O papel do setor energético estatal no desenvolvimento nacional foi o tema do 4º encontro do curso de Formação Carlos Marighella, realizado em junho. O curso obteve tanto sucesso que a Secretaria de Formação do Sindieletro planeja dar continuidade aos encontros neste segundo semestre, a partir de agosto.
O mediador foi o professor do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC), doutor em Ciência Política pela USP e autor dos livros "Energia e Relações Internacionais" e "Petróleo e Poder", Igor Fuser.
Ele resgatou o histórico do setor energético no Brasil com destaque para o cenário atual que aponta a necessidade de transição energética. Segundo o professor, a energia (seja a elétrica, seja por petróleo) tem relação muito estreita com o desenvolvimento econômico e social. “Sem energia farta e barata, não se pode pensar em desenvolvimento”, enfatizou.
Desenvolvimento X aquecimento global
A humanidade vive, hoje, o impacto negativo do aquecimento global e, por essa razão, segundo Fuser, é preciso fazer a transição energética para o desenvolvimento sustentável.Ele defendeu que a transição seja feita com justiça social e a garantia de expansão de oferta de energia farta e barata sobretudopara os países pobres.
O professor lembrou que o Brasil é autossuficiente em energia, com uma realidade invejável, e tem um potencial enorme para expandir a energia alternativa. Mas o grande desafio é oferecer energia barata com justiça social. A dificuldade maior fica por conta da estrutura do setor energéticoprivatizado, que quer apenas lucro, considerando que no Brasil o desenvolvimento industrial e urbano foi possível com o protagonismo estatal.
A primeira transição energética foi realizada no governo de Getúlio Vargas a partir de 1930,deixando para trás a matriz do carvão e da lenha e dando o salto para a industrialização e a urbanização com o uso em grande escala da eletricidade e do petróleo. “O Estado brasileiro construiu a industrialização e a urbanização do Brasil, a iniciativa privada sempre se mostrou incapaz para os investimentos”, destacou.
Vale lembrar, ressaltou o professor, pela ação do Estado, foram construídas centenas de hidrelétricas, mas não foi tranquilo, “o MAB sabe disso” - MAB- Movimento dos Atingidos por Barragens.“Milhões de pessoas foram desalojadas, a fuzil, expulsas das suas terras, sem voz e sem indenização. O custo social foi o sofrimento humano. Hoje, faz-se mais essencial compensar com justiça energética, pois as represas estão lá, onde foram construídas. O povo tem direito à energia barata e farta”, enfatizou.
Onda neoliberal e de privatizações
Fuse observou que o modelo estatal de energia elétrica e do petróleo entrou em crise nos anos 1970 e já a partir de 1980 o Brasil sofre os impactos da onda neoliberal. Vieram empresas transnacionais e não trouxeram o desenvolvimento, mas o discurso e o interesse de se apossarem de tudo que já estava pronto. Disseram (e ainda dizem) que o Estado é ineficiente, lançaram a defesa das privatizações com o argumento que trariam a eficiência, a energia ficaria barata, haveria mais competição e desenvolvimento. Essa ideia foi vendida no campo da energia. Em nenhum lugar do mundo isso deu certo, a Inglaterra, França e até mesmo os Estados Unidos já estão reestatizando a energia.
Já nos anos 1990, apontou Fuser, os governos Collor e FHC trataram de realizar o desmonte do setor estatal, com a fragmentação, a separação da geração, transmissão e distribuição de energia elétrica, a desnacionalização da Petrobras. O impacto para a sociedade é de custo elevado, preços altos das tarifas e do combustível. O pobre e a classe média são os mais atingidos, assim como a indústria brasileira.
Petrobras, temos que ter orgulho
Para Fuser, os brasileiros devem ter orgulho da Petrobras, da sua trajetória de estatal que se mostrou vital para o desenvolvimento. Segundo ele, a Petrobras foi criada pela pressão dos movimentos sociais e populares e, com suas redes de refinarias, oleodutos, terminais de estocagem e demais infraestrutura, viabilizou a indústria brasileira.
“É uma empresa que fornece estoque e tem uma cadeia produtiva que dinamiza a geração de empregos, além de criar sua própria tecnologia. É vanguarda na exploração de petróleo em mar, e com o pré-sal fez a sua maior descoberta em 50 anos’, ressaltou, acrescentando: “A mídia esconde que a Petrobras deve ser julgada pelos interesses do país. Agora, com o terceiro mandato de Lula, o governo retoma o nacionalismo da Petrobras. Porém, o conjunto de regras colocadas pelos governos Temer e Bolsonaro tirou muito do controle do governo na Petrobras”.Apesar disso, ele acredita que a Petrobras seguirá, sob a gestão do atual governo, com o papel estatal essencial para desenvolvimento e geração de empregos.