Desinformação é arma do fascismo para golpear a democracia



Desinformação é arma do fascismo para golpear a democracia

Por Sergio Amadeu da Silveira


A desinformação é uma das maiores preocupações de quem discute a formação da opinião pública nas redes digitais.

Sem dúvida, existem aqueles que dizem que a desinformação só engana quem quer ser enganado, ou aqueles que pretendem acreditar em uma mentira que seria providencial para sua crença.

Existem sim pessoas nessa condição. O núcleo duro do bolsonarismo não se importa se o que compartilham nas redes tem ou não fundamento na realidade.

Os conteúdos somente precisam ser funcionais aos seus valores e aos interesses do seu líder.

Mas a desinformação pode convencer pessoas e levá-las a tomar posições que não tomariam se soubessem a verdade.

Apresento alguns exemplos. Muitas pessoas ficaram honestamente em dúvida se iriam ou não vacinar suas crianças, ao receberem mensagens aterrorizantes e desinformativas de médicos negacionistas.

Muitas pessoas tomaram cloroquina, porque acreditaram que ela poderia protegê-las contra o vírus da covid-19.

Um número não computado de pessoas, que acreditaram que a pandemia era uma invenção para prejudicar a economia, contraíram o vírus e morreram.

Quem não se lembra das mensagens nos grupos do Whatsapp de que estavam enterrando caixões vazios, que tudo não passava de uma gripezinha? Não existe poder nem instituição sem um regime de verdade que a sustente. O filósofo Michel Foucault nos propôs observarmos as práticas discursivas e os modos de verificação que temos para considerá-las verdadeiras ou falsas.

Não existe poder sem um conjunto de verdades que o sustente. A luta pelo poder é uma luta em torno da verdade. Obviamente, é muito difícil discutir o que é ou não verdadeiro. Mas, existem fatos que ocorreram e fatos que não ocorreram.

Existem experimentos aceitos pelos cientistas e seus métodos e existem suposições que não passaram por experimentos considerados válidos.

A ciência moderna é repleta de problemas e controvérsias. Herdeira da modernidade e do império da razão, hoje, sabemos de muitos de seus limites.

Entretanto, a crítica aos limites das ciências modernas não são na mesma direção que o negacionismo, nem da substituição da análise baseada em fatos pela mera afirmação de valores.

Nas relações internacionais e nas guerras a desinformação é aceita e reproduzida amplamente. Veja o exemplo da guerra do Golfo e das inúmeras intervenções militares norte-americanas.

Os argumentos utilizados para convencer a opinião pública em favor da guerra, em geral, são falsos, insustentáveis, cínicos.

Quem acredita que os EUA atacaram o Iraque ou a Síria para defender a democracia? Para encontrar armas de destruição em massa?

Existe alguma pessoa minimamente informada que acredite que Julian Assange, líder do Wikileaks, foi preso na Inglaterra por ter praticado sexo sem preservativo na Suécia (sic!)?

O cinismo é absurdo. Ele move a política internacional. A desinformação chega a ser lamentavelmente rasteira. Inexiste coerência. À ideia de regime da verdade, acrescento a dinâmica de construção da hegemonia que o consolida.

Veja o caso da invasão russa da Ucrânia. Os donos da mídia brasileira e grande parte da europeia abandonaram o jornalismo e aderiram à condição de propagandistas dos interesses da Otan na guerra, leia-se, interesses norte-americanos.

A Rede Globo, para convencer a opinião pública de que a invasão do Iraque era correta, fez uma matéria no Jornal Nacional evocando Nostradamus e chamando Saddam Hussein de anticristo.

A luta pela verdade passa pela hegemonia dos valores e opiniões. Os comentaristas da Globo chamaram o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, de humorista herói, que enfrentava o sanguinário Putin.

Transformaram um conflito complexo em um paredão do BBB, em uma narrativa maniqueísta e desinformativa.

Na realidade, estamos vivendo tempos de tensão, que as redes digitais ampliam. Mas é evidente que o fascismo já ronda as ruas das cidades de quase todos os países. A desinformação é a principal arma comunicacional do fascismo, para destruir os parâmetros que as pessoas têm para decidir entre os diversos caminhos existentes.

A democracia está em risco porque o fascismo não se contenta com o direito da maioria escolher os governantes.

O fascismo pode até aceitar participar de processos eleitorais, para tentar golpeá-los na primeira oportunidade.

O fascismo não desapareceu nos primeiros anos do século 20. Ele foi derrotado militarmente na guerra mundial que criou.

Nesses primeiros anos do século 21, o fascismo parece ter retomado seu empenho destrutivo e sua pulsão de morte.

O fascismo hoje se articula pelas redes digitais. Fique ligado. Nada será simples. Não se trata do bem contra o mal. Parece que boa parte das classes dominantes e os endinheirados desistiram da democracia.

Fonte: Artigo originalmente publicado no Portal Vermelho

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