Desabastecimento de remédios nas farmácias revela falta de planejamento do governo



Desabastecimento de remédios nas farmácias revela falta de planejamento do governo

Por Cézar Xavier

Quase todos os dias se assiste reportagens na televisão sobre usuários do SUS que não conseguem pegar seus remédios gratuitos na Farmácia Popular. Agora, o problema se agravou e não é mais possível nem comprar esses remédios numa farmácia comum. O próprio Ministério da Saúde e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) reconhecem que há um apagão de remédios e insumos médicos pelo país e encontrou como solução para o problema liberar o aumento de preços na Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) para garantir oferta.

Além de antibióticos, faltam itens indispensáveis ao Sistema Único de Saúde (SUS) e listados na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename) 2022, como o antibiótico amoxicilina, e dipirona, considerados medicamentos básicos no combate a dores e febre. Já são dois meses que o consumidor não encontra certos remédios em algumas localidades do país.

Uma pesquisa da Confederação Nacional de Saúde (CNSaúde), feita com 106 estabelecimentos como hospitais, clínicas especializadas e empresas em 13 estados e no Distrito Federal, revela a dimensão do problema. Falta soro em 87,6% dos estabelecimentos, falta dipirona injetável em 62,9%, entre outros insumos básicos para tratamentos.

Segundo a CNSaúde, as instituições médicas estão pagando o dobro do preço por alguns destes produtos, quando encontram. Cerca de 95% dos insumos para produzir medicamentos , incluindo o Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA), vêm da China e da Índia. Com isso, parte do problema envolve a alta do dólar e do barril de petróleo, cujos derivados são usados para produzir embalagens, além de encarecer a cadeia de transportes.

Falta de planejamento injustificável

O médico de Família e Comunidade em São Bernardo do Campo (SP), Renato Lemos, observa o drama da busca por medicamentos nas redes pública e privada e considera inadmissível o que está ocorrendo. “O desabastecimento de medicamento mesmo em circunstância de pandemia e guerra não se justifica. Isso é reflexo direto do desgoverno Bolsonaro. Todo fornecimento de medicamentos para farmácia popular, para estruturas do SUS ou farmácias privadas passa por decisões protocolares com planejamento prolongado”, explica o médico, em entrevista ao portal Vermelho. “Se está faltando agora nas farmácias, é porque o governo já deixou de dar respostas protocolares aos contratos, há pelo menos três meses”.

A análise de Renato bate com as afirmações do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), que vêm alertando o Ministério da Saúde sobre o risco de desabastecimento no Brasil. Num levantamento feito pelo Conasems, a dipirona e os antibióticos amoxicilina, clavulanato de potássio e azitromicina são os mais “faltosos” entre as 284 cidades pesquisadas na última sexta-feira (8).

Segundo o Conassems, a entidade tem tomado iniciativas de capacitação de farmacêuticos e gestores para um melhor monitoramento da ponta, para que seja possível apontar aos órgãos reguladores nacionais o cenário preciso da escassez e pedir providências.

O médico também avaliou os riscos de utilizar remédios mais fortes, por falta dos básicos, como dipirona injetável, em hospitais. “Analgésicos, antiinflamatorios e opioides têm indicação específica e reações adversas. Quanto mais potente, além de ser mais caro para o estado, causam mais reações adversas, dependências e intolerâncias, o que pode agravar o tratamento do paciente”, apontou.

Falta indústria nacional

O próprio ministro Marcelo Queiroga admite que a falta de um complexo industrial e parque fabril no Brasil contribuem para o cenário:

“Temos o desafio da química fina, em que ficamos para trás da Ásia. Hoje, estamos com dificuldade de IFA de dipirona, o que é inaceitável”, disse o ministro à Comissão de Fiscalização e Controle do Senado na quarta-feira. “Se, lá atrás, planejamos ter um acesso universal, integral, igualitário e gratuito para atender 200 milhões de brasileiros, isso não pode ser dissociado de ter, por exemplo, um complexo da saúde forte e profissionais de saúde para atender nesse sistema”, diz ele.

Renato insiste que o governo está agindo açodado pelo colapso do abastecimento e sob pressão das entidades. “As importações de princípios ativos para fabricação de medicamentos no país também dependem de decisões de prioridade. Dentro desse governo, a gente cansou de ver a falta de planejamento e prioridade, desde as omissões envolvendo vacinas. Tudo isso é resultado de uma decisão política de governo, amparada por um ministro incapaz”, critica ele.

Além de liberar aumento de preços, outro recurso apontado pelo ministro para tentar aliviar a crise é diminuir o imposto de importação de insumos. Com isso, a população paga o custo do abastecimento de duas formas, sem ter a garantia plena de encontrar o remédio na farmácia. Agora, o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma) quer desmontar a regulação de preços da CMED, feita no primeiro ano do governo Lula.

“Por causa de um controle de preços ultrapassado e desconectado da realidade, os preços ficaram defasados, enquanto subiam gradativamente os preços de IFAs (insumos farmacêuticos ativos), embalagens (frascos, vidros etc.) e outras matérias-primas importadas e cotadas em moeda forte”, diz a nota do Sindusfarma.

O Conselho Federal de Farmácias (CFF) afirma que a indústria parou de fabricar alguns medicamentos para priorizar os que mais vendiam na pandemia. Justifica também que a pandemia de doenças respiratórias leva a um esgotamento dos estoques, assim como a falta de insumos pela guerra e pelo lockdown na China.

“Porém, o Conselho Federal de Farmácia (CFF) considera urgentes e necessárias medidas que possam mitigar o problema, como o incremento da produção nacional tanto de matéria-prima, quanto do produto acabado (o Brasil tem pelo menos 18 laboratórios farmacêuticos oficiais, que estão subutilizados); um melhor planejamento de compras no serviço público, visando à manutenção dos estoques; e estratégias para um monitoramento mais eficiente do abastecimento das redes pública e privada”, diz a nota.

Fonte: Vermelho

 

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