Carnaval 2018: quando o samba não é escravo de nenhum senhor



Carnaval 2018: quando o samba não é escravo de nenhum senhor

Quando a política, a economia, a mídia convencional e a justiça atravessam o samba, frustrando a população, o carnaval nos redime. A arte, a harmonia e a ousadia da Escola de Samba Paraíso do Tuiuti lavaram a alma do povo brasileiro com muitas perguntas em forma de alegorias e um samba enredo vigoroso, composto por Moacyr Luz, questionando os golpes nos direitos dos trabalhadores.

A ala “Manifantoches” desnudou,na Sapucaí, a manipulação levando para a avenida paneleiros vestidos com camisas da Seleção Brasileira e patos da Fiesp controlados por mãos gigantes. A grande mídia tentou minimizar, mas o “vampiro neoliberal” já era assunto nacional e a Tuiuti a favorita do povo.

Analisando o carnaval do Rio e os blocos de BH, o ator e diretor Sindieletro, Marcelo Borges, reforça que a arte tem essa função histórica de mostrar o que vem acontecendo no mundo. “O povo está descobrindo, cada vez mais no Carnaval, um lugar para se manifestar, colocar sua opinião, brigar pelo que acredita e defender suas classes e causas”, comemora.

Entrevistamos o carnavalesco Moacyr Luz para saber os bastidores da criação do samba que embalou o país. Confira:

- Vocês esperavam a repercussão e eventual retaliação que poderia vir depois do desfile?

Moacyr Luz: Modestamente. Esses fenômenos acontecem quase sempre da mesma maneira, inesperada! Havia uma expectativa... O nó na garganta do povo se encarregou do resto...

O samba foi ousado e as alegorias também, inclusive dando nome aos responsáveis pela crise hoje. Ser uma escola pequena dá mais liberdade artística?

Moacyr Luz: Não estar comprometido ou engessado em algum conceito direcionado facilita muito a liberdade de expressão..o problema é manter essa estrutura... isso me lembra a fábula “A Revolução dos Bichos”...(Fábula sobre o poder, escrita por George Orwell, que narra a insurreição dos animais de uma granja contra seus donos. Progressivamente, porém, a revolução degenera).

Tudo leva a crer que o desfile ainda terá mais repercussão? A Escola tem alguma iniciativa pensada nesse sentido?

Moacyr Luz: Primeiro é preciso baixar a poeira, entender o nível de exposição, de cobrança na escola, “pra” seguir adiante.

O que você quis dizer com “bondade cruel” ao falar da Lei Aurea? 

Moacyr Luz: Estou rindo aqui porque me lembrei do “primo pobre, primo rico” (quadro do programa “Balança Mas não Cai” que fez grande sucesso na TV nos anos 1960, 1970 e 1980). As migalhas oferecidas ao pobre reluziam feito ouro...os escravos jogados na rua, descalços, semi-nus, perdidos...essa é a bondade cruel.

Você acredita em novos Zumbis e quem seriam ou são eles hoje?

Moacyr Luz: O ser humano como civilizado, regrediu absurdamente no amor ao próximo. Hoje, ao invés de Zumbi dos antigos Palmares há os milicianos...

Você está há 13 anos à frente do projeto “Samba do Trabalhador” no Andaraí ( tradicional roda de músicos, realizada sempre às segundas feira, que inicialmente reunia apenas músicos no seu dia de folga). Como está o projeto?

Moacyr Luz: Na semana passada tivemos mil pagantes no ‘terreiro’...pessoas de outras cidades, outros países, todas felizes por ouvir música brasileira... esse samba gera uns cem empregos ao todo, todos esperando a segunda feira pra levar algum “dinheiro” pra casa... O projeto já ultrapassou a minha motivação inicial. 

 (Entrevista de Rosana Zica)

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