A Organização das Nações Unidas (ONU) declarou em 2010 que o acesso à água e ao saneamento são direitos humanos. Apesar da declaração já ter mais de uma década, no Nordeste brasileiro, milhares de famílias lidam diferentemente com a falta de acesso a esse recurso que é tão fundamental para a vida.
Observando as relações de gênero no campo, quem mais sofre com a escassez são as mulheres camponesas. Verônica Souza, que é agricultora da cidade de Orobó, no sertão de Pernambuco, destaca dificuldade em conseguir desenvolver as suas atividades diárias.
"Infelizmente a água é uma das principais preocupações, porque a gente tinha uns projetos de cisternas que vinham para as famílias, principalmente pra gente, mulher, para poder abastecer nossa casa. As mulheres agricultoras precisam de água para dar banho nos seus filhos, para lavar roupa, lavar os pratos, cuidar da casa, cuidar da família e cuidar das nossas hortas”, exemplifica a agricultora.
Foi visando a situação de famílias como a de Verônica que o Governo Federal criou em 2003, na gestão de Luiz Inácio Lula da Silva, o Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC).
A política garante a construção de reservatórios que fazem a captação e reserva de água das chuvas para que a população consiga ter água potável para uso doméstico e produção de alimentos durante os momentos de estiagem, que normalmente duram oito meses por ano no Semiárido.
Desde o lançamento, o P1MC promoveu a construção de 1,3 milhão de cisternas e outras estruturas de reservatório ajudando a abastecer a residência de cerca de 5 milhões de pessoas.
O cenário mudou desde 2018, com o governo Bolsonaro, já que o programa vem sofrendo cortes no orçamento, impossibilitando que as milhares de famílias que ainda não têm cisterna no quintal de suas casas tenham acesso à água garantido. Em 2014, por exemplo, foram instaladas 149 mil cisternas e em 2020 apenas 8 mil foram construídas, de acordo com dados do Ministério da Cidadania.
No Rio Grande do Norte, a família da agricultora familiar Iraneide Oliveira foi uma das contempladas com a construção de dois tipos de cisterna: uma para consumo humano e outra para demais atividades da casa, plantio e criação de animais.
Ela relata as mudanças com a chegada dos reservatórios. “Quando a gente chegou aqui não tinha água. Agora, tem a primeira água que é a água da cisterna para o consumo humano, pra gente beber, cozinhar, essas coisas... e tem a segunda água, que é a água do sistema de enxurrada, que é pra limpeza da casa, lavar roupas e temos o reuso de água que é a reutilização da água que a gente lava roupa, a gente reutiliza pras plantas”, relembra..
Mesmo sendo um direito humano, o Brasil ainda está longe de garantir esse acesso a todos e todas. De acordo com a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), há pelo menos 350 mil famílias aguardando por cisternas e mais de 800 mil precisam do equipamento para a produção de alimentos e criação de animais. Na prática, a redução das políticas de acesso pode colocar a população mais afetada dessa região em risco ainda maior frente aos impactos ambientais das estiagens cada vez maiores.
Fonte: Brasil de Fato (PE), por Rodolfo Rodrigo