Atingidos criticam a anulação do processo contra os responsáveis pelo rompimento em Brumadinho



Atingidos criticam a anulação do processo contra os responsáveis pelo rompimento em Brumadinho

Um protesto na manhã da quinta-feira (21), em frente à Justiça Federal em Belo Horizonte, chamou atenção para a impunidade no caso do rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho (MG). Mil dias depois da tragédia, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu anular a denúncia produzida pelo Ministério Público de Minas Gerais, tornando inválida a investigação feita por um ano e oito meses.

À porta da Justiça Federal, atingidos organizados pelo Movimentos dos Atingidos por Barragens (MAB) e pela Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos (Avabrum) realizaram um ato simbólico contra a decisão do STJ.

Alexandra Andrade Gonçalves Costa, presidenta da Avabrum, afirma que as vítimas receberam a notícia com dor, tristeza e revolta. “Nós esperamos que eles revoguem essa decisão. Queremos que o crime seja julgado com júri popular em Brumadinho. E esperamos também celeridade no processo”, defende.

“Já são mil dias de impunidade, em que fomos traídos pela empresa Vale. Nossos entes queridos que foram assassinados pela empresa achavam que a Vale era responsável e nunca deixaria uma barragem romper daquela forma”, lamenta Alexandra. Ela relembra que oito vítimas ainda não foram encontradas.

Sofrimento

Francisca Lindalva Caetano passou seu aniversário no protesto. Seu filho e seu sobrinho, ambos de 31 anos, foram vítimas fatais do rompimento. Eles trabalhavam em uma empresa terceirizada da Vale. “É uma dor que não passa”, disse dona Lindalva diversas vezes. “A Vale diz que preza tanto por segurança, mas os responsáveis pela barragem sabiam o que estava acontecendo, mas deixaram acontecer”, indigna-se.

Pela ocasião do seu aniversário, dona Lindalva só tinha um desejo. “Eu pediria que meu filho estivesse aqui comigo”, aponta.

O que acontece com o processo

Na terça-feira (19), o Superior Tribunal de Justiça decidiu que a Justiça estadual não tem competência para analisar o caso. Assim, a investigação que vinha sendo feita pelo Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG) há um ano e oito meses será anulada.

Em janeiro de 2020, o MP-MG denunciou 16 pessoas como responsáveis pelo rompimento da barragem da mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho. De acordo com o MP, os denunciados deveriam responder na Justiça pelo crime de homicídio doloso, quando há intenção de matar, porque teriam responsabilidade na morte de 272 pessoas, que foram soterradas pela avalanche de rejeitos da represa.

A decisão do STJ anula a denúncia e os 16 citados não são mais considerados réus. O que significa que o processo deve começar do zero por meio de uma nova denúncia do Ministério Público Federal.

Anulação foi motivada por pedido da Vale

A decisão é considerada uma estratégia da própria mineradora Vale para atrasar o julgamento, avalia Joceli Andreoli, membro da coordenação nacional do MAB. “É uma grande sacanagem, visto que tudo já foi apurado, tudo já foi levantado, as perícias foram feitas, grande parte das investigações já foi feita, uma CPI foi realizada comprovando vários crimes”, aponta Joceli.

Ele compara essa situação com o processo criminal sobre o rompimento da barragem da Samarco/Vale/BHP Billiton em Mariana (MG). “Seis anos depois, o processo criminal de Mariana foi arquivado, virou pizza, o processo cível é uma vergonha. A Justiça Federal no caso de Mariana está se comportando mais a favor da Vale do que como justiça. Na nossa avaliação, é que essa é uma estratégia da Vale para ficar impune”, analisa.

A decisão do STJ aconteceu a partir de um habeas corpus proposto pela defesa do ex-presidente da Vale, Fábio Schvartsman, que era um dos réus. O Superior Tribunal aceitou os argumentos dos advogados de Fábio Schvartsman, anulando o julgamento em instância estadual. O próprio Ministério Público Federal foi contra a decisão, afirmando que não há descrição de crime federal e não há bem jurídico da União atingido na denúncia.

Debate online

Também para marcar os mil dias da tragédia e protestar contra a impunidade, aconteceu uma transmissão ao vivo na manhã desta quinta (21) organizada pela Região Episcopal Nossa Senhora do Rosário (Renser).

A live “Mil Dias de Impunidade” contou com a participação de Andresa Rodrigues, mãe de Bruno Rocha, vítima fatal do rompimento da barragem, e vice presidenta da Avabrum; Dom Vicente Ferreira, bispo auxiliar na Arquidiocese de Belo Horizonte; Danilo Chammas, advogado popular e assessor jurídico da Renser; e Armin Paasch, especialista em direitos humanos e empresas da organização Misereor, da Alemanha.

Fonte: Brasil de Fato

 

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