Em audiência no STF, privatizações foram criticadas pela maioria dos participantes



Em audiência no STF, privatizações foram criticadas pela maioria dos participantes

Na audiência pública realizada na sexta-feira (28/9) no Supremo Tribunal Federal (STF) para discutir as regras da venda de empresas de estatais, a maioria dos participantes que já falaram teve posição crítica às privatizações.

Em junho deste ano, o ministro do STF Ricardo Lewnadowski determinou que a venda de estatais só pode ser feita com autorização do Congresso Nacional. A decisão foi liminar, ou seja, provisória. Assim, o próprio Lewandowski organizou uma audiência pública para ouvir vários setores antes de a Corte dar uma decisão definitiva sobre o caso.

Na audiência pública, parte dos expositores sequer abordou a questão de ser necessário ou não aval do Congresso, apenas se posicionando contra as privatizações de um modo geral.

O pedido atendido pelo ministro em junho foi feito Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenaee) e pelo Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf/CUT), que questionam trechos da Lei das Estatais. Na decisão, Lewandowski destacou que, da mesma forma que a Constituição exige “lei específica” para se instituir empresa pública, autarquia, sociedade de economia mista e fundação, o mesmo requisito deve ser observado no caso das privatizações.

Maurício Carvalho Mazzini, superintendente jurídico da Eletrobras, estatal do setor elétrico, defendeu o programa de desinvestimentos da empresa, ou seja, sua retirada de parte dos projetos em que tem participação acionária. “A empresa tomou essas medidas de saneamento da sua vida econômico-financeiro para sobreviver e pensar sua perenidade. O programa de desinvestimentos se mostrou aderente à estratégia que a companhia precisava adotar naquele momento”, disse Mazzini.

Felipe Sousa Chaves, diretor da Associação de Empregados de Furnas, subsidiária da Eletrobras falou em seguida e discordou. Ele se disse contra a venda de empresas no setor elétrico por razões de segurança e interesse coletivo. E, de qualquer forma, defendeu o aval legislativo para a privatização. “Não podemos admitir que uma pessoa ou algumas pessoas do Poder Executivo tenham uma posição, enquanto temos um Congresso com quase 600 integrantes eleitos pelo povo”, disse Chaves.

A audiência foi aberta por Lewandowski. Ele destacou a importância da reunião para que os cidadãos opinem sobre assuntos relevantes. Ao todo são 38 expositores. Até agora, foram favoráveis à privatização representantes da Eletrobras, do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo (IBDA), da Fundação Getúlio Vargas (FVG) e da ID Global.

Licitação de concessões é ameaça ao setor elétrico
O representante da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE), Luiz Alberto Schreiner, disse que o processo de licitação das concessões representa uma ameaça ao setor elétrico nacional. Segundo ele, é fundamental preservar esse patrimônio para que os cidadãos, em qualquer parte do país, possam continuar a usufruir de energia elétrica a preços acessíveis. As afirmações foram feitas durante audiência pública convocada para debater as regras de transferência de controle acionário de empresas públicas, sociedades de economia mista e de suas subsidiárias ou controladas, objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5624, de relatoria do ministro Ricardo Lewandowski.

De acordo com Schreiner, as empresas estatais do setor horam seu compromisso de universalizar o acesso à energia elétrica e de investir na melhoria da qualidade dos serviços em benefício da população de forma sustentável e contínua. Em seu entendimento, a população brasileira não quer que essas concessionárias públicas, historicamente fundamentais para o desenvolvimento do país, sejam transformadas em empresas desnacionalizadas e descompromissadas com o desenvolvimento da nação.

O engenheiro afirmou que a necessidade de investimento para expansão do setor elétrico é enorme e que os investidores privados são bem-vindos para atender à crescente demanda de energia. Ele ponderou, entretanto, que os investimentos devem ser destinados a novos empreendimentos e não pela aquisição de empresas estatais consolidadas, “cujos investimentos foram pagos com sacrifícios pelo povo brasileiro”. Ele explicou que atividades como a do setor elétrico, que se caracterizam praticamente como um monopólio, devem oferecer tarifas justas, capazes de manter a competitividade da economia e a capacidade de pagamento pela população.

Representados

Foram contra os representantes da Central Única dos Trabalhadores (CUT), da Federação Única dos Petroleiros (FUP), da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, da Federação Nacional das Associações de Pessoal da Caixa (Fenae), da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf), da Associação de Empregados de Furnas, da Associação dos Profissionais dos Correios (ADCAP), da Auditoria Cidadã da Dívida e do Comitê Nacional das Empresas Públicas e da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE).

No período da tarde foram ouvidos representantes de estatais, como Petrobrás, BR Distribuidora, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal (CEF). Os representantes dos empregados nos conselhos de administração da Eletrobras e da Transpetro também falaram, assim como pessoas ligadas ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ao Ministério do Planejamento, ao Ministério de Minas e Energia, e à Secretaria do Tesouro Nacional.

Representante do Conselho de Administração da Eletrobras

Na audiência pública, o representante dos empregados no Conselho de Administração da Eletrobras, Carlos Eduardo Rodrigues Pereira, afirmou que a medida é uma tentativa de reescrever o papel do Estado na economia. “A exploração direta de atividade econômica pelo Estado é prevista na Constituição quando necessária aos imperativos da segurança nacional e do relevante interesse coletivo”, disse.

A seu ver, a intervenção do Estado no domínio econômico deve ser entendida como participação e não como intromissão. “O Estado não só pode como deve atuar na esfera econômica e social legitimada por uma série de dispositivos constitucionais. A privatização não transfere para o controlador privado o interesse público como a alocação socialmente eficiente dos recursos financeiros e a universalização do acesso aos seus produtos e serviços”, alegou.

Para ele, considerar que a controladora pode vender ações de suas subsidiárias é ignorar que é através delas que a empresa existe. “Seria privatizar a própria estatal”, apontou, destacando a necessidade legislativa para a transferência de controle acionário de estatais.

Saneamento

Representantes do Estado da Bahia e da Associação dos Profissionais em Saneamento (APS) apontaram os impactos negativos da privatização para estados e municípios.

A exposição de Rodrigo Santos Hosken, representante da Associação dos Profissionais em Saneamento (APS), centrou-se nos problemas já verificados na privatização de estatais de saneamento e na defesa de uma lei específica para as privatizações no setor, no qual mais de 70% dos serviços são prestados por estatais.

Hosken lembrou que o acesso à água e ao saneamento básico é um direito humano essencial e que a privatização afeta o princípio da universalização desses serviços. Segundo ele, empresas privadas têm interesse apenas em áreas lucrativas, e a privatização desestrutura o modelo atual e viola o princípio da solidariedade do pacto federativo. “Para o empresário, a água é mera mercadoria”, assinalou.

O representante da APS citou casos recentes de privatização e posterior reestatização, diante dos problemas verificados. No Tocantins, a Saneatins, empresa estadual, foi privatizada em 1998, mas, segundo Hosken, os avanços dos serviços em pequenos municípios e na zona rural foram tímidos, a ponto de, em 2010, o estado criar uma autarquia para promover o saneamento nessas áreas. “A entrada do capital privado tem interesses não afetos ao interesse público primário”, destacou.

Outras entidades que forma ouvidas: a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (INEEP), a Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão (FITERT), o Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo, a Federação Nacional dos Petroleiros (FNP), o governo da Bahia, a Associação dos Profissionais em Saneamento (APS), o Laboratório de Regulação Econômica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), e a Associação de Empresas de Transporte de Gás Natural (ATGÁS).

“Ao fim da audiência pública, queria manifestar a satisfação por podermos, neste momento histórico para o país, que antecede as eleições gerais, manter um debate de alto nível, um debate ordeiro, equilibrado, de respeito ao princípio do contraditório, que está estampado na nossa Constituição”, afirmou o ministro Ricardo Lewandowski no encerramento da audiência pública. 

Fonte: FNU/CUT

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