiros”.
Renan também criticou o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Disse que Meirelles passou para o mercado a impressão de que, mesmo com a saída de Temer, as reformas teriam tramitação continuada no Congresso. “Esse ministro deveria ter sido demitido por isso, se fosse eu o presidente. Foi uma declaração que passou do ponto”, ressaltou. Apesar disso, o senador destacou ser contrário ao impeachment de Temer por achar que será “mais um desgaste para o país”. Ele defendeu a busca por “uma solução constitucional” para a crise política.
Lindbergh Farias (PT-RJ), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e Gleisi Hoffmann (PT-PR) argumentaram que, apesar de terem sido vencidos na apreciação de um requerimento que pediu o adiamento da votação do relatório de Ferraço, consideram necessário que a comissão vote todos os outros requerimentos protocolados na mesa, com o mesmo propósito. Isso porque, de acordo com eles, cada um menciona motivos diferentes.
Gleisi lembrou a importância de serem respeitadas regras regimentais e Farias disse que não foi honesto o relator da matéria, depois de ter anunciado na última semana a suspensão dos trabalhos resolver apresentar o relatório sem ter conversado com os líderes. “Não é assim que se trabalha neste Congresso. Exigimos respeito”, reclamou.
Sem trégua
Embora a situação esteja aparentemente mais calma, a discussão continua, porque os dois grupos insistem em suas colocações e não abrem trégua. A base que dá sustentação ao governo tenta garantir a retomada da sessão da CAE para a votação do relatório ainda hoje. A oposição diz que não irá permitir.
“Daqui a pouco vão queimar pneus aqui dentro”, reclamou Jucá para os jornalistas, ao falar sobre a tensão que impera na Casa. “Argumentem da forma que quiserem, dêem as desculpas que quiserem. O que eles desejam, que é validar essa reforma diante de um ambiente de instabilidade desse presidente ilegítimo, não vai acontecer dessa forma. Até ser formalizado o pedido de impeachment do senhor Michel Temer os trabalhos ficarão obstruídos”, provocou Lindbergh Farias.
Relatório é 'dado como lido', e oposição contesta
O relatório da "reforma trabalhista" não foi apresentado formalmente, mas a bancada governista considerou o texto "dado como lido", o que provocou contestação dos oposicionistas. O relator, Ricardo Ferraço (PSDB-ES), não apresentou mudanças, apenas sugeriu alguns vetos, para evitar que o projeto tivesse de retornar à Câmara. Tumultuada, a sessão da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) foi encerrada sem que o texto fosse lido.
A confusão começou depois que a CAE rejeitou requerimento do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) pedindo que o relatório não fosse lido, alegando questões do regimento interno. A votação foi apertada: 13 votos a 11. Em seguida, Ferraço não conseguiu apresentar seu parecer. Alguns parlamentares trocaram empurrões.
"Não quero crer que aquele relatório foi lido. Não existe essa figura no regimento interno da Casa", afirmou, já em sessão no plenário, a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM). "O que o Parlamento não pode fazer é tentar fazer de conta que não tem problema nenhum e que a Casa está trabalhando normalmente."
Os governistas querem manter a tramitação das reformas, apesar da crise que atingiu frontalmente o governo na semana passada, com a divulgação de denúncias vindas de executivos da JBS. A oposição alega que não há clima político para discutir temas dessa complexidade. Também no plenário, Humberto Costa (PT-PE) pediu que o presidente do Senado convoque uma reunião de líderes. "Não creio que o melhor caminho, antes da solução da crise, seja fazer a votação dessas reformas", afirmou, dizendo que o Congresso vive uma situação sui generis.
"Vocês não vão tirar direitos dos trabalhadores na mão grande, não", reagiu Gleisi Hoffmann (PT-PR). "O que temos de fazer aqui é ter espírito público e antecipar as eleições de 2018."
Entre os pontos em que Ferraço sugeriu vetos presidenciais, estão a regulamentação do trabalho intermitente e a possibilidade de acordos individuais fixarem jornada de 12 por 36 horas. Além disso, está o dispositivo que permite a gestantes e lactantes trabalharem em locais insalubres e o item que acabava com descanso de 15 minutos para as mulheres antes de iniciar um período de horas extras.
Fonte: Rede Brasil Atual