Artigo de Alex. M. S. Aguiar* – publicado originalmente em Novo Jornal
Minas Gerais vivencia hoje, assim como nos últimos três anos, o embate em adotar políticas privatistas e de um estado mínimo, políticas essas que unem de modo inequívoco Zema e Bolsonaro. O apoio incondicional de Zema ao presidente ao longo desses três anos, aliás, pode ser revisto, por quem assim o desejar, em inúmeras passagens públicas, como sua negativa em assinar a carta dos governadores criticando a postura do executivo federal nas ações contra a Covid-19. Qualquer tentativa de afastar um do outro não terá, portanto, razão que não seja com objetivos eleitoreiros.
A privatização de serviços públicos essenciais tem, via de regra. um final já bastante conhecido: a violação de direitos humanos. As experiências internacionais no setor de saneamento, por exemplo, mostram isso com clareza. São hoje mais de trezentos os casos de reestatização ou remunicipalização de serviços de abastecimento de água mundo afora, e apesar disso caminhamos na direção contrária, tendo à frente dessa cruzada infame a dupla Zema e Bolsonaro.
A lei 14.026, promulgada pelo presidente Bolsonaro em 15 de julho de 2020, é um exemplo claro desse alinhamento. Oriunda de uma proposta do deputado federal Geninho Zuliani (União Brasil/SP) e do senador Tasso Jereissati (PSDB/CE), essa lei praticamente impõe a privatização dos serviços de saneamento básico no país, colocando na forca o pescoço das empresas estaduais que atuam no setor, como a Copasa, e, também, daquelas municipais, como os serviços autônomos de água e esgotos das cidades de Caeté, Governador Valadares, Itaúna, Sacramento, Uberlândia, Uberaba e tantos outros. A promulgação dessa lei por Bolsonaro teve como cereja do bolo o veto do presidente à proposição de que as concessionárias estaduais pudessem ter seus contratos com os municípios por mais um período de 30 anos, veto esse que foi de encontro à política de privatizar Copasa, Cemig e outras estatais mineiras, anunciada por Zema desde sua campanha.
A Copasa, ainda que tendo o estado como acionista controlador, extrapola em sua atual gestão privada. Nos três primeiros anos (2019-2021) de governo, foram esses os números da Copasa de Zema: (i) Investimentos em Água: R$314 milhões/ano; (ii) Investimentos em esgoto: R$270 milhões/ano; (iii) Distribuição de Dividendos aos Acionistas: R$514 milhões/ano. Nesses três anos de gestão Zema da Copasa os investimentos realizados pela empresa em serviços de abastecimento de água corresponderam a 61% do valor que foi distribuído aos acionistas da empresa. Pior, os investimentos em serviços de esgotamento sanitário corresponderam a apenas 53%, ou pouco mais da metade, do montante distribuído aos acionistas. Sob a batuta de Zema a Copasa se transformou em um rentabilíssimo fundo de investimento para seus acionistas, que sem investirem um só tostão recebem mais do que a empresa investe nos serviços que deveria prestar aos cidadãos – e que pagam por toda essa farra.
Ao deixar de investir em seus sistemas e na melhoria do atendimento dos usuários para distribuir dividendos aos seus donos – estado e acionistas privados – a Copasa de Zema dá uma mostra do que será a privatização dos serviços de saneamento no país. Em quase 40% dos municípios onde tem a concessão dos serviços de esgotos a Copasa não conta com etapa de tratamento, ou essa etapa é insuficiente para tratar todo o volume de esgotos coletados. E ainda assim a gestão de Zema abdicou de investir na redução desse déficit, preferindo transferir recursos para o cofre do estado e para o bolso de seus acionistas privados, deixando à míngua aqueles que agora, por obra da Arsae-MG, a agência estadual que regula os serviços, pagam apenas pela coleta de seus esgotos o mesmo valor que aqueles usuários que, além da coleta, contam também com a etapa de tratamento dos esgotos.
Não há aqui nenhuma surpresa, nenhuma descoberta, apenas o apontamento do óbvio: o objetivo de empresas privadas é o lucro, é transferir recursos para seus donos, e é esse o princípio de atuação da gestão de Zema na Copasa. Presteza no atendimento dos usuários, qualidade dos serviços prestados, e reconhecimento de que atua com um bem essencial à vida de todos, tudo isso é secundário, e não fará frente nunca à sede de dinheiro dos donos.
Esse é o cenário que resulta da privatização dos serviços públicos, e que é também o alinhamento das ideologias políticas de Zema e de Bolsonaro.. É o que estamos vivendo atualmente com a Copasa em MG, e que, a depender das eleições, poderá se estender a todo o país.
* Alex M. S. Aguiar – Engº Civil, Mestre em Saneamento pela UFMG. Diretor da H&A Engenharia, Conselheiro de Orientação do ONDAS.