As centrais sindicais vão negociar no Congresso as mudanças que reivindicam para as Medidas Provisórias 664 e 665, que alteram critérios de concessão de benefícios trabalhistas e previdenciários. Em nova reunião realizada na terça-feira (3), o governo reiterou que não vai retirar as MPs, o que desloca a discussão para o Parlamento.
Já está prevista uma reunião na semana que vem dos sindicalistas com o novo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). As centrais também querem mudanças na direção da política econômica, avaliando que todos os anúncios feitos até agora pelo governo levam à recessão. E reivindicam uma discussão sobre desenvolvimento. Aparentemente, houve alguma aceitação por parte dos ministros.
O lado considerado positivo da reunião foi justamente a concordância do Executivo em conversar sobre temas da chamada agenda dos trabalhadores, como a informalidade e a rotatividade no mercado de trabalho. O ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Miguel Rossetto, disse que está aberto um debate sobre o desenvolvimento do país e sobre o sistema público de emprego. E afirmou que as centrais serão incluídas na discussão sobre o Plano Plurianual (2016-2019), que deve ser entregue ao Congresso em agosto. Enquanto a discussão tenta avançar, as MPs estão vigorando.
"Não aceitamos que esse tema (MPs) faça parte de ajuste fiscal nenhum. Vamos levar o debate para o Congresso Nacional", afirmou o presidente da CUT, Vagner Freitas. "Se o governo quer fazer ajuste fiscal, que faça do lado de quem ganha muito", disse o dirigente cutista, ao final da reunião de uma hora e quarenta minutos com os ministros Rossetto, Nelson Barbosa (Planejamento), Carlos Gabas (Previdência Social) e Manoel Dias (Trabalho e Emprego), no escritório da Presidência da República em São Paulo.
Segundo Rossetto, a agenda foi "ampliada" com a inclusão de temas propostos pelas centrais. "Saímos com uma agenda muito clara e muito focada. Recebemos as opiniões das centrais e vamos avaliar. É nesse processo que vamos qualificar as opiniões. Nós, mais uma vez, reafirmamos nossa disposição de negociação e diálogo", afirmou o ministro, o único dos quatro a conversar com a imprensa ao fim da reunião.
Ele irritou-se com algumas perguntas sobre a negativa do governo de retirar as MPs, como queriam os sindicalistas, e sobre a vigência das medidas. Disse que em várias reuniões técnicas houve "convergência" em relação aos números e que o Executivo estará em "negociação permanente" com centrais e também com o Congresso. "Já incorporamos uma agenda de desenvolvimento industrial." E repetiu que há necessidade de corrigir "distorções" na concessão de benefícios para garantir "o patrimônio dos trabalhadores", referindo-se à Previdência e ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
Pressão no 'feijão'
Esse foi um aspecto positivo da reunião, na avaliação do presidente da Força Sindical, Miguel Torres. "Por enquanto, foram só medidas negativas. Queremos saber as propostas para crescimento e desenvolvimento", afirmou o dirigente, que havia chegado pessimista ao encontro, iniciado às 17h30. Antes da reunião, Miguel comentou que, sem a retirada das MPs, não haveria negociação de fato. "É imposição, não dá para negociar com a faca no pescoço." Ele observou que as medidas já estão em discussão no Congresso.
O presidente da UGT, Ricardo Patah, antes mesmo do encontro já defendia a inclusão do Legislativo no debate, à medida que o governo não aceitava a retirada das MPs, e ampliando a discussão com a inclusão de outras demandas da agenda trabalhista. Ele demonstrou otimismo ao término da reunião, pouco depois das 19h. "A partir da semana que vem estaremos discutindo no Parlamento, com uma agenda focada nas MPs e ampliada para uma agenda propositiva. Acho que demos um passo importante no sentido de adequar as medidas", comentou.
"Vamos fazer uma discussão que é de curto prazo (sobre as MPs)", disse o presidente da CSB, Antônio Neto, com a expectativa de que "a gente possa incluir a pauta que queremos e que ganhou as eleições de 2014". Desde janeiro, sindicalistas afirmam que o governo adotou a "agenda derrotada" na campanha eleitoral, por criar medidas consideradas recessivas. Neto também fez uma comparação com a crise de 2008 ao comentar o comportamento do governo atual e do anterior, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi à TV e pediu para que as pessoas não parassem de consumir.
Rossetto chegou a ouvir uma pergunta sobre essa referência a uma adoção, pelo governo, do "programa do Aécio (Neves)", candidato do PSDB à Presidência da República. Afirmou apenas que era uma afirmação vinda dos sindicalistas, com a qual ele não tinha nenhuma concordância.
Para o presidente da CTB, Adilson Araújo, só haverá "celeridade e empenho" do governo se houver mobilização, mesmo com a promessa de diálogo. "Governo e patrão é igual a feijão: se não botar pressão, não amolece", afirmou, citando frase atribuída ao escritor Frei Betto. O sindicalista lembrou da marcha que as centrais programaram para o próximo dia 26. Segundo Adilson, a insistência em seguir o chamado "tripé macroeconômico", com propostas voltadas para o mercado financeiro, conduzirá o país à estagnação. Ele defendeu "um pacto em torno da nação, do emprego e do desenvolvimento".
Com base em dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, o presidente da Nova Central, José Calixto, lembrou que as admissões e demissões formais no mercado de trabalho em 2014 superaram, somadas, 40 milhões. Por isso, considerou positiva a aceitação do governo em discutir alternativas que reduzam o ritmo da informalidade.
Para Vagner Freitas, da CUT, em relação a ajuste fiscal, o governo deveria adotar medidas como a taxação de grandes fortunas e relativas à remessa de lucros ao exterior, em vez de propor mudanças que retiram direitos sociais. "Queremos que sejam discutidas questões importantíssimas para nós, que é a pauta dos trabalhadores. Não adianta nenhuma medida paliativa para o seguro-desemprego, se existe uma alta taxa de rotatividade", exemplificou.
Ele também cobrou mais transparência do governo, ao lembrar que na reunião anterior, em 19 de janeiro, enquanto as centrais se reuniam com os mesmos representantes do Executivo, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, anunciava em Brasília medidas sobre tributos. No conjunto, todas até agora mostram medidas restritivas que "levam à recessão e ao desemprego". A discussão, diz o dirigente da CUT, devem ser em torno de propostas que aumentem a oferta de crédito e estimulem a atividade industrial.
O cenário se desloca agora para o Parlamento, com as primeiras discussões políticas e tentativas de convencimento, enquanto não se formam as comissões especiais que analisarão as MPs. Mas já nesta quarta-feira (4), uma delegação de sindicalistas da CUT, ao lado de diversos movimentos sociais, estará no Congresso para apresentar outros pontos da agenda trabalhista, que inclui a rejeição do Projeto de Lei 4.330, sobre terceirização. Na pauta prioritária das centrais há pelo menos mais dois temas: redução da jornada de trabalho e fim do fator previdenciário.