Desde que a reforma trabalhista foi sancionada, há 3 anos, em 13 de julho de 2017 (Lei Nº 13.467) pelo então presidente Michel Temer, e passou a vigorar em 11 de novembro 2017, a precarização do trabalho só aumentou. Em entrevista para o site Conjur, Jorge Luiz Souto Maior, desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 15º Região e professor de Direito do Trabalho na Faculdade de Direito da USP, fez um balanço dos três anos de vigência da lei que historicamente mais transformou o Direito do Trabalho brasileiro.
Para o desembargador, a flexibilização das leis trabalhistas, a redução de custos e a redução de direitos dos trabalhadores, pioraram a economia brasileira, as condições de trabalho e a distribuição e produção da riqueza.
“A reforma trouxe para a ‘formalidade’ modos informais de exploração do trabalho. O que nós temos então são pessoas incluídas formalmente, mas que do ponto de vista social e econômico se encaixam perfeitamente entre os excluídos”, analisa.
Enquanto milhares de trabalhadores foram prejudicados e tiveram sua renda diminuída, as grandes empresas aumentaram seus lucros. Ou seja, para quem a reforma foi feita, o objetivo foi atingido, mas não para toda a sociedade brasileira.
Jorge destaca que quem defendia a reforma dizia que iria ter a ampliação de empregos e a retirada das pessoas da informalidade. No entanto, ao longo desses anos, só aconteceu o contrário. “O desemprego só aumentou, a informalidade só aumentou, tudo que se dizia que se pretendia com a reforma trabalhista não foi atingido, porque também os objetivos, a bem dizer, não eram esses, os objetivos eram aumentar taxas de lucro de grandes empresas e isso se fez, isso se produziu concretamente. Os lucros de grandes empresas e de bancos nesse período são consequência direta da reforma trabalhista, em contrapartida à redução da renda dos trabalhadores, à maior exploração do trabalho, ao óbice ao acesso à Justiça do Trabalho, à fragilização dos sindicatos, ao aumento do desrespeito generalizado à legislação trabalhista”, afirma o desembargador.
Com a pandemia do novo coronavírus, essa situação foi ampliada e acelerada, prejudicando ainda mais os trabalhadores. Segundo Jorge, mesmo quando esse período pandêmico foi superado, o Brasil não voltará à “normalidade” econômica, pois ela já não existia antes mesmo da crise sanitária. “Não havia estado de normalidade nenhum e não haverá essa nova situação, uma situação melhor do que tínhamos, se não houver mudanças concretas no rumo que vínhamos tomando até aqui, do ponto de vista das relações de trabalho.”
As mudanças concretas, de acordo com o desembargador, começariam com a criação de um pacto de solidariedade, com regras efetivas de proteção do trabalho e de distribuição da renda produzida a partir do trabalho. Essas regras estariam em um sistema de seguridade social, baseado em solidariedade, proporcionando condições dignas de sobrevivência a todos os brasileiros.
“Então, do ponto de vista das relações de trabalho, seria necessário concretamente garantir a proteção da relação de emprego, protegida contra dispensa arbitrária, as possibilidades plenas de sindicalização, do exercício pleno do direito de greve, do amplo acesso à Justiça do Trabalho, da atuação firme e consistente do Estado na fiscalização do cumprimento dos direitos trabalhistas, que são direitos humanos, é importante lembrar disso”, destaca Jorge.
De acordo com Jorge, a reforma trabalhista instaurou um processo de exclusão dentro da inclusão, pois ao retirar direitos que impediam a contratação – segundos os apoiadores da reforma – o número de pessoas excluídas socialmente e economicamente aumentou. Ou seja, a terceirização e o trabalho intermitente trouxeram para a “formalidade” modos informais de exploração do trabalho, aumentando a miséria e favorecendo o processo de acumulação da riqueza.
O desembargador também afirma que os trabalhadores estão vivendo em um cenário sem proteção social. “Nós já estamos com trabalhadores de trabalho intermitente, terceirizados, que têm baixíssimos salários, que não têm vinculação sindical, que trabalham doze, catorze horas por dia, sem intervalo para refeição e descanso, sem efetividade mínima de direitos do ponto de vista das condições de trabalho, de salubridade, periculosidade. Porque não há fiscalização. Trabalhadores que depois não conseguem ingressar na Justiça do Trabalho por conta dos obstáculos criados pela reforma, uma Justiça do Trabalho que, como efeito da reforma, também se tornou um tanto quanto conservadora, no sentido de perder muito da sua visão social” pontua.
Sobre a inconstitucionalidade de diversos pontos da reforma, Souto afirma que mesmo que alguns dispositivos sejam declarados dessa forma, a totalidade da lei continuará não servindo de modelo de estado social e de regulação do trabalho no Brasil, e poderá ser pior se forem declarados constitucionais alguns dispositivos claramente inconstitucionais, como por exemplo, a condenação em honorários advocatícios da pessoa que tem justiça gratuita, “o que é uma desconsideração plena do princípio constitucional de acesso pleno à Justiça”.
Finalizando a entrevista, o site Conjur questiona o desembargador sobre pontos da reforma que transformaram a relação dos trabalhadores com os sindicatos das categorias. Jorge pontua que a reforma também teve como objetivo fragilizar o movimento sindical e na pandemia essa situação piorou ainda mais com os ataques à negociação coletiva, visando somente o interesse dos patrões.
“Agora, no meio da pandemia, quando os sindicatos disseram: “Não, não vamos reduzir direitos dos trabalhadores no meio da pandemia”, qual foi a solução? Vamos para a via da negociação individual, sob o argumento de que os sindicatos no Brasil não querem negociar, não têm representatividade. Aí atacaram a negociação coletiva para privilegiar uma redução de salários pela negociação individual. Passaram por cima da negociação coletiva. Então, se você pegar do ponto de vista da linha das normas, olhar só para os dispositivos legais, você vai destacar inúmeras contradições. Mas se você olhar essas contradições do ponto de vista de entender ao que tudo isso se destina, você vê que é completamente coerente e revelador do que se pretendeu e do que ainda se pretende”, conclui.
Para o Sindicato dos Bancários de Bauru e Região, o desembargador está correto em sua avaliação sobre a reforma trabalhista. Antes mesmo de ser sancionada, a entidade denunciou incansavelmente aos trabalhadores todos os malefícios dessa reforma, que foi vendida como a solução para a crise brasileira, mas só retirou direitos, aumentou a informalidade e a precarização.
Fonte: SEEB Bauru e Região/Sindicato dos Bancários e Financiários