A barbárie da financeirização na Cemig sob a égide ultraliberal do governo Zema



A barbárie da financeirização na Cemig sob a égide ultraliberal do governo Zema

Pretendemos com a matéria em questão provocar um debate que é feito com certa frequência, mas necessita ser aprofundado devido à gravidade da relação trabalhista que vivenciamos na Cemig diante do governo Zema. Gestão esta que usa da força para tentar implementar a pauta neoliberal e atender, também, os interesses dos especuladores (acionistas) na Cemig. Compreender essa realidade é fundamental para construirmos melhores condições de organização, formação e luta em defesa da empresa estatal e do seu caráter público, garantindo trabalho e emprego dignos, com fortalecimento da sua atuação estratégica para o desenvolvimento socioeconômico em Minas Gerais.

O método de acumulação capitalista contemporânea pela financeirização é referida pelo professor e economista Ladislau Dowbor, em seu livro “A era do capital improdutivo”, da seguinte maneira: “O rentismo é hoje sistemicamente mais explorador, e pior, um entrave aos processos produtivos e às políticas públicas” (p. 246). Este sempre foi um contrassenso aos princípios que fundam a empresa estatal, geradora de emprego e serviço de qualidade e propulsora do desenvolvimento socioeconômico.

De acordo com a resolução n° 4 - A dinâmica do capitalismo financeirizado, da Assembleia Nacional Luís Gama, realizada pelo Movimento Brasil Popular entre os dias 17 e 20 de março de 2022, “a financeirização corresponde à proliferação de instituições financeiras mundiais e uma classe rentista que busca fazer com que o Estado garanta seus interesses de maneira prioritária. Portanto, frações de classe se colocam socialmente e intervém direcionando as políticas de Estado no sentido de garantir os interesses do capital financeiro no que diz respeito à sua expansão, à desregulamentação das relações do trabalho, a transnacionalização produtiva, abertura para capitais especulativos, privatizações e expansão das dívidas públicas. Ou seja, o Estado garante a dinâmica do capital que se valoriza na lógica do capital fictício, aquele que se apropria de um rendimento futuro, descolado ou com vínculo tênue com o processo produtivo”.

 

Consenso de Washington

No Brasil, a lógica da financeirização ganhou força a partir da década de 90, sob forte interferência norte-americana após o estabelecimento das 10 medidas macroeconômicas para América Latina, na reunião que ficou conhecida como “Consenso de Washington”, em 1989. O encontro foi liderado por membros do governo dos EUA e contou com a participação de representantes dos bancos mundiais e economistas liberais. Dentro da agenda neoliberal destacam-se: privatização de empresas estatais, desregulamentação da economia e liberalização do setor financeiro.

Não coincidentemente, em 1990 foi criado no Brasil o Programa Nacional de Desestatização, através da lei 8.031, e consequentemente diversas empresas estatais, de diversos setores, foram privatizadas. Outras medidas foram implementadas no país nos termos estabelecidos pelo Consenso de Washington.

Os reflexos dessa política macroeconômica na Cemig foram: privatização, terceirização em larga escala e o fortalecimento da política de gestão financeirizada. Apesar do Estado ser o acionista majoritário e responsável pela condução da gestão pública e social da estatal, o modelo de economia mista tem gerado contradições na sua atuação em face do favorecimento dos interesses dos especuladores que integram o conselho de administração, em diferentes níveis, a depender do grau da relação estabelecida entre os sucessivos governos de Minas Gerais e os representantes do setor privado na administração da empresa. 

 

Financeirização na Cemig

A gestão compartilhada com os especuladores alterou a composição da força de trabalho na estatal, passando de 18 mil trabalhadores nos anos 90 para aproximadamente 5 mil trabalhadores em 2022. No sentido contrário, houve o aumento exponencial da terceirização. As sucessivas reestruturações que ocorreram na empresa modificaram os processos de trabalho, aumentando a produtividade, extinguindo e subdimensionado equipes, piorando as condições de trabalho e ampliando o controle sobre os processos de trabalho. Tudo isso no modelo de gestão militarizada: regime corporativo aplicado ao exército e forças da segurança pública, muito criticado pela verticalização na relação de trabalho.

Luiz Eduardo Soares, antropólogo, cientista político e especialista no tema da desmilitarização, defende uma organização horizontal, descentralizada e flexível. O exemplo da hierarquia rígida na polícia não funciona e não combate nem a corrupção interna. Eficazes são o sentido de responsabilidade, a qualidade da formação e o orgulho de sentir-se valorizado pela comunidade com a qual interage.

Podemos afirmar que todos os governos que antecederam o de Zema pactuaram de alguma forma, em maior ou menor grau, com os interesses privados na administração estatal. Os governos tucanos de Eduardo Azeredo, Aécio Neves e Antonio Anastasia possuem uma característica específica na relação com os especuladores na Cemig. Foi nesses governos que o repasse de dividendos aumentou em relação ao mínimo legal de 25%, com destaque para o último ano do governo Aécio e o governo Anastasia, que distribuiu 100% do lucro entre 2010 e 2014; cerca de 12 bilhões de reais.

Esse é um histórico simplificado referente à financeirização na Cemig, que precisa ser aprofundado. O contexto da financeirização na Cemig se agrava durante o governo Zema, devido a sua postura autoritária, antidemocrática, desleal e muitas vezes desumana, característica de governos autoritários que impõem com truculência perdas à classe trabalhadora para favorecimento dos “investidores” (banqueiros e grandes empresários), que preferimos chamar de especuladores.

O que vivenciamos na Cemig atualmente é muito grave! O nível de violência contra trabalhadores e a quem se opõe ao projeto desse governo é inadmissível e deve ser contido. O assédio como prática de gestão, lawfare (guerra jurídica), a intolerância na relação trabalhista, a gana pelo modelo de gestão privada, as medidas de antecipação da privatização e o projeto de privatização em si acumulam mortes por acidentes de trabalho, possível relação com suicídio de trabalhador, e desaguam em adoecimentos de trabalhadores, precarização do trabalho e consequente insatisfação dos trabalhadores, além da piora na relação com o consumidor de energia elétrica e a perda da capacidade de contribuir no desenvolvimento socioeconômico.

Diante deste cenário, o debate sobre o trabalho na Cemig se torna imprescindível para ampliar e fortalecer a ação sindical e a luta em defesa dos trabalhadores e da empresa estatal, sem perder de vista as demandas individuais e coletivas da categoria, que não são poucas. Nesse sentido, fazemos o chamado à categoria eletricitária para mais essa trincheira de luta.

Refletir, dialogar e denunciar as contradições existentes no processo de trabalho é a tarefa da vez. Criamos um e-mail para ajudar no nosso diálogo. Mande seu relato sobre os impactos nos processos de trabalho diante da postura violenta dessa gestão na renovação do ACT e demais esferas da relação trabalhista.

soudonodomeutrabalho@sindieletromg.org.br

Cemig: esse “trem” é nosso!

 

Por Jefferson Silva, secretário-geral do Sindieletro/MG.

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