Foi dada a largada, na Câmara dos Deputados, para as articulações com vistas à presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Casa. O colegiado causou muitas polêmicas em 2013, depois que passou a ser controlado pelo PSC. A legenda indicou o pastor Marco Feliciano (PSC-SP) para presidi-lo. Convencidos de que se trata de um espaço político importante, os parlamentares do PT marcaram uma reunião para o próximo dia 3 – quando serão iniciados os trabalhos legislativos – para tratar do assunto.
A ideia é discutir quais comissões técnicas da Câmara o partido topa negociar de forma a ter de volta a presidência da CDHM ou, então, garantir ao menos que a presidência fique com algum deputado mais afinado com a causa, numa operação que possa garantir o andamento dos trabalhos suspensos durante a mudança de gestão.
Na prática, a negociação passa pela rediscussão dos acordos fechados em 2013, quando a legenda abriu mão da presidência e da vice da CDHM para ficar com a comissão de Seguridade Social e Família, também tida como estratégicas diante da pauta de votações previstas no Congresso.
Nessa engenharia de remanejamentos, coube ao PT, além de Seguridade Social e Família, as presidências das comissões de Constituição e Justiça (CCJ) e de Relações Exteriores – duas das mais importantes da Casa. Muito provavelmente, este ano a Comissão de Seguridade será trocada pela de Direitos Humanos ou, então, esta ficará nas mãos de uma sigla aliada, com garantia de bom número de petistas entre os integrantes.
O deputado Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho (PT-SP), indicado para assumir em fevereiro a liderança do PT na Câmara, diz não ver como a bancada não retomar a comissão de Direitos Humanos, "porque é consenso, entre os deputados a importância disso para o partido, até mesmo pela sua história".
Vicentinho reconheceu que pode acontecer de a presidência não ficar com um parlamentar da legenda, mas, o mais importante é que o colegiado volte a atuar normalmente e que seja negociado para que no comando esteja um parlamentar com história de comprometimento com a área – casos de Manuela D'ávila (PCdoB-RS), Luiza Erundina (PSB-SP) e Domingos Dutra (Solidariedade-MA).
Sintonia
Conforme conta já feita anteriormente pelo deputado Nilmário Miranda (PT-MG), criador da comissão e um dos que primeiro bateu de frente com o pastor Marco Feliciano, dos 89 deputados do partido, ele já tratou do assunto com pelo menos 50 e todos deixaram clara a necessidade dessa articulação pela retomada da CDHM.
Miranda celebra o interesse de outras siglas ou de parlamentares que se viram impedidos de trabalhar durante a presidência do deputado do PSC. "Feliciano interrompeu 18 anos de trabalho legislativo numa comissão cujo tema é importantíssimo para o país. Vivemos um ano de retrocesso em matérias de Direitos Humanos em 2013, período em que a CDHM funcionou com uma pauta homofóbica, racista, discriminatória e até mesmo contrária ao setor. Mudar isso é uma necessidade", enfatizou o deputado.
Força evangélica
A pedra no sapato dos parlamentares que desde dezembro já trabalham nessa articulação, caso de Nilmário, Érika Kokay (PT-DF), Dutra, Erundina e Jean Willys (PSol- RJ), no entanto, é o trabalho da bancada evangélica, que por outro lado já deixou claro que gostaria de manter um bom número na comissão, fundamental para abordar temas morais, caros aos eleitores religiosos.
Segundo parlamentares ligados aos trabalhos da CDHM, a estratégia dos evangélicos tem sido convencer os partidos aos quais pertencem a indicar o maior número de representantes da bancada religiosa para a comissão. Assim, mesmo perdendo a presidência, eles figurariam com representatividade para polemizar e tentar discutir projetos que são contrários, defendendo uma pauta mais conservadora. Seria uma forma, como deixaram claro algumas fontes, até mesmo de obter maior destaque neste ano eleitoral, levantando a bandeira junto aos eleitores evangélicos de que são atuantes na tramitação de alguns projetos na Casa relacionados à área.
Foi o que aconteceu no ano passado, por exemplo, quando impediram o andamento de proposta que autoriza a união estável entre pessoas do mesmo sexo e quando aprovaram, na comissão, o projeto referente à chamada cura gay – que permitia o tratamento, por psicólogos, de pacientes que quisessem "reverter" a homossexualidade (a matéria passou na CDHM, mas foi arquivada posteriormente pelo plenário).
Pesa nesse trabalho, também, o prestígio do líder do PMDB na Câmara, deputado Eduardo Cunha (RJ), um dos responsáveis pela articulação que, em janeiro do ano passado, culminou com a chegada de Feliciano à comissão. O deputado não tem tocado no assunto e os outros parlamentares evangélicos evitam falar em negociações, mas confirmam o início do esforço por parte da bancada para garantir o maior número de integrantes na comissão.
O deputado federal Anderson Ferreira (PR-PE), um dos integrantes desse grupo, acentuou que, a seu ver, a comissão sofreu discriminação pelo fato de ter tido a presidência nas mãos de um evangélico. Ferreira indica entre os pontos que considerou positivos nos trabalhos em 2013 algumas discussões feitas no espaço sobre povos indígenas, por exemplo. “Antes a comissão tinha uma minoria no comando que era quem ditava as regras. A raiva deles é que no ano passado isso acabou”, frisou.
As declarações sobre o tema mostram que os ânimos podem ficar inflamados de ambas as partes, diante da expectativa e da disputa em torno da comissão. “A CDHM pode voltar a ter relevância para as discussões dos direitos das minorias, mas o fato é que já perdemos um ano. Em 2013, não se conseguiu avançar, na Câmara, em questões importantes para o Brasil. O que salvou foi o trabalho da Frente Parlamentar de Direitos Humanos que os deputados que renunciaram aos cargos formaram e que conseguiu manter algumas das discussões da pauta”, afirma o deputado Jean Willys (Psol-RJ).
“Essa situação toda que foi criada é, de certa forma, um reconhecimento de que a Frente Parlamentar Evangélica é articulada do ponto de vista político, organizada, que age com consequência política e isso é bom para o país”, ressaltou por sua vez o deputado evangélico João Campos (PSDB-GO). Uma mostra de que muito debate ainda promete acontecer até a decisão definitiva sobre qual partido ocupará tal presidência.