Carta às(aos) trabalhadoras(es): sonho, luta e o Intensivão



Carta às(aos) trabalhadoras(es): sonho, luta e o Intensivão

Unidos, a gente fica em pé!

(Emicida)

 

Eles têm o capital, a máquina do governo, os meios de produção, a (in)justiça, a policía, a maldade e o ódio. Eles usam todo esse arsenal para nos destruir, massacrar e dividir! E a gente luta. Mas luta com amor, com beleza, com encanto, com choro, com sangue, com vida. A desumanidade deles tenta nos desumanizar, mas a gente é povo teimoso, tinhoso, e teima em amar lutando e lutar amando, e nesse caminhar vamos construindo luta que encanta, aconchega, acolhe e partilha. A gente luta pra transformar o mundo, e a gente sonha alto, sim! Porque a gente quer ver todo mundo bem. E é todo mundo mesmo: todas as formas de vida, bicho, planta, gente… Vamos teimar em falar pros quatro cantos que é possível, sim, construir um mundo para todo mundo e que a gente é capaz de fazer.

Lutar é verbo que exige ação coletiva organizada, e organiz(ação) coletiva é requisito de luta. E foi entendendo isso que os trabalhadores da Força e Luz, empresa responsável pelo fornecimento de energia elétrica aos bondes de Belo Horizonte, Santa Bárbara e Itabirito, se organizaram e, em 1946, iniciaram a criação da Associação Profissional dos Trabalhadores na Indústria de Energia Elétrica de Minas Gerais. Ali nascia o Sindieletro, da organização coletiva dos eletricitários para lutar por melhores condições de trabalho, por melhores salários, por suas vidas. Seis anos depois, no governo de Juscelino Kubitschek, era inaugurada a Cemig e a associação dos trabalhadores convertia-se em sindicato.

As(os) trabalhadoras(es) unidas(os) dedicaram suas vidas em luta para garantirem a qualidade de vida de suas famílias e de sua comunidade; não suas em posse, e sim em pertencimento. E foi por meio dessa luta organizada e coletiva que 70 anos de história foram forjados na boniteza da luta ampla, diversa, plural, colorida e popular. Nesses 70 anos, foram muitas batalhas enfrentadas e muitas conquistas. E eu gostaria de falar de uma delas em especial, uma que tem início nos anos 90, com o avanço voraz do neoliberalismo e o advento da terceirização, ferramenta de intensificação da exploração da mão-de-obra que resulta em seu barateamento: a luta pela a primarização.

O Sindieletro sempre denunciou os problemas contidos nessa prática nefasta e luta por uma categoria única, por práticas de trabalho respeitosas e seguras e por remunerações dignas para todos os trabalhadores. Sabendo bem que essa luta não começa comigo e vem bem antes de mim, compartilho um relato do José Henrique, ex-dirigente do Sindieletro, sobre sua vivência na luta com o trabalhador terceirizado em Patrocínio:

“Aqui em Patrocínio, essa coisa surgiu. Tem toda uma conversa, mas ela não surgiu a partir daqui, não foi a partir de mim. Isso começa com o acidente do Pedro Murilo, lá em Pirapora. Naquela época, nós estávamos chegando para a nova gestão do Sindicato, lá em 2015. E quando teve o acidente do Pedro Murilo lá em Pirapora, eu, o Lúcio Parrela, o Ninja e o Toninho fomos ao local.  Lá, nós encontramos o Zé da Rita, que era o trabalhador da fazenda que, no dia do acidente, acolheu, velou e colocou um pano sobre o Pedro. E aí, a gente perguntou: por que você fez isso? E ele respondeu: ‘Eu não podia deixar ele sozinho e eu coloquei pra proteger ele das onças’. Então, houve ali uma solidariedade em respeito à memória, à família. A fala do Zé da Rita foi muito importante. Surge ali [a luta pela primarização].

Depois, surge naquela ocupação que teve na Sede[1]com o Fabão, Celso Primo, Lúcio Parrela e Jefinho, onde a gente entrega a proposta dos 1500[2]. Isso sempre vem permeando... Vem com a fala do Lúcio. Eu lembro do Lúcio falando ‘Dublê de Eletricista’. Quer dizer: eu faço o serviço mais perigoso aqui, mas quem são os artistas são os eletricistas da Cemig. E nós temos que quebrar essa lógica. Eles não são dublês de eletricistas, eles são eletricistas. Eles não têm as mesmas condições, mas não podem ser esses que estão à margem, que são os que não são vistos, que são esquecidos.

É claro: qualquer resultado que tiver disso, que seja um, dois ou três que passarem com nosso envolvimento, vale a pena. Mas a gente tá dando a demonstração de que, na verdade, nós devemos nos unir. Eu acho que é algo que a gente tinha que acreditar, esperançar e lutar pra que a gente traga uma outra energia. Vida, dignidade e trabalho.”

O José Henrique foi quem eu ouvi propor primeiro que a gente construísse um cursinho para ajudar os trabalhadores a estudar para o concurso que a Cemig abriu neste ano. Ele já começou a articular a ideia, e eu, em nome da Secretaria de Formação, abracei, junto com uma galera que ousou sonhar com a gente, esse projeto lindo. Construímos o Intensivão: Qualificação para eletricistas de distribuição. Foi um caminho sinuoso, que teve até algumas armadilhas. Mas a gente construiu um trabalho coletivo, com amor, garra, luta e suor. E quando a gente fala a gente, a gente tá falando de muita gente. Cada um dedicando um pouquinho de si para tornar esse sonho realidade.

Teve o professor Antônio Francisco, o Toninho, e sua companheira Vânia Márcia, que sonhou junto com a gente esse projeto e se pôs a realizar. Teve o Coletivo Esperançar, a professora Denise, de Matemática, e a professora Maria Isabel, de Português (e militante do Levante Popular da Juventude) que, com criatividade e criticidade, nos apresentaram aulas que questionavam ensinando e ensinava questionando. Teve a Maria Paula, jornalista do Brasil de Fato e militante do Levante Popular da Juventude, que abraçou com a gente esse projeto.

Teve cada trabalhador(a) do Sindieletro que dedicou seus conhecimentos e habilidades e se aventuraram junto com a gente em mais esse trabalho. Teve a direção, que se engajou e tornou o projeto possível, o Conselho Deliberativo e toda a categoria que contribuiu para que esse trabalho acontecesse. E teve cada trabalhador(a) que acreditou nessa construção e veio junto com a gente sonhar e construir o Intensivão. É, meus companheiros, é real! A gente fez isso juntos e isso é só uma amostra do que a gente é capaz de fazer.

Eu, em nome da Secretaria de Formação do Sindieletro e, por extensão, em nome do Sindieletro, gostaria de parabenizar a dedicação e esforço de cada um de vocês que ousaram sonhar e construir com a gente esse trabalho lindo. Os parabéns não vão apenas para os aprovados! De forma muito mais ampla, parabenizamos todos os envolvidos(as) que trabalharam, estudaram, assistiram às aulas, fizeram perguntas, compartilharam as informações, mandaram mensagens, torceram, contribuíram, sonharam e construíram! Quando a gente sonha junto, a gente faz acontecer!

O Sindieletro é um espaço de luta organizada das(os) trabalhadoras(es) e sua existência está intrinsecamente ligada à luta coletiva e organizada das(os) trabalhadoras(es) por vida, dignidade, trabalho e pela construção de uma outra forma de nos organizar enquanto sociedade, livre de todo tipo de exploração e opressão. Vem com a gente sonhar o mundo que a gente quer construir e construir o mundo que a gente quer sonhar!

Geovan Aguiar Teles de Assis

Dirigente de Formação do Sindieletro MG

 

[1]Em 2015, Fábio Ferreira, Jefferson Silva, Celso Marcos Primo e Lúcio Parrela ocuparam a sala do Comitê de Negociações da Cemig por 15 dias. Também houve uma greve histórica da categoria, que durou 54 dias. Depois disso, a PLR voltou a ser paga 50% proporcional e 50% linear.

[2] Ao fim da greve histórica, foi entregue um documento exigindo a abertura de 1500 vagas de contratação para o quadro próprio, mediante concurso público.

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