Artigo: O velho Zema e o partido Novo do século XVIII



Artigo: O velho Zema e o partido Novo do século XVIII

Por Dimas Antônio de Souza(*)


O nome de um partido político nem sempre está vinculado às ideias as quais defende. E tampouco ao grupo ao qual pretende representar. Muitas vezes para a escolha do nome os fundadores do partido seguem critérios de marketing, visando atrair os eleitores, muitas vezes enganando-os.

Creio que o exemplo mais contundente que a história nos oferece foi o nome dado ao partido nazista de Hitler, Partido Nacional Socialista Alemão. Partido este que, embora professasse uma ideologia oposta ao socialismo, chegando mesmo a perseguir os socialistas e comunistas com a mesma violência que perseguiu a judeus, homossexuais e outros, usou do nome socialismo para atrair e trair as massas trabalhadoras.

Dentre os trinta e um partidos existentes no Brasil, nem o bizarro Partido da Mulher Brasileira (PMB), composto por uma maioria masculina, supera as intenções de enganar os eleitores que o tal partido de nome Novo.

Para liberais de hoje, liberdade se resume no direito de explorar livremente

No Partido Novo não conseguimos enxergar nenhuma coerência entre o seu nome, a sua ideologia e muito menos em relação à prática de seus políticos, como por exemplo, o governador de Minas Romeu Zema.

Embora seu nome seja Novo, o liberalismo, ideologia à qual professa, é uma velha conhecida e tem suas origens na Inglaterra do século XVII, mais precisamente das ideias desenvolvidas pelo calvinista inglês John Locke (1632-1704).

Trata-se de uma ideologia política que afirma que a garantia da vida, da liberdade e da propriedade dos indivíduos deve ser a única função do Estado. O que quer dizer que o Estado deveria apenas garantir a existência da justiça e da segurança pública, de modo que a educação, a saúde, a cultura, a assistência social e a proteção ao trabalho e ao trabalhador, dentre outros direitos sociais, não seriam função do Estado.

Essa ideologia colocada em prática por Zema pode ser notada quando verificamos que a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social, que dentre outras atividades cuida da assistência social, foi responsável por apenas 0,13% das despesas do Estado em 2022. Ou seja, uma mixaria para um Estado de tamanhas desigualdades.

No fundo, esses novos liberais conseguem ser ainda mais cruéis do que os liberais do século XVIII
É também em consonância com essa velha ideologia que o governador se recusa a pagar aos professores o piso nacional da categoria. Bem como, é em consequência dessa ideologia que nosso Estado é campeão nacional no ranking de pessoas encontradas em condições de trabalho análogas à escravidão.

Liberais como Zema, com as mesmas mãos com que cortam os direitos do povo, alegando economizar para o Estado, abrem espaço para o enriquecimento ainda maior das camadas mais ricas. E também, em razão da ideologia liberal, promovem a devastação do meio ambiente.

Curiosamente, esses mesmos paladinos da liberdade são também os mesmos que, quando criticados em suas práticas ou convicções, recorrem sem nenhuma vergonha à censura e à força.

Aliás, isso foi o que governador fez quando exonerou o diretor artístico e outros artistas comissionados da companhia de dança do Palácio das Artes, em Belo Horizonte. Além de proibir o espetáculo m.a.n.i.f.e.s.t.a, que estava em vias de apresentação e que prometia ser uma celebração à democracia.

É que, no fundo, esses novos liberais conseguem ser ainda mais cruéis do que os liberais do século XVIII. Uma vez que os antigos liberais não elencavam a liberdade econômica como a principal das liberdades. Eles se referiam ao conjunto das liberdades. Já para os novos liberais, a liberdade se resume no direito de explorar livremente, sem nenhuma limitação legal, as pessoas e o meio ambiente.

O governador quer cobrar de volta, com juros e correções monetárias, as doações que ele voluntariamente fez de seu salário

Zema também usou do rótulo Novo para referir-se ao fato de que iria fazer política de modo voluntário, desgarrado das velhas práticas patrimonialistas, pelas quais a carreira política seria a rota certa para o enriquecimento pessoal.

Para confirmar suas palavras, afirmou ter doado o seu salário de governador às instituições de caridade durante os quatro anos de seu primeiro mandato. Por óbvio, o Governador faria muito mais para os pobres se aumentasse os investimentos em assistência social ao invés de fazer jogo de cena para reeleger-se.

Reeleito, Zema não se propôs a doar novamente os quatro anos vindouros de seu salário. Ao contrário, tratou logo de propor aumentá-lo em 4 vezes ao final de 4 anos. Ou seja, o governador quer cobrar de volta, com juros e correções monetárias, as doações que ele voluntariamente fez de seu salário.

Velhas ideias e velhas velhacarias. Enfim, nada de novo no Novo.

Fonte: Brasil de Fato MG

(*) Dimas Antonio de Souza é professor de Ciência Política do Instituto de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Twitter: @prof_Dimassouza e Instagram: @prof.dimasoficial.

 

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