Desprivatizar a gestão das estatais: Por um desenvolvimento nacional



Desprivatizar a gestão das estatais: Por um desenvolvimento nacional

Por João Baptista Santiago e Wesley Cantelmo*


Desde meados dos anos 1990, a partir da verificação do fracasso do neoliberalismo pregado pelo Consenso de Washington, e do caos causado pela desregulamentação da economia estadunidense que capotou o mundo em 2008, que as vertentes liberais têm buscado caminhos de se reestabelecer. 

A reaparição da extrema direita no mundo, e sua ascensão ao poder no Brasil segue ligada a uma versão bem piorada daquela que causou o aumento da pobreza nos anos 1990 e a bancarrota de empresas, bancos e a elevação do desemprego das nações no final dos anos 2000.

As velhas classes controladoras do Estado brasileiro, que se estabeleceram pela política da transação desde o período regencial, na década de 1830, cheia de ódio contra a justiça social e medo de transformações estruturais profundas, vêm a cena política contemporânea imbuída de estética grosseira e discurso vazio, que expressa um único sentido, o ódio pela democracia, como nos lembra Racière em “Ódio à Democaracia”.

A agenda é clara, endurecer o sequestro do Estado brasileiro, leia-se do orçamento público, fazendo o que for necessário, seja atacando o que resta de base produtiva nacional, com fechamento de postos de trabalho, destroçando aposentadorias, desmontando a estrutura do serviço público e imobilizando a iniciativa estatal, destruindo mecanismos de assistência e proteção social.

A estética e a moral reacionária são evidentes: moralismo de goela, religiosidade profana e simbologia fascistóide. Esse conjunto de características, atualmente, se converte na práxis do entreguismo, em favor de sua natureza rentista do capital financeiro internacional: banqueiros, corretores e administradores de fundos de investimento e seus grandes clientes. Movimento típico do capitalismo dependente brasileiro (sim, retomemos a análise crítica da dependência!).

Nos anos 1990 privatizavam e enchiam os bolsos dos compradores com farto crédito barato do Estado, via BNDES, sem contrapartidas claras que resultassem em novos investimentos e com regulação frouxa que, em geral, resultaram em elevação das tarifas dos serviços tornados privados, baixa qualidade de prestação e monopólios. Isso acabou resultando nos apagões de energia da virada do século por todo o Brasil.   

Agora eles fazem caixa, sequestrando as empresas estatais em favor de seus interesses de curto prazo, ao passo que também desdenham de seu papel. Às fatiam e vendem seus ativos mais lucrativos a preços módicos, sem a realização de debates junto a sociedade.

No caso da Petrobrás, por exemplo, estão revertendo todo o esforço de décadas de investimentos, pesquisa e desenvolvimento que culminou em sua verticalização, para a especializarem como mero produtor de petróleo bruto. Papel central nessa estratégia entreguista foi a adoção da política de preços para derivados a partir da Paridade de Preços de Importação (PPI), gerando o preção inflacionária no mercado interno, esvaziando o papel da empresa como indutora de desenvolvimento e garantindo a seus acionistas privados vultosos dividendos de curto prazo, uma vez que.

No último trimestre de 2020, A Petrobras teve um lucro de R$59,9 bilhões, o maior da história. Aos desavisados parece bom, mas é a materialização do assalto ao Brasil, uma vez que esse lucro é resultado do alcance da maturidade na exploração dos campos do pré-sal e da adoção da PPI, que faz com que os preços praticados internamente sejam muito maiores do que poderiam ser, dado os custos de produção. Só em 2021 os preços dos combustíveis aumentaram mais de 40%.

Na administração do estado de Minas Gerais não é diferente. Em 2020 a Cemig lucrou alto e distribui dividendos, apesar de todo o desdém do liberal radical Romeu Zema. Também a Copasa em 2020 distribuiu dividendos extraordinários de mais de R$800 milhões em plena ano de pandemia. Potencial que não tem sido convertido em novos investimentos em infraestrutura para o mineiros.

Toda a energia de figuras como Zema e Bolsonaro está voltada para a reprodução de um conservadorismo contrário aos interesses do povo e ao atendimento de seus parceiros políticos nas sombras do mercado financeiro. No caso das empresas públicas, fica claro que elas estão sequestradas pelos interesses dos grandes acionistas privados espalhados pelo mundo. As empresas públicas deveriam ser geridas com vistas a buscar saídas para a crise e o alcance dos interesses do povo.

Do ponto de vista da retórica política, a ordem na esfera nacional e em Minas Gerais é difamar as estatais, cortar custos de toda ordem, alinhar preços por cima com autorizações das agências reguladoras, atrasar investimentos, deixar comunidades com abastecimento precário e evitar manutenções. Fazer o caos para que possam, ao final, vender essas empresas a preço de banana. Com isso, fazem caixa, aplicam esse caixa no mercado financeiro, alcançam lucros extraordinários e distribuem elevadíssimos resultados.

Estão transformando as estatais em máquinas de produção de ricos às custas dos cidadãos que querem bons serviços a preços justos. Nos países sérios do mundo as estatais são importantes instrumentos para se alcançar os objetivos nacionais e não cumprem esse papel de garantidoras de interesses privados.

A estratégia é a gestão servil aos acionistas dessas empresas, impedindo que as pessoas comuns, seus reais donos e clientes, percebam as possibilidades estratégicas para darmos o salto para fora desse círculo destruidor criado pelo liberalismo rentista atual.

É preciso mudar a política atrasada de servidão imposta às estatais, que são muito mais do que patrimônio do povo brasileiro. Para mudar essa condição é preciso desprivatizar as gestões dessas poderosas empresas.

João Baptista Santiago e Wesley Cantelmo são diretores do Sindicato dos Economistas de Minas Gerais

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