Repressão militar



Repressão militar

A presidenta da Central Única dos Trabalhadores de Minas Gerais (CUT/MG), Beatriz Cerqueira, entregou na manhã desta quarta-feira (13) ao presidente Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, deputado Durval Ângelo (PT), um dossiê com fotos, reportagens e expedientes protocolados que mostram o processo sistemático de que o aparato do Estado tem sido utilizado para a repressão dos trabalhadores em Minas Gerais. O relatório vai de 1987 até os dias de hoje. A entrega do dossiê foi feita durante audiência pública que debateu a prevenção à violência em manifestações populares.

De acordo com Beatriz Cerqueira, desde 1987, em pleno estado de direito democrático, os trabalhadores encontram dificuldades a repressão policial em suas manifestações. Os metalúrgicos, por exemplo, enfrentam um aparato repressivo atrelado às empresas. “Durante as campanhas salariais quem protege o capital é o aparato militar. Pagamos impostos para que o Estado impeça que os trabalhadores se organizem. Existem forças policiais regulares, com instalações militares, viaturas, dentro das fábricas.

Policiais militares almoçam com os trabalhadores. Quando acontecem manifestações, mobilizações ou paralisações sindicalistas e trabalhadores sofrem repressão, são espancados”, denunciou a presidenta da CUT/MG.

Beatriz Cerqueira questionou novamente porque não foram tomadas providências após a confirmação, pelo próprio comando da Polícia Militar, do uso constante de monitoriamento do Sind-UTE/MG e dos movimentos dos educadores. “Esta questão tornou-se periférica, porque o Estado não se pronunciou. Ficou comprovado que o Sind-UTE era vigiado por policiais disfarçados, que se infiltravam nas manifestações.

Antes de toda a manifestação dos movimentos sociais e sindicais é lavrado um boletim de ocorrência. Num Estado democrático de direito, adotam práticas do tempo da ditadura militar. O comando da PM admitiu em relatório que esta prática está no protocolo da instituição. No acampamento que fizemos no Palácio das Mangabeiras ocorreu a mesma coisa. Fomos vigiados, filmados. Sempre que nos aproximávamos, eles se afastavam. Não é normal em uma democracia que o aparato militar atue deste jeito.”

Além disso, segundo Beatriz Cerqueira, “não se pode esquecer que o próprio governo do Estado tentou impedir as manifestações em todas das cidades durante a Copa das Confederações. Por decisão judicial, os protestos foram proibidos, o Sind-UTE e o Sindpol receberiam multa diária de R$ 500 mil caso houve qualquer manifestação nas ruas. Esta decisão foi derrubada no STF.”

A presidenta da CUT/MG, que participou da Comissão de Prevenção à Violência em Manifestações Populares, lembrou que os policiais também se infiltravam nas reuniões da Assembleia Popular Horizontal e nas mobilizações do mês de junho. “Nos protestos foram identificados politiciais infiltrados que insuflavam o confronto com o aparato militar e o vandalismo. E nada disso foi investigado.” Beatriz Cerqueira também questionou o motivo pelo qual as pessoas detidas no dia 7 de setembro serem negros, jovens e pobres.
O deputado Durval Ângelo encaminhou o documento para o Ministério Público e aprovou requerimento para discutir, em audiência pública no dia 10 de dezembro, seu conteúdo e o controle do Estado nas manifestações populares.

Importância
A importância da manutenção da Comissão de Prevenção à Violência em Manifestações Populares foi ressaltada na audiência pública. Representantes do Ministério Público (MP), da Polícia Civil, da Defensoria Pública e de entidades da sociedade civil organizada destacaram a ação da comissão para tentar prevenir e evitar confrontos em futuras manifestações, como aqueles ocorridos nos meses de junho e de setembro.

Composta pelo MP, Polícia Militar, Polícia Civil, Conselho Estadual de Direitos Humanos, organizações da sociedade civil, sindicatos e pela Comissão de Direitos Humanos da ALMG, a comissão foi constituída para promover ações conjuntas que garantam o direito à manifestação, minimizando ou até evitando consequências que gerem desconforto tanto para os manifestantes quanto para a população de um modo geral.

Segundo o presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado Durval Ângelo (PT), a criação da comissão foi positiva e teve papel fundamental para a garantia de direitos constitucionais, como o de livre manifestação e o de ir e vir. Ele lamentou ainda a ausência da Polícia Militar na reunião e a necessidade de se discutir qual tipo de polícia uma sociedade democrática gostaria de ter.

À frente da Comissão de Prevenção à Violência em Manifestações Populares, o procurador de Justiça José Antônio Baeta destacou que ela foi criada com o objetivo de garantir o livre exercício de expressão e o direito à manifestação e que, assim, evitou grandes possibilidades de conflito entre manifestantes e a polícia. “Buscamos incessantemente esses dois objetivos e, dentro dessa garantia, o principal sustentáculo é inibir qualquer arbitrariedade policial”, afirmou Baeta. Neste sentido, destacou que houve grande avanço na relação da Polícia Militar com os manifestantes, mas que infelizmente, algumas situações saíram do controle.

Sobre a apuração dos casos arbitrários e de violência, disse que a comissão observou a existência de pessoas infiltradas nas manifestações para provocar violência de forma gratuita. Informou que, nas manifestações do dia 7 de setembro, 14 pessoas foram denunciadas por formação de quadrilha, desacato ou apologia ao crime. Por outro lado, explicou que o Ministério Público está investigando eventual desvio de alguns policiais, já que o papel da instituição não é reprimir, mas garantir o direito à livre manifestação.

A coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Defesa dos Direitos Humanos, Nivia Mônica da Silva, também reforçou que o Ministério Público tem o dever de investigar e processar aqueles que praticaram atos violentos durante as manifestações, e isto se aplica aos policiais e aos manifestantes.

Já a coordenadora da Superintendência de Investigação e Polícia Judiciária, Letícia Baptista Gamboge Reis, confirmou que houve instauração de inquéritos policiais para investigar pessoas que se infiltraram em movimentos sociais e, assim que tiver os resultados, irá encaminhá-los ao Ministério Público. Pontuou ainda que as manifestações foram reflexo do direito de cidadania e a atuação da polícia foi para garantir o direito de expressão e coibir quem fez mau uso desse direito. O delegado regional de Venda Nova, Hugo e Silva, também destacou que os procedimentos foram tomados para garantir o direito às manifestações e não permitir que criminosos entrassem no grupo pacífico para promover ações criminosas.

Comissão atuou para prevenir conflitos
Na opinião da defensora pública Maria Auxiliadora Viana Pinto, a Comissão de Prevenção à Violência nas Manifestações foi proveitosa e pertinente. Ela destacou que a instituição acompanhou os interrogatórios do dia 7 de setembro e conseguiu a identificação das 60 pessoas detidas para que a Defensoria acompanhe o que foi feito.

O conselheiro estadual de Defesa dos Direitos Humanos, Bruno Henrique Nogueira Cardoso, acompanhou as manifestações e disse que não houve embate, mas muitas vezes massacres. Ele demonstrou sua preocupação com futuras manifestações, se o policiamento será para reprimir ou garantir a segurança. E sugeriu que o trabalho da comissão seja para melhorar a prevenção dos conflitos, e não repetir o mesmo risco das fatalidade ocorridas neste ano.

Para o coordenador técnico de Pólos de Cidadania da UFMG, Antônio Eduardo Silva Nicácio, a comissão deveria continuar atuando na proteção e prevenção dos direitos humanos. Ele lamentou o descumprimento de vários compromissos assumidos pela polícia e pelo poder público e destacou a postura mediadora e preventiva do Ministério Público por meio da comissão. “Por mais que o êxito não tenha sito total, a comissão colaborou para minimizar os danos”, opinou.

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