Denúncia de salários milionários em SP e apagão no Amapá expõem mazelas da privatização



Denúncia de salários milionários em SP e apagão no Amapá expõem mazelas da privatização

Os argumentos falaciosos dos governos para terceirizar ou privatizar os serviços públicos, de que a iniciativa privada moderniza e melhora a qualidade do que é oferecido à população, além de reduzir o custo para os governos, foram derrubados esta semana por dois fatos contundentes.

No Amapá, o apagão mostrou que uma empresa privada é responsável pelo drama da população que está há nove dias sem energia elétrica. A multinacional espanhola que comprou a empresa de energia não conseguiu resolver o problema e trabalhadores da Eletrobras foram enviados ao estado, além dos recursos enviados pelo governo federal para a defesa civil do Amapá.

Em São Paulo, reportagem exclusiva do jornalista Rodrigo Gomes, da RBA, mostra documentos comprovando que trabalhadores contratados por terceirizadas para o trabalho social realizado para a Secretaria Municipal de Habitação (Sehab) receberam até R$ 68,9 mil por mês, enquanto o salário de um servidor público na mesma função - a de Coordenador V – é de cerca de R$ 5 mil.

É dinheiro público sendo utilizado de forma questionável pelo poder público que não tem transparência nas contratações de terceirizados e gestões de Organizações Sociais, afirma o presidente do Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo (Sindsep), Sérgio Antiquera.

“Não há nada que justifique salários tão altos entre os terceirizados ou serviços privatizados. São salários até mesmo acima do mercado. A terceirização, teoricamente, tem função e redução de custos e o que acontece p justamente o contrário”, complementa.

Protocolarmente, a Sehab disse por meio de nota técnica: “Sugerimos que seja realizado concurso público e posterior treinamento para formar uma equipe de profissionais técnicos que possam atender a demanda dos trabalhos na SEHAB. Mesmo sendo uma ação que dê resultado em médio prazo, trata-se de uma economia bastante significativa para a Administração Pública Municipal”.

O Ministério Público de São Paulo (MPF), no entanto, está investigando casos de superfaturamento de salários de trabalhadores terceirizados nos serviços públicos na gestão de Bruno Covas (PSDB), prefeito e candidato à reeleição na cidade de São Paulo.

Casos na Saúde

Na saúde, também há casos de disparidades salariais. O Sindsep-SP conseguiu derrubar na Justiça uma tentativa de aditamento de um contrato pela Prefeitura para ampliar a gestão do Hospital Campo Limpo, que ficaria sob a responsabilidade de uma Organização Social (OS) controlada pelo Hospital Albert Einstein, instituição privada.

“O custo com 212 profissionais de diversas áreas ficaria em R$ 17,7 milhões por ano. Se fosse com servidores públicos, o gasto total seria de R$ 10,9 milhões. Com a OS, ficaria 61% mais caro para os cofres públicos”, diz Sérgio Antiquera, com base em estudos feitos seguindo a tabela de salários de servidores.

Transparência zero

O acompanhamento da utilização dos recursos públicos não é um caminho simples, de acordo como o dirigente, porque não há estudos aprofundados mostrando a necessidade, os cálculos e justificando a destinação do dinheiro nesses casos.

“Quando se levanta os processos, as planilhas, é que se descobre as disparidades e não sabemos nem se o profissional está trabalhado”, afirma Sérgio Antiquera.

De acordo com ele, nem os conselhos municipais, nem o Tribunal de Contas do Município (TCM) consegue acompanhar a fundo e quando entram as terceirizações é ainda mais difícil.

“A preocupação principal é quando você tira dinheiro público para destinar ao privado. Não se sabe qual o caminho que o dinheiro faz, e pode beneficiar os empresários”, completa.

O dirigente reforça ainda a necessidade de uma investigação mais completa por meio de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar irregularidades, ainda que Covas tenha em suas mãos a maioria dos vereadores da Câmara Municipal. “São mais de 30 vereadores que votam com Covas, portanto o caminho é difícil”, diz.

Qualidade de serviço

O serviço público deveria ser “público e universal”, afirma a secretária da Mulher Trabalhadora da CUT, Juneia Batista, explicando que a população paga  impostos justamente para ter como retorno serviços públicos e de qualidade.

“A população pensa que é público, mas não é, está privatizado, na mão de OS, ou tem serviços terceirizados. Alguém ganha do outro lado”.

Segundo a dirigente, terceirização e privatização também significam prejuízos aos servidores públicos, não somente pelo desrespeito às carreiras e aos salários, mas também à dedicação à prestação o serviço prestado.

“São empresários ganhando dinheiro e quando isso acontece a gente já ouve sobre propina e apadrinhamento de pessoas, quando o correto é servir à população e não ao governo em questão. Estou há 32 anos na Assistência Social. Prefeitos entraram e saíram e nós continuamos porque trabalhamos para população. A terceirização significa ser funcionário de uma gestão e não da população”, conclui Juneia.

Em todos os casos de privatização e terceirização de serviços públicos quem mais sofre são os trabalhadores mais pobres. No caso da saúde, quem mais precisa desses serviços é justamente essa população, que em sua maioria, reside em bairros periféricos, onde estão localizados hospitais como o do Campo Limpo, citado nesta matéria.

É geralmente nessas unidades que as OS realizam os treinamentos de profissionais que, posteriormente, trabalharão em hospitais privados em regiões centrais ou de maior concentração de pessoas com poder aquisitivo mais alto. Essas situações foram relatadas pelos próprios trabalhadores ao Sindsep.

“Colocam gente para treinar na periferia com os mais pobres, depois mandam o profissional para o Morumbi. E o que sobra é um desrespeito com a população porque eles mandam pacientes até com problemas graves voltarem para casa para não deixarem corredor de hospital lotado e mostrar uma falsa eficiência, principalmente nesses tempos de campanha”, diz Sérgio Antiquera.

Eleições

Para Sérgio Antiquera, o projeto de Bruno Covas para a prefeitura de São Paulo passa pela privatização dos serviços públicos. Já ao assumir a prefeitura, quando substituiu João Doria em 2018, que se candidatou ao governo do estado, Covas prosseguiu com o programa de seu antecessor.

As privatizações e terceirizações são atacadas pelos principais adversários de Covas na disputa eleitoral deste ano.

Para o candidato do PT, Jilmar Tatto, há que se valorizar tanto o serviço público quanto o servidor público e o processo de privatização e terceirização piora a qualidade de atendimento para a população.

“Em São Paulo, o programa não trouxe nenhuma vantagem, a não ser para os empresários que tiveram concessões na saúde e tentativas no setor de educação”, disse Tatto.

De acordo com o programa apresentado por ele, a proposta é valorizar o serviço público prestado pelo Estado porque é um direito do cidadão.

Guilherme Boulos, candidato pelo Psol, em um debate com empresários na Associação Comercial de São Paulo, descartou a possibilidade de uma política de privatizações. De acordo com reportagem do Diário do Comércio, Boulos afirmou: “Não esperem de mim privatizações, o que não significa que demonizo o setor privado”.

Boulos, no entanto, não descartou as Parcerias Público-Privadas (PPPs), que teriam de ser mais criteriosas, segundo ele.

Fonte: CUT

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